COMO FUNDAMENTO DO ESTADO DEMOCRÁTICO E DE DIREITO
Albano Pedro*
I. INTRÓITO
O ser humano é social pela moral que o ajuda a interagir com seus semelhantes num processo de adequação de condutas cujo equilíbrio produz a Ética enquanto mecanismo de interacção social com vista a harmonização de condutas, que seria suficiente se o homem não tivesse propensão para a prática do mal e para o desequilíbrio do meio ambiente. O Direito, como mecanismo de regulação social de cariz sancionatório, nasce para conter esta tendência desarmonizadora e destrutiva, donde a conclusão hegeliana de que o Direito nasce da relação de conflito entre a Ética (comportamento colectivo de pendor altruísta) e a Moral (comportamento individual de pendor egoísta). Daí que a Moral conformada pela Ética seja o fundamento da norma jurídica, i.e., que as pessoas sejam obrigadas a agir segundo a Boa-Fé como princípio estruturante das relações sociais assistidas pelo Direito. Assim, o homem agirá conforme o comportamento (Moral) aceite pela sociedade (Ética) o que torna a Boa-Fé na síntese das duas dimensões comportamentais devolvido ao homem em forma de sanção em caso de desvio (Direito).
O homem age conforme o princípio da Boa-fé por ser uma pessoa moral; que pensa e sente o meio e os valores nele impregnados. O Princípio da Boa-fé consiste na vontade de não prejudicar o próximo procurando o equilíbrio nas relações sociais e assiste o homem em todos os seus actos e contratos. Sendo, em caso da sua violação, responsabilizado pelos danos daí derivados (art.º 227º Código Civil).
Todavia, o homem não é a única pessoa na sociedade. Com as suas emoções e vontade o homem interage com pessoas sem vontade nem emoções que o Direito denomina pessoas jurídicas. Estas nascem tal como o homem. Não do útero, mas de ideias e projectos. Ganham estatuto de entidades sociais e alguns tal como o homem registam-se em conservatórias outros mediante simples actos constitutivos legais ou contratuais e ganham nomes. Umas são colectivas (associações, fundações, sociedades comerciais, etc.) outras são singulares (estabelecimentos comerciais, marcas, patentes, etc.) outras ainda nascem de actos públicos como as empresas públicas, governos, poderes soberanos e por fim o próprio Estado através do acto de constituição de toda a comunidade. Ora, se a pessoa física ou moral age com emoção e vontade orientada pelo princípio da Boa-fé, com que fundamento agirá uma pessoa jurídica? Uns agem mediante representação de pessoas físicas (sociedades civis e comerciais em geral), outros agem, mediante titulares de cargos, por conta e risco próprios (órgãos do Estado e serviços públicos), embora sejam todos responsabilizados pelos prejuízos decorrentes dos seus actos.
II. PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A administração pública é resumidamente entendida como o conjunto de órgãos e serviços que actuam segundo regras estabelecidas pelo Direito Público com vista a satisfação de interesses públicos. São exemplos o Governo, Governos Provinciais, Administrações Municipais ou Comunais; Instituto Nacional de Defesa do Consumidor ou Instituto Nacional das Estradas de Angola entre outros semelhantes; o fiscal ou agente da polícia no exercício das suas actividades, etc. Não são órgãos da administração pública, a Sonangol, a Endiama, a TAAG, a EDEL e outras empresas públicas ou as Federações Desportivas. Pois, embora persigam fins ou interesses públicos as suas actividades não são reguladas pelo Direito Público e nem se relacionam com os particulares com poderes privilegiados.
Os particulares para efeitos de relação com a administração pública, são as pessoas físicas ou morais, as sociedades comerciais, as associações, as fundações e todas outras pessoas morais e jurídicas cuja actividade é regulada pelo Direito Privado.
Se numa relação entre a Administração Pública e os particulares (em caso destes serem pessoas físicas ou morais) agem com base na boa-fé, àquele agirá com base na observância da Lei; com base no principio da Legalidade. Sendo o princípio que fundamenta a acção da Administração Pública é reforçado por outros princípios cuja totalidade realiza o comportamento do mesmo. Á moral do indivíduo opõe-se a legalidade dos actos da Administração Pública, devendo, em momento nenhum, agir a margem da Lei, seja para a fundamentação dos actos seja na observância dos prazos para execução destes mesmos actos.
Quando damos entrada de um pedido para concessão de um terreno para construção de habitação ou para reclamarmos sobre um prejuízo causado pelos órgão ou serviços da administração pública, este tem prazos legalmente definidos para nos atender e tem a obrigação de sustentar a sua decisão. Se negar o pedido, deve justificar com base na Lei, se aceitar o pedido, também deve justificar com base na Lei. Se notificar-nos para abandonar a casa, deve justificar, se forçar a nossa retirada do terreno, deve justificar. É o que se chama Dever de Fundamentação (art.º 67º Decreto-Lei 16-A/95 – Normas do Procedimento e da Actividade Administrativa – doravante NPAA) necessário para atestar a legalidade da acção da administração pública já que não deve agir com base na boa-fé por não ser pessoal física ou moral.
São oito os princípios que determinam a acção e o comportamento da Administração Pública (art.º 3º e seguintes – NPAA). Nomeadamente, os princípios da Legalidade, da prossecução do interesse público, da proporcionalidade, da imparcialidade, da colaboração da administração com os particulares, da participação, da decisão e de acesso a justiça.
PRINCIPIO DA LEGALIDADE
Tido como trave mestra de todo sistema do Direito Público, este princípio determina que a administração pública deve actuar em conformidade com a Lei, i.e., o cidadão deve exigir sempre a justificação da Lei para tudo quanto seja a posição tomada pela Administração Pública como já referimos em parágrafos anteriores. Haverá ofensa ao princípio da Legalidade sempre que somos abordados pelo agente regulador de trânsito sem justificação com base no Código de Estrada ou pelos serviços de fiscalização do Governo da Província para retiramos a viatura mal parqueada sem justificação. Da mesma forma haverá inobservância deste princípio nos casos em que nos mandam uma notificação para comparecer a esquadra de polícia sem a devida fundamentação legal ou temos a casa demolida com argumento de que o terreno compreende a via expressa que será construída sem a devida justificação legal.
PRINCIPIO DA PROSSECUÇÃO DO INTERESSE PÚBLICO
Todas as actividades e acções da Administração Pública devem ter como fim o interesse público; o interesse da comunidade em geral. Quando o fiscal do GPL recolhe a viatura mal parqueada o interesse público que persegue é a utilização adequada do parque ou a desobstrução da via para servir a toda a comunidade, incluindo o proprietário da viatura em causa. Da mesma forma, quando somos recrutados para o cumprimento do serviço militar estamos a servir os interesses de toda a nação com a manutenção da paz. Assim é o pagamento dos impostos para capacitação financeira do Estado afim de satisfazer as necessidades colectivas; a prisão do criminoso para garantir a segurança da comunidade e reeducá-lo para melhor servir a sociedade; a multa pela infracção para o senso de responsabilidade do cidadão no cumprimento pontual das suas obrigações em nome de uma comunidade mais responsável por si mesma, etc. Já não haverá interesse público no caso em o Governo Provincial contratar uma empresa de refeições para servir diariamente os seus funcionários ou nos casos em que a Polícia Nacional decide arrendar um imóvel para instalar serviços. São actos de gestão privada da administração pública no seu interesse específico, enquanto pessoa jurídica, e não da comunidade. Não sendo por isso conforme estes princípios, mas conforme o Direito privado correspondente, donde a igualdade de tratamento com os particulares nos actos ai praticados.
PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE
Sempre que a administração pública sacrificar um bem ou interesse legítimo do particular, deve fazê-lo atendendo o equilíbrio entre a situação actual e a situação futura deste. Quando o Governo Provincial remove moradores de um bairro pelo perigo que representa o local em que habitam, as casas demolidas e as condições em que viviam as pessoas devem ser substituídas em termos mais ou menos equiparados, quando não melhores. É assim no caso de um camião pertença de um particular que tenha sido usado mediante requisição administrativa no âmbito da transportação dos moradores a serem mudados e a mesma contrai danos irreparáveis, haverá a reposição do meio em termos proporcionais. A proporcionalidade é um conceito legal que não leva a ideia de equiparação estrita das situações ou equivalência aritmética dos meios. O Estado pode sempre compensar de acordo com as possibilidades reais sem contudo ferir este princípio. Entretanto, não haverá proporcionalidade nos casos de transferência de um cidadão para uma tenda ou moradia de condições precárias que teve a seu imóvel caro e confortável demolido pela administração pública; da mesma forma que não haverá proporcionalidade no caso de libertação de inocente que foi detido por muitos dias por suspeita de um crime vindo depois provar-se a sua inocência sem qualquer reparação dos danos pela perda da casa arrendada a favor do senhorio por créditos vencidos, perda do ano lectivo ou de emprego por faltas acumuladas, etc. Também não haverá proporcionalidade, havendo inclusive suspeição de favorecimento, no caso de atribuição de uma moradia de luxo a favor de um cidadão cuja casa demolida era por exemplo do tipo económica quando os vizinhos na mesma condição terão beneficiado de casas equivalentes as demolidas, embora em melhores condições. A proporcionalidade é um critério de equivalência razoável das condições interpretado pela administração pública a luz da Lei.
PRINCIPIO DA IMPARCIALIDADE
A administração deve tratar os particulares da mesma forma para as mesmas condições. Num concurso público em que tenham sido admitidos professores a direcção provincial da Educação ou Ministério da Educação conforme o caso, deve avaliar os candidatos segundo critérios objectivos (ter preenchido os requisitos publicitados – habilitações literárias mínimas, experiências técnicas e pedagógicas, idade mínima exigida) e nunca subjectivos (sexo, altura e beleza, parentesco com o chefe ou por simpatia demonstrada durante os testes). Assim, deve ser o procedimento no acesso aos serviços públicos. Quando nos dirigimos aos serviços de Identificação devemos ser tratados pela ordem de chegada e sem visível favorecimento de alguns por ser mais chegados aos funcionários. Normas de convivência social podem afastar este princípio por ter cariz deontológico. É o caso da prioridade dada as mulheres grávidas e aos diminuídos físicos. De qualquer modo uma pauta ou instrutivo interpretando a Lei deverá fundamentar este procedimento.
PRINCIPIO DA COLABORAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO COM OS PARTICULARES
A Lei exige que a administração pública colabore com os particulares destinatários dos projectos e serviços que implementa, prestando informações e esclarecimentos bem como receber sugestões e informações. Antes de instalar uma ponte que venha a servir a comunidade como passagem aérea sobre uma via rápida, a administração municipal ou comunal conforme a responsabilidade deve reunir com a comunidade beneficiaria e informar sobre a pretensão e colher as sugestões devidas afim de aperfeiçoar o projecto ou adequá-lo as necessidades locais.
PRINCIPIO DA PARTICIPAÇÃO
A colaboração devida a administração pública ocorre mediante a criação de condições a estabelecer por esta. Os luandenses ao opinarem sobre a viabilidade do projecto de desassoreamento da Baía de Luanda (Marginal) com vista a implementação de empreendimentos turísticos devem ocorrer com o convite aos citadinos a uma sala, eventualmente de cinema, ou estádio de futebol para a apresentação e discussão do projecto; mediante envio de propostas via e-mail ou mediante ligação telefónica grátis. A administração custeia as formas de participação dos particulares na projecção e elaboração dos planos de execução. Sendo que a execução deve correr por conta da administração pública a qual é financiada com impostos pagos pelos particulares. Este principio leva a um melhor controlo da gestão de bens e interesses públicos e um maior espírito de protecção dos bens e interesses assim realizados. Porquê que os cidadãos têm dificuldades de preservar os bens públicos? Resposta: porque não participam e nem se sentem a participar na sua materialização!
PRINCIPIO DA DECISÃO
Sempre que se coloca um pedido pelo particular a administração pública deve responder. Só não precisa responder nos casos em que este pedido tenha sido já respondido (negado por exemplo) em menos de 2 anos, facto que dispensa a resposta do titular do órgão ou serviço da administração pública. Quando pedimos um terreno mediante requerimento a administração do Sambizanga ou do Chongoroi deve responder ao particular, mesmo quando negar. A administração pública nem sempre responde. Aí, devemos valorar o silêncio. Haverá situações em que o silêncio da administração pública significará negação e casos em que o silêncio significará aceitação ou autorização. A lei estabelece os casos para efeito de uma resposta tácita ou outra. De qualquer modo sempre que solicitarmos por requerimento um terreno para construção e a administração municipal não responder por escrito no prazo determinado significa que houve lugar a autorização tácita, da mesma forma quando um conjunto de cidadãos solicitar autorização de manifestação, o silêncio do Governo Provincial ao qual foi dirigido o pedido significará autorização para realizar a respectiva marcha, pelo roteiro anexado no pedido.
PRINCIPIO DE ACESSO À JUSTIÇA
Sempre que administração pública violar qualquer dos princípios acima anunciados e disto resultar danos ou simples ameaça de danos aos particulares, estes podem reclamar junto do funcionário público que praticou o acto, recorrer ao seu superior hierárquico ou mesmo ao tribunal. Se de um pedido de um talhão de terreno para fins habitacionais resultar a negação de provimento por parte do administrador municipal competente sem justificação convincente, a Lei faculta-nos a possibilidade de reclamar junto do administrador municipal para reconsiderar o pedido e em caso de insistência deste, a possibilidade de recorrer ao Governador da Província. E se este manter a posição do seu subordinado, então levamos o Governo da Província ao tribunal, para que a sentença produzida a nosso favor, obrigue o administrador municipal a conceder o terreno pedido. Não é por exemplo o que se passa quando somos vítimas de um “arrombamento” em casa por parte de agentes da polícia sem autorização para busca ou apreensão durante a noite e resulte danos com porta e outros bens destruídos pela pressa e violência dos mesmos para além de espancamentos por refilarmos. Haverá aqui a possibilidade de denunciarmos o acto junto da corporação para efeito de responsabilidade disciplinar (suspensão ou mesmo expulsão), de responsabilidade criminal (eventuais crimes de ofensas corporais) e responsabilidade civil do agente ou do Estado (danos patrimoniais – geleira ou fogão danificados), mas não haverá a processo contra a administração pública em juízo administrativo para decidir sobre uma posição tomada pelo titular do órgão da administração pública. Visto que o fim da justiça administrativa está em anular o acto praticado pelo órgão da administração pública; anular a negação do administrador municipal sobre o pedido de terreno. Por isso, é que se diz que o contencioso administrativo angolano é de mera anulação. O juiz anula a “negação” do administrador e por via disto este produz outra decisão, que infelizmente pode ser igual a anterior se legalmente justificada dando lugar a inexecução da sentença judicial.
III. A REALIZAÇÃO HUMANA DA ÉTICA PÚBLICA
Os princípios da administração pública dividem-se em três grupos. Princípios relativos ao Direito (Princípios da Legalidade, da Proporcionalidade e da Imparcialidade), princípios relativos a Democracia (Princípios da prossecução do interesse público, da colaboração da administração com os particulares, da participação e da decisão) e princípios relativos a Justiça (Principio de acesso a justiça). Os dois primeiros grupos são referentes a actuação da administração pública e o último grupo referente aos particulares. Este serve como um instrumento de repreensão da administração pública pelo particular em caso de violação dos princípios dos grupos anteriores, é uma garantia contra os actos lesivos de direitos e interesses legítimos dos particulares.
O comportamento da administração pública quando pautado nos princípios descritos reduz o egoísmo nas relações sociais promovendo o altruísmo e a solidariedade social; melhora a condição moral dos homens e aperfeiçoa o sistema de inter ajuda nas diversas classes sociais, reduz a tensão conflituosa entre os homens e por fim conduz a sociedade para um padrão de ética pelos interesses colectivos. Cada vez que a administração negar um pedido, sacrificar um bem ou prender um particular justificando-o sobre as razões de interesse público constante na Lei mais o particular compreende a necessidade de sacrificar o seu interesse em nome do interesse colectivo e mais se torna civilizado nas relações sociais.
A Ética Pública (donde a deontologia da função pública) é, por isso, o resultado da observância habitual dos princípios da administração pública pelos órgãos da administração pública e sua fiscalização permanente pelos particulares. A Ética Pública reduz o hábito pela fraude, a corrupção e consequente cometimento de crimes. Devolve o sentimento de pátria aos cidadãos e a necessidade de justiça em todos os actos de gestão de interesses públicos. Impõe ainda o espírito de fiscalização e responsabilização dos actos e contratos públicos e eleva o espírito de cidadania no exercício de poderes soberanos para a renovação dos mandatos públicos.
IV. A DIALÉCTICA NA REALIZAÇÃO DA DEMOCRACIA
A interacção entre o princípio relativo a justiça e os princípios relativos ao Direito produz a materialização dos princípios relativos a Democracia. Ou seja, mais os particulares acedem a justiça devido aos actos praticados pela administração pública mais esta age segundo o Direito e mais a Democracia transparece na relação administração e particulares e por conseguinte entre os governantes e os governados.
V. CONCLUSÃO
As violações constantes e sistemáticas de direitos e interesses de particulares pelos órgãos da administração pública, expõe a face imperativa e constrangedora do Estado, relegando os particulares a uma condição de receio e impotência ante aos titulares de órgãos públicos. Diminui a vontade de participar na construção da sociedade, adoece o espírito de nação provocando a inércia no exercício da cidadania.
Por conseguinte, a falta de reacções contra os órgãos da administração pública por parte dos particulares sempre que hajam violações de direitos e interesses legítimos, leva os órgãos da administração pública a inércia não realizando as obrigações legais e democráticas a que são legalmente obrigados. A prova está em que muito poucas decisões foram produzidas pelos tribunais em matéria de contencioso administrativo. Pouquíssimas mesmo! Enquanto o quadro for este o projecto de Estado Democrático e de Direito não passará disso mesmo. Da dinâmica dos particulares exigindo da Administração Pública o cumprimento das suas obrigações nascerá a observância rigorosa da Lei e disto a realização de uma relação de, cada vez, maior cumplicidade entre os órgãos da administração pública e os particulares.
Não nascerá Estado Democrático e de Direito nenhum, enquanto os particulares de uma forma geral olharem, impávidos e serenos, as violações flagrantes de direitos e interesses legítimos decorrentes da actividade da administração pública. Da mesma forma, não nascerá a Ética Pública que sustente um Estado Democrático e de Direito enquanto a administração pública não pautar a sua actuação nos princípios descritos. O seu cumprimento é obrigatório e cumulativo. A inobservância de qualquer um deles desencadeia a desarmonia da relação com os particulares provocando violação de direitos e interesses legítimos.
* www.jukulomesso.blogspot.com
No mercado das relações humanas e sociais, a expressão da palavra e a exposição do pensamento são as mercadorias mais preciosas!
sábado, 21 de fevereiro de 2009
sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009
O EXEMPLO DE BARACK OBAMA
PARA A POLÍTICA E DEMOCRACIA ANGOLANA
Albano Pedro*
É bem verdade que para um raciocínio sensato, Barack Obama não pode ser o príncipe encantado que o mundo espera, apesar do anunciado encerramento da prisão de Guantânamo, retirada das tropas do Iraque, apoio ao desenvolvimento de África entre outras medidas, ao que parecem, politicamente precipitadas. Já porque a política americana, incrivelmente constante, não altera no fundamental com a troca de poderes entre os republicanos e democratas, sendo apenas visível a política militarista dos republicanos e a política pacifista dos democratas na arena internacional. E neste particular, o exemplo de Barack Obama não emergirá certamente da falsa esperança que o mundo em geral e África em particular almejam. Sobretudo porque Barack Obama, felizmente lúcido e sensato, não fez promessas que coloquem o mundo numa situação futura de frustração em caso de manutenção do status quo. Até, porque os slogans “The Change We Need!” e “Yes, We Can!” não foram concebidos para o mundo mas para os americanos.
Aliás, os africanos – sobretudo estadistas – são particularmente espectaculares quanto a estranha capacidade de almejarem esperanças nunca concretizáveis do Ocidente. Em Angola, no limiar da execução dos acordos de Bicesse, George Bush (pai) ainda não tinha passado o testemunho a Bill Clinton e já MPLA sentia o privilégio de se ver favorecido em detrimento da UNITA pelas relações geralmente moderadas dos Democratas contra a política incentivadora do belicismo e militarismo dos Republicanos. O tempo demonstrou a constância da política americana com o mandato democrata indiferente a paz efectiva de Angola. É claro que a mendicidade dos africanos de tão profunda proporciona sonhos atrevidos. Contudo, o que é básico, e de aviso a navegação, é que os americanos têm os olhos apenas na sua economia e todas as relações políticas gravitam em torno desta realidade. Visto que as relações de poderes assentam na lógica da destruição (mandato republicano) e construção (mandato democrata), a sucessão de ambos os partidos está centrada aos problemas que a economia americana levanta. Por isso, não é de esperar de Barack Obama mais do que se esperou de outros presidentes americanos senão a satisfação das exigências simbólicas, i.e., esperar-se que o primeiro presidente negro não “descarrile” no seu mandato para que o trauma de ser negro não prevaleça nas mentes daqueles que julgam a incapacidade humana pela cor da pele.
Entretanto, Barack Hussein Obama sobe ao podium do reconhecimento universal com um magnífico exemplo para os africanos. O exemplo do diálogo cordial com os adversários políticos como poucos outros estadistas no mundo ensaiou. Começou no seio do seu próprio partido com uma atitude cooperante com aqueles com os quais disputou a candidatura a casa oval e culminou com a conquista da simpatia e colaboração dos próprios republicanos.
Vale para os africanos que a oposição agressiva (oposição por oposição) – muito agenciada no mercado político africano – é, em Barack Obama, um artefacto primitivo e prejudicial para harmonia e paz social que revela o instinto básico humano próximo da selvajaria e da violência. Sua fulgurante ascensão e rápido progresso político demonstra que é possível uma atitude mais integradora com o próximo e mais reconstrutora do adversário em ambientes de concorrência partidária.
O esmagamento eleitoral e legal a que foram submetidos os partidos políticos da oposição civil angolana recentemente extintos é prova perfeita de relações partidárias conflituosas onde a oposição aposta ferrenho na queda do regime instaurado e o partido da situação em reacção aposta na expurga dos “rebeldes” políticos através de legislação e mecanismos eleitorais pouco saudáveis para o ambiente democrático emergente. E o resultado esta aí: uma Assembleia Nacional que nem mesmo ao MPLA orgulha. Esta situação, é consequência de relações de choque e extrema violência política causada pelos movimentos de libertação (MPLA, UNITA e FNLA) e que trespassam as mentes da nova geração de políticos com fanatismo e radicalismo na defesa de interesses partidários. Na verdade, o recorte psicossociológico das relações político-partidárias expõe a realidade segundo a qual os interesses agenciados por aquelas principais forças políticas angolanas se tornaram irreconciliáveis a partir da independência nacional, vindo daí uma luta política assente no ódio, vingança e ressentimento. A solução histórica de destruição das forças opositoras que levaram a UNITA ao “tapete” é a evidência da política dos “interesses irreconciliáveis” que anima, do mesmo modo, forças como FNLA (ala histórica), FLEC-FLAC, etc. Há nestas forças a ideia da humilhação e derrota política e o almejo por um futuro em que o projecto de controlo absoluto do Estado será concretizado. Esta obsessão leva a que muitos dos líderes dessas formações políticas estejam ultrapassados pela dinâmica histórica pela busca incessante do momento da “vingança” sem considerar os interesses do eleitorado. Daí atitudes como falta de interesse em analisar e propor alternativas as medidas governamentais e a aposta constante na ideia de traição perpetrada por quem controla o Governo.
Com o espírito assente em interesses irreconciliáveis, os angolanos jamais passarão por processos eleitorais sem levantar suspeições, mesmo quando previamente concordem com os mecanismos eleitorais. Tão pouco os resultados eleitorais serão vistos como vitória do povo e meio de normalização do Estado. Sempre significarão humilhação, marginalização e submissão de uns pelos outros perpetuando o ódio, a vingança, o medo e o desespero, causando instabilidade dos espíritos na construção de um Estado Democrático e de Direito. A lógica dos interesses irreconciliáveis é socialmente perigosa por mergulhar os cidadãos em posições histórico-ideológicas radicais em defesa de meros símbolos partidários. O exemplo de Barack Obama deve despertar-nos desta realidade. Uma realidade em que cada cidadão ofuscado pela defesa egoísta do seu interesse projecta no partido a sua arma de combate contra os interesses do adversário, seu concidadão. O povo angolano pode questionar-se sobre as razões pelas quais não admitiu a entrada de ideias diversificadas no parlamento e concluir que produziu ele mesmo um contra-senso, frenando o progresso do seu próprio projecto de Estado Democrático e de Direito. Ainda no velho parlamento foi visível a falta de concertação em assuntos de interesse colectivo no seio dos deputados de vários partidos. Aí, a guerra parlamentar (o jogo do ataque e defesa verbal) foi uma constante. Mais do que a promoção dos interesses públicos sobreviveram os projectos partidários. E tudo devido a violência política, encoberta no discurso intolerante a diferença.
Ora, o exemplo de Barack Obama é suficientemente eloquente para colocar o povo angolano em introspecção sobre o seu projecto de democracia e demais sugestivo para a nova geração de políticos. O exemplo sugere que esta geração deve protagonizar uma verdadeira rotura com a velha geração de políticos que desenvolveu durante anos e anos o hábito pelo discurso truculento e contra-democrático. O hábito pelo reconhecimento dos feitos e obras produzidas pelos governantes e a crítica sugestiva correspondente com espírito de nação e em prol dos interesses colectivos deve caracterizar a nova geração de políticos se quiser sobreviver aos próximos desafios partidários e eleitorais. Que sirva e sobreviva nos angolanos o exemplo de Barack Obama!
* www.jukulomesso.blogspot.com
PARA A POLÍTICA E DEMOCRACIA ANGOLANA
Albano Pedro*
É bem verdade que para um raciocínio sensato, Barack Obama não pode ser o príncipe encantado que o mundo espera, apesar do anunciado encerramento da prisão de Guantânamo, retirada das tropas do Iraque, apoio ao desenvolvimento de África entre outras medidas, ao que parecem, politicamente precipitadas. Já porque a política americana, incrivelmente constante, não altera no fundamental com a troca de poderes entre os republicanos e democratas, sendo apenas visível a política militarista dos republicanos e a política pacifista dos democratas na arena internacional. E neste particular, o exemplo de Barack Obama não emergirá certamente da falsa esperança que o mundo em geral e África em particular almejam. Sobretudo porque Barack Obama, felizmente lúcido e sensato, não fez promessas que coloquem o mundo numa situação futura de frustração em caso de manutenção do status quo. Até, porque os slogans “The Change We Need!” e “Yes, We Can!” não foram concebidos para o mundo mas para os americanos.
Aliás, os africanos – sobretudo estadistas – são particularmente espectaculares quanto a estranha capacidade de almejarem esperanças nunca concretizáveis do Ocidente. Em Angola, no limiar da execução dos acordos de Bicesse, George Bush (pai) ainda não tinha passado o testemunho a Bill Clinton e já MPLA sentia o privilégio de se ver favorecido em detrimento da UNITA pelas relações geralmente moderadas dos Democratas contra a política incentivadora do belicismo e militarismo dos Republicanos. O tempo demonstrou a constância da política americana com o mandato democrata indiferente a paz efectiva de Angola. É claro que a mendicidade dos africanos de tão profunda proporciona sonhos atrevidos. Contudo, o que é básico, e de aviso a navegação, é que os americanos têm os olhos apenas na sua economia e todas as relações políticas gravitam em torno desta realidade. Visto que as relações de poderes assentam na lógica da destruição (mandato republicano) e construção (mandato democrata), a sucessão de ambos os partidos está centrada aos problemas que a economia americana levanta. Por isso, não é de esperar de Barack Obama mais do que se esperou de outros presidentes americanos senão a satisfação das exigências simbólicas, i.e., esperar-se que o primeiro presidente negro não “descarrile” no seu mandato para que o trauma de ser negro não prevaleça nas mentes daqueles que julgam a incapacidade humana pela cor da pele.
Entretanto, Barack Hussein Obama sobe ao podium do reconhecimento universal com um magnífico exemplo para os africanos. O exemplo do diálogo cordial com os adversários políticos como poucos outros estadistas no mundo ensaiou. Começou no seio do seu próprio partido com uma atitude cooperante com aqueles com os quais disputou a candidatura a casa oval e culminou com a conquista da simpatia e colaboração dos próprios republicanos.
Vale para os africanos que a oposição agressiva (oposição por oposição) – muito agenciada no mercado político africano – é, em Barack Obama, um artefacto primitivo e prejudicial para harmonia e paz social que revela o instinto básico humano próximo da selvajaria e da violência. Sua fulgurante ascensão e rápido progresso político demonstra que é possível uma atitude mais integradora com o próximo e mais reconstrutora do adversário em ambientes de concorrência partidária.
O esmagamento eleitoral e legal a que foram submetidos os partidos políticos da oposição civil angolana recentemente extintos é prova perfeita de relações partidárias conflituosas onde a oposição aposta ferrenho na queda do regime instaurado e o partido da situação em reacção aposta na expurga dos “rebeldes” políticos através de legislação e mecanismos eleitorais pouco saudáveis para o ambiente democrático emergente. E o resultado esta aí: uma Assembleia Nacional que nem mesmo ao MPLA orgulha. Esta situação, é consequência de relações de choque e extrema violência política causada pelos movimentos de libertação (MPLA, UNITA e FNLA) e que trespassam as mentes da nova geração de políticos com fanatismo e radicalismo na defesa de interesses partidários. Na verdade, o recorte psicossociológico das relações político-partidárias expõe a realidade segundo a qual os interesses agenciados por aquelas principais forças políticas angolanas se tornaram irreconciliáveis a partir da independência nacional, vindo daí uma luta política assente no ódio, vingança e ressentimento. A solução histórica de destruição das forças opositoras que levaram a UNITA ao “tapete” é a evidência da política dos “interesses irreconciliáveis” que anima, do mesmo modo, forças como FNLA (ala histórica), FLEC-FLAC, etc. Há nestas forças a ideia da humilhação e derrota política e o almejo por um futuro em que o projecto de controlo absoluto do Estado será concretizado. Esta obsessão leva a que muitos dos líderes dessas formações políticas estejam ultrapassados pela dinâmica histórica pela busca incessante do momento da “vingança” sem considerar os interesses do eleitorado. Daí atitudes como falta de interesse em analisar e propor alternativas as medidas governamentais e a aposta constante na ideia de traição perpetrada por quem controla o Governo.
Com o espírito assente em interesses irreconciliáveis, os angolanos jamais passarão por processos eleitorais sem levantar suspeições, mesmo quando previamente concordem com os mecanismos eleitorais. Tão pouco os resultados eleitorais serão vistos como vitória do povo e meio de normalização do Estado. Sempre significarão humilhação, marginalização e submissão de uns pelos outros perpetuando o ódio, a vingança, o medo e o desespero, causando instabilidade dos espíritos na construção de um Estado Democrático e de Direito. A lógica dos interesses irreconciliáveis é socialmente perigosa por mergulhar os cidadãos em posições histórico-ideológicas radicais em defesa de meros símbolos partidários. O exemplo de Barack Obama deve despertar-nos desta realidade. Uma realidade em que cada cidadão ofuscado pela defesa egoísta do seu interesse projecta no partido a sua arma de combate contra os interesses do adversário, seu concidadão. O povo angolano pode questionar-se sobre as razões pelas quais não admitiu a entrada de ideias diversificadas no parlamento e concluir que produziu ele mesmo um contra-senso, frenando o progresso do seu próprio projecto de Estado Democrático e de Direito. Ainda no velho parlamento foi visível a falta de concertação em assuntos de interesse colectivo no seio dos deputados de vários partidos. Aí, a guerra parlamentar (o jogo do ataque e defesa verbal) foi uma constante. Mais do que a promoção dos interesses públicos sobreviveram os projectos partidários. E tudo devido a violência política, encoberta no discurso intolerante a diferença.
Ora, o exemplo de Barack Obama é suficientemente eloquente para colocar o povo angolano em introspecção sobre o seu projecto de democracia e demais sugestivo para a nova geração de políticos. O exemplo sugere que esta geração deve protagonizar uma verdadeira rotura com a velha geração de políticos que desenvolveu durante anos e anos o hábito pelo discurso truculento e contra-democrático. O hábito pelo reconhecimento dos feitos e obras produzidas pelos governantes e a crítica sugestiva correspondente com espírito de nação e em prol dos interesses colectivos deve caracterizar a nova geração de políticos se quiser sobreviver aos próximos desafios partidários e eleitorais. Que sirva e sobreviva nos angolanos o exemplo de Barack Obama!
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