O EXEMPLO DE BARACK OBAMA
PARA A POLÍTICA E DEMOCRACIA ANGOLANA
Albano Pedro*
É bem verdade que para um raciocínio sensato, Barack Obama não pode ser o príncipe encantado que o mundo espera, apesar do anunciado encerramento da prisão de Guantânamo, retirada das tropas do Iraque, apoio ao desenvolvimento de África entre outras medidas, ao que parecem, politicamente precipitadas. Já porque a política americana, incrivelmente constante, não altera no fundamental com a troca de poderes entre os republicanos e democratas, sendo apenas visível a política militarista dos republicanos e a política pacifista dos democratas na arena internacional. E neste particular, o exemplo de Barack Obama não emergirá certamente da falsa esperança que o mundo em geral e África em particular almejam. Sobretudo porque Barack Obama, felizmente lúcido e sensato, não fez promessas que coloquem o mundo numa situação futura de frustração em caso de manutenção do status quo. Até, porque os slogans “The Change We Need!” e “Yes, We Can!” não foram concebidos para o mundo mas para os americanos.
Aliás, os africanos – sobretudo estadistas – são particularmente espectaculares quanto a estranha capacidade de almejarem esperanças nunca concretizáveis do Ocidente. Em Angola, no limiar da execução dos acordos de Bicesse, George Bush (pai) ainda não tinha passado o testemunho a Bill Clinton e já MPLA sentia o privilégio de se ver favorecido em detrimento da UNITA pelas relações geralmente moderadas dos Democratas contra a política incentivadora do belicismo e militarismo dos Republicanos. O tempo demonstrou a constância da política americana com o mandato democrata indiferente a paz efectiva de Angola. É claro que a mendicidade dos africanos de tão profunda proporciona sonhos atrevidos. Contudo, o que é básico, e de aviso a navegação, é que os americanos têm os olhos apenas na sua economia e todas as relações políticas gravitam em torno desta realidade. Visto que as relações de poderes assentam na lógica da destruição (mandato republicano) e construção (mandato democrata), a sucessão de ambos os partidos está centrada aos problemas que a economia americana levanta. Por isso, não é de esperar de Barack Obama mais do que se esperou de outros presidentes americanos senão a satisfação das exigências simbólicas, i.e., esperar-se que o primeiro presidente negro não “descarrile” no seu mandato para que o trauma de ser negro não prevaleça nas mentes daqueles que julgam a incapacidade humana pela cor da pele.
Entretanto, Barack Hussein Obama sobe ao podium do reconhecimento universal com um magnífico exemplo para os africanos. O exemplo do diálogo cordial com os adversários políticos como poucos outros estadistas no mundo ensaiou. Começou no seio do seu próprio partido com uma atitude cooperante com aqueles com os quais disputou a candidatura a casa oval e culminou com a conquista da simpatia e colaboração dos próprios republicanos.
Vale para os africanos que a oposição agressiva (oposição por oposição) – muito agenciada no mercado político africano – é, em Barack Obama, um artefacto primitivo e prejudicial para harmonia e paz social que revela o instinto básico humano próximo da selvajaria e da violência. Sua fulgurante ascensão e rápido progresso político demonstra que é possível uma atitude mais integradora com o próximo e mais reconstrutora do adversário em ambientes de concorrência partidária.
O esmagamento eleitoral e legal a que foram submetidos os partidos políticos da oposição civil angolana recentemente extintos é prova perfeita de relações partidárias conflituosas onde a oposição aposta ferrenho na queda do regime instaurado e o partido da situação em reacção aposta na expurga dos “rebeldes” políticos através de legislação e mecanismos eleitorais pouco saudáveis para o ambiente democrático emergente. E o resultado esta aí: uma Assembleia Nacional que nem mesmo ao MPLA orgulha. Esta situação, é consequência de relações de choque e extrema violência política causada pelos movimentos de libertação (MPLA, UNITA e FNLA) e que trespassam as mentes da nova geração de políticos com fanatismo e radicalismo na defesa de interesses partidários. Na verdade, o recorte psicossociológico das relações político-partidárias expõe a realidade segundo a qual os interesses agenciados por aquelas principais forças políticas angolanas se tornaram irreconciliáveis a partir da independência nacional, vindo daí uma luta política assente no ódio, vingança e ressentimento. A solução histórica de destruição das forças opositoras que levaram a UNITA ao “tapete” é a evidência da política dos “interesses irreconciliáveis” que anima, do mesmo modo, forças como FNLA (ala histórica), FLEC-FLAC, etc. Há nestas forças a ideia da humilhação e derrota política e o almejo por um futuro em que o projecto de controlo absoluto do Estado será concretizado. Esta obsessão leva a que muitos dos líderes dessas formações políticas estejam ultrapassados pela dinâmica histórica pela busca incessante do momento da “vingança” sem considerar os interesses do eleitorado. Daí atitudes como falta de interesse em analisar e propor alternativas as medidas governamentais e a aposta constante na ideia de traição perpetrada por quem controla o Governo.
Com o espírito assente em interesses irreconciliáveis, os angolanos jamais passarão por processos eleitorais sem levantar suspeições, mesmo quando previamente concordem com os mecanismos eleitorais. Tão pouco os resultados eleitorais serão vistos como vitória do povo e meio de normalização do Estado. Sempre significarão humilhação, marginalização e submissão de uns pelos outros perpetuando o ódio, a vingança, o medo e o desespero, causando instabilidade dos espíritos na construção de um Estado Democrático e de Direito. A lógica dos interesses irreconciliáveis é socialmente perigosa por mergulhar os cidadãos em posições histórico-ideológicas radicais em defesa de meros símbolos partidários. O exemplo de Barack Obama deve despertar-nos desta realidade. Uma realidade em que cada cidadão ofuscado pela defesa egoísta do seu interesse projecta no partido a sua arma de combate contra os interesses do adversário, seu concidadão. O povo angolano pode questionar-se sobre as razões pelas quais não admitiu a entrada de ideias diversificadas no parlamento e concluir que produziu ele mesmo um contra-senso, frenando o progresso do seu próprio projecto de Estado Democrático e de Direito. Ainda no velho parlamento foi visível a falta de concertação em assuntos de interesse colectivo no seio dos deputados de vários partidos. Aí, a guerra parlamentar (o jogo do ataque e defesa verbal) foi uma constante. Mais do que a promoção dos interesses públicos sobreviveram os projectos partidários. E tudo devido a violência política, encoberta no discurso intolerante a diferença.
Ora, o exemplo de Barack Obama é suficientemente eloquente para colocar o povo angolano em introspecção sobre o seu projecto de democracia e demais sugestivo para a nova geração de políticos. O exemplo sugere que esta geração deve protagonizar uma verdadeira rotura com a velha geração de políticos que desenvolveu durante anos e anos o hábito pelo discurso truculento e contra-democrático. O hábito pelo reconhecimento dos feitos e obras produzidas pelos governantes e a crítica sugestiva correspondente com espírito de nação e em prol dos interesses colectivos deve caracterizar a nova geração de políticos se quiser sobreviver aos próximos desafios partidários e eleitorais. Que sirva e sobreviva nos angolanos o exemplo de Barack Obama!
* www.jukulomesso.blogspot.com
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