quinta-feira, 24 de setembro de 2009

ESTUDOS DE DIREITO PÚBLICO E MATÉRIAS CONEXAS

UMA VISITA PARCIAL À OBRA DE ADÃO DE ALMEIDA

Albano Pedro

ESTUDOS DE DIREITO PÚBLICO E MATÉRIAS CONEXAS como obra de literatura jurídica lançada na passada terça-feira (24 de Setembro) no Auditório Maria do Carmo Medina da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto é uma humilde contribuição do Mestre Adão de Almeida ao debate sobre as sempre polémicas questões do Direito Público e afins que arrastam ao abismo do debate extremo as mais intrigantes e inconciliáveis questões sociais e políticas, sobretudo em países com certo grau de primitivismo político como os africanos; humilde contribuição porque por um lado a insuficiência de textos é indirectamente proporcional, as expectativas que o mundo académico sempre alimentou sobre um dos mais bem sucedidos estudantes de Direito da Universidade Agostinho Neto dos últimos dez anos e por outro lado a grandiosidade da cerimónia de lançamento deixou por justificar a magreza da obra que se limitou a escassos cinco artigos de opinião, assim estampados. Lazarino Poulson de forma exigente precisou juntar muito mais textos para pôr ao consumo público em forma de textos compilado mesmo quando ninguém o tivesse antecedido. Cremildo Paca elevou-se ao nível de um verdadeiro literata do mundo jurídico ensaiando a sua entrada em grande com uma obra de dimensão histórica de grande relevo a partir de Portugal (editora Almedina). Porém Adão de Almeida não precisou tanto. Cinco artigos e mais uma persuasão amigável (e quiçá mercantilista) de Gilberto Luther fez nascer a sua primeira obra. A maioria de seus contemporâneos esperou na primeira obra grande volume teórico e discursivo sobre questões jurídicas – não polémicas porque Adão de Almeida nunca demonstrou qualquer vocação nesse sentido – pelo menos historicamente relevante dado ao grande e inegável desempenho estudantil deste jurista de origem malanjina. Eu próprio esperei um pouco mais do que de Cremildo Paca que trouxe a sua contribuição a volta da justiça administrativa – que confesso, me colocou na condição de a reconhecer como uma das maiores obras jurídicas angolanas dos últimos dez anos – ; esperei uma colectânea dos vários textos elaborados ao longo dos anos em que foi agraciado de prémios por eloquentes desempenhos estudantis. Nesse período vários textos foram certamente elaborados para merecerem prémios. Adão de Almeida frustrou seus admiradores por não colocá-los em exposição pública. Pelo menos na sua primeira obra. Se promete uma próxima edição em que incluirá tais textos estaremos de parabéns. De qualquer modo, está ainda assim de parabéns ao lançar a sua primeira obra. Com ou sem defeitos a primeira obra é sempre glorificada pela coragem e ousadia do seu autor. Passemos então em análise:

Ao tratar de Direito Constitucional, Ciência Política, Direito do Contencioso Administrativo e Metodologia do Direito, Adão de Almeida contrariou seu apresentador Bornito de Sousa, que prefere limitar os investigadores a pesquisa de conteúdos estreitos àquilo que chama de especialização contrariamente ao enciclopedismo, i.e., capacidade de interpretar fenómenos científicos de múltiplas dimensões. Sempre desconfiei que a mediocridade intelectual estivesse ligada a preguiça ou ao auto-limite mental e esta despropositada persuasão deu-me provas acabadas a propósito. Eu própria me sentiria um intelectual sem possibilidade futura de brilho se os meus conhecimentos simplesmente gravitassem a volta do Direito, já porque ser político – caminho seguido por muitos – requer estar preparado para filtrar um pouco de todos os conhecimentos que se cruzam no campo governamental ou legislativo. Adão de Almeida tem o mérito de desenvolver uma análise transversal do Direito Público numa perspectiva claramente enciclopedista. Visitou e revistou matérias que seus antigos mestres (Adérito Correia e Bornito de Sousa) estão já longe de alcançar, um pouco devido a falta de ousadia que começa a caracterizar a nova geração de juristas, encabeçada por Lazarino Poulson. A economia investigativa e altruísmo comunicativo certamente recomendam uma análise pontual da obra. Assim é que nos estreitaremos a um único artigo pela importância social, visto que o conhecimento não útil a sociedade não é digno de ser chamado a discussão.

Afasto preliminarmente a discussão a volta da Metodologia do Direito ou – como prefiro chamar – Metódica Jurídica pela simples razão desta matéria estar entre nós vulgarizada por pouco familiarizada com os mais profundos problemas do Direito. Quando comecei a dialogar com jurista alemães atreitos a filosofia e metodologia do Direito comecei a sentir que falar da metodologia do direito é um pouco mais – e profundamente mais do que falar de meras interpretações técnico-jurídicas ou menos ainda técnico-legais como recomenda o primitivismo académico português dos tempos modernos. É direccionar o discurso jurídico a um dos mais elementares problemas do Direito – hoje desenvolvido em sede da sociologia jurídica – que é a correspondência material do direito formal, i.e., levar a compreensão popular (destinatário da norma jurídica), mediante técnicas adequadas da hermenêutica jurídica, que o Direito completa-se com a correspondência entre a Lei Constitucional e demais leis ordinárias (sistema jurídico) e as vivências do povo angolano em todas as dimensões culturais, artísticas, sociais, económicas e políticas (sistema político). É desta metodologia – a das formas do nascimento e vigência do Direito – que me preocupa por convocar reflexos de profundidade filosófica e metodológica que escasseiam no mercado intelectual angolano. É pois elementar a abordagem metodológica vazada por Adão de Almeida por relacionar conteúdos de natureza judicial.

Deixaremos tudo o resto para recrutarmos em debate a dimensão indagativa manifestada na abordagem do contencioso administrativo pela utilidade lógico-discursiva aí encerrada. Com elevada eloquência, propõe o ilustre mestre que devido a insipiência da tutela judicial efectiva a luz da lei constitucional é urgente a subjectivação do contencioso administrativo, no caso, angolano. Seria certamente um lugar-tenente se os termos dialogassem por si mesmos. Entretanto desenvolve a virulência de um problema de fundo que enferma o contencioso administrativo acantonando todas as actuais soluções a este propósito. Senão reparemos: Quando acha convocável a subjectivação do contencioso administrativo o ilustre mestre prende-se a meras recomendações académicas em que é habitual a ideia fixa de que o contencioso administrativo angolano é de feição puramente objectivo, já porque pontifica um sistema contencioso de mera anulação, já porque permite a invocação da inexecução da sentença. Contudo, esta perspectiva, que o ilustre mestre toma para rumar nestes mares tenebrosos, não atrela em socorro um argumento de grandiosa importância que é a legitimação da subjectividade do contencioso administrativo ao nível constitucional. O ilustre mestre não cura de extirpar o sistema jurídico angolano em Lei Constitucional e Leis ordinárias para achar o meio-termo da análise do problema que levanta. Esquecendo de analisar e polemizar o artigo 43º da Lei constitucional ruma desavisadamente ao encontro de soluções precárias incrustadas na legislação administrativa e conclui, quase robóticamente – e por sugestão académica – que o contencioso administrativo angolano é objectivo por curar mais da legalidade do que dos interesses e direitos subjectivos. Puro erro de análise técnica, a meu ver. A Lei constitucional, rica em contradizer todo o sistema jurídico angolano – por manifesta incapacidade técnica de seus mentores em correspondê-la as demais normas, facto causado pela sua inovação em detrimento de um ordenamento jurídico-infra constitucional arcaico arrastado da era colonial – farta-se em desautorizar a Lei, maxime do contencioso administrativo. Tornou-se já corrente o facto de que o Princípio da Impugnação dos Actos Administrativos impera de forma revogante sobre o sistema judicial administrativo ao ponto de diminuir a importância da chamada obrigatoriedade da precedência do recurso hierárquico. É uma clara demonstração da subjectividade constitucional do contencioso administrativo. Com efeito, o artigo 43º manifesta todo o vigor de um contencioso subjectivo que cura dos interesses e direitos subjectivos em detrimento do fundo legal da norma em tutela de interesses tidos como públicos. Mais. Quando os princípios da administração pública – enquanto balizas estruturantes do procedimento da administração pública, mesmo quando enfrentam os limites contenciosos, permitem que o principio da impugnação dos actos administrativos como unicórnio em favor do particular enfrente isoladamente e de forma equilibrada os demais princípios entre os quais o da legalidade estamos em presença de um sistema subjectivo – a que chamaria de inconsciente pela incapacidade de seus mentores em identificar e teorizar oportunamente.

É minha obsessão que a literatura jurídica angolana desenvolva ao nível das exigências técnicas universais. Daí que, minha reflexão não vem rabiscar qualquer mérito a obra. Pelo contrário vem enaltecê-la curando de identificá-la entre os vários escritos técnicos que levantam argumentos para debates ousados ao nível do Direito potenciando novas obras. Estou certo de que se o autor da obra der alguma importância aos argumentos aqui debitados teremos no futuro a sua obra mais alimentada. Vale pois sustentar que se desejou uma análise enriquecedora de seu texto, susceptível de, na dimensão da sua humildade, posicionar o seu esforço e tamanho intelectual ao nível merecido, este terá pois materializado a sua excelente e preciosa máxima segunda a qual “agradecer quem nos ajuda a alcançar os nossos objectivos é um elementar dever de justiça”. Está de parabéns o autor por “parir” assim o seu primeiro filho intelectual e está de parabéns a Casa das Ideias que sendo uma editora revolucionária no domínio da literatura jurídica concebeu um padrão gráfico atraente e inovador para a obra ora lançada. Bem-haja!

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

IMPLICAÇÕES DA FALTA DE CONTRATO DE TRABALHO

Albano Pedro

É corrente, os empregadores não formalizarem contratos com os trabalhadores. Alguns a pretexto de admitirem provisoriamente os trabalhadores perspectivando o fim da relação laboral a curto prazo devido ao período de estágio ou simples uso provisório dos préstimos laborais do trabalhador, outros por simples má fé contando que a falta de contrato de trabalho retira qualquer responsabilidade legal em caso de despedimento sem justa causa. São pensamentos que ocorrem em muitos empresários quando se propõem a empregar novos trabalhadores. Estratégias que se revelam falhas quando surgem litígios judiciais por propositura de acção em matéria laboral em tribunal pelo trabalhador descontente com o modo injusto com que foi tratado ou despedido.

A Lei Geral do Trabalho (LGT) prevê duas modalidades de contrato de trabalho quanto a sua duração (art.º 14º). A primeira, que é regra, é o contrato de trabalho por tempo indeterminado. A segunda, que é excepcional e que só é admitida nas condições e prazos previstos na LGT (art.º 15º e 16º), é o contrato de trabalho por tempo determinado. Este prevê duas variantes: o contrato de trabalho por tempo determinado a termo certo – em que o prazo do fim do contrato vem expresso no contrato como certo (por exemplo, o contrato finda no dia 10 de Agosto de 2010) e o contrato por tempo determinado a termo incerto – em que o prazo final do contrato é condicionado pela ocorrência de um determinado facto (por exemplo, o prazo do contrato finda com o regresso do trabalhador substituído que foi dispensado por razões de doença grave). Ora, todo o contrato por tempo determinado deve ser reduzido a escrito (n.º 2 do art.º 14º) uma vez que deve estar patente o prazo do contrato – pois trata-se de um contrato com certo prazo de validade – sob pena de inexistência. Assim, sempre que entre o trabalhador e o empregador não se estabeleça um vínculo laboral formal por falta de celebração do contrato de trabalho correspondente a LGT presume inilidivelmente a existência de um contrato por tempo indeterminado – por ser regime regra não é obrigatório que seja reduzido a escrito – que estabelece regimes rígidos para a sua estabilidade.

Havendo um contrato celebrado entre as partes em regime de contrato por tempo determinado em que a data da celebração do contrato é posterior a data do início da relação laboral efectiva, em caso de litígio laboral o tribunal interpretará o contrato como tendo subjacente a modalidade de contrato por tempo indeterminado visto que por altura do início efectivo da relação laboral não ter sido celebrado o contrato desejado remetendo automaticamente a relação jurídico-laboral à modalidade de contrato por tempo indeterminado. Piora a sua situação judicial, em caso de litígio, o empregador que por razões diversas julga prudente não celebrar contrato de trabalho com o trabalhador. A falta de contrato escrito implica a que o trabalhador seja radicalmente defendido pelas cláusulas legais do contrato de trabalho por tempo indeterminado como regra.

ELEIÇÕES LEGISLATIVAS DE 2008: IRREGULARIDADES E ILEGALIDADES

















A PROPÓSITO DA OBRA DE VASCO CRISTÓVÃO

Albano Pedro

A obra que me proponho a apresentar cujo título é NÃO É VERDADE QUE AS ELEIÇÕES LEGISLATIVAS DE 2008, FORAM LIVRES, JUSTAS E TRANSPARENTES: EXISTEM PELO MENOS 100 RAZÕES da autoria de Vasco Cristóvão, Médico e candidato as próximas eleições presidenciais, vem ao grande público angolano como um diálogo estatístico necessário com a consciência do eleitorado angolano que afluiu em massa para o importante acto político – que representa o único momento do exercício de soberania do povo que a constituição angolana tem consagrado. Um diálogo em que a comparação da intenção de construção do Estado Democrático e de Direito é posta a prova ante a visível materialização de um contra-senso político operado com as visíveis irregularidades e ilegalidades. Vasco Cristóvão como Médico – educado e habituado a averiguar com zelo o desempenho do corpo humano em toda a sua dimensão e complexidade – traz a sua obsessão profissional ao terreno social procurando alertar sobre a carga virulenta que enferma a realidade social mormente no exercício dos actos eleitorais. Por isso, publica este testemunho, por isso é candidato as eleições presidenciais. Uma obsessão já experimentada pelo líder fundador da nação – Dr. António Agostinho Neto – que como Médico emprestado à política provou-nos, sobretudo àqueles que viveram os momentos da luta de libertação colonial, que a liberdade de pensar e estar é o mais importante bem psicológico do homem e a melhor condição social de um povo.

Recentemente o Instituto de Desenvolvimento e Democracia (IDD) lançou em Luanda uma obra de teor similar intitulado Angola – Livro Branco Sobre as Eleições de 2008. A obra de Vasco Cristóvão vem completar as reflexões apresentadas naquela obra dando uma dimensão menos partidária e mais nacional da análise do fenómeno da fraude operada com as eleições legislativas de 2008. Afinal, se é sabido que as eleições legislativas de Setembro de 2008 não produziram os resultados esperados pelo povo angolano, ao invés, permitiram o surgimento de uma ditadura parlamentar com vitória esmagadora do MPLA o que por si só faz-nos desconfiar que o povo angolano – consciente e responsável – não desejou tal resultado, uma vez que com ela morre a democracia que se pretende multipartidária, então o povo angolano foi traído pelos resultados eleitorais. Assim, alguma suspeição deve ser colocada ao processo eleitoral. Vasco Cristóvão completa as nossas suspeições com provas concretas das irregularidades e ilegalidades em quantidades arredondadas a 100. Quem desconfia que as eleições não correram bem terá certamente necessidade de adquirir este livro de 91 páginas publicado sob a chancela da editora portuguesa rio de imagem, Lda.

A obra passeia toda a sua magnitude a volta de 100 questões propositadamente seleccionadas num universo de milhares de questões sobre os mecanismos fraudulentos que todos os angolanos testemunharam durante o processo eleitoral que culminou com a eleição do MPLA em maioria esmagadora sobre a oposição civil. A selecção das 100 razões não retira qualquer mérito a todas as outras. Estampam-se as 100 razões por motivos de economia política – permitir que o povo raciocine sobre todo o processo eleitoral a partir da leitura de qualquer uma delas; estampam-se por razões gráficas – a publicar todas as razões o livro teria certamente um tamanho que ninguém conseguiria carregar consigo dado o seu volume e peso para além do preço que seria certamente inacessível para todos aqueles que têm interesse em compreender e reflectir o processo eleitoral e sobretudo estampam-se por razões ético-morais – para que os angolanos possam comparar as fraudes relatadas com os discursos que procuram passar a ideia de que não houveram irregularidades e ilegalidades no processo eleitoral. E acima de tudo, uma base de dados necessária para os políticos, estudiosos, académicos e todos aqueles que queiram sustentar as suas declarações públicas com dados palpáveis quando afirmarem que as eleições legislativas de 2009 afinal não foram livres, justas e transparentes. É um livro-prevenção – para todos nós que auguramos novas e contínuas eleições daqui em diante – alertando-nos sobre os cuidados a ter nos próximos momentos eleitorais; é um livro-alerta – para todos aqueles que não votaram, por razões etárias e outras, e esperam fazê-lo com liberdade, justiça e transparência democrática nas próximas eleições sejam elas legislativas, sejam elas presidenciais, sejam elas autárquicas.

Embora não prefaciada, a obra tem o mérito de apresentar-se por si mesma pela elucidante introdução feita pelo próprio autor, desenha ela mesma uma trajectória que permitirá que o leitor perceba, com necessária antecedência, o conteúdo global da obra e a sua razão de ser. Pelo que declino quaisquer considerações adicionais a esse propósito, visto que se o fizesse retiraria todo interesse em adquiri-la. A obra garante seguramente uma leitura fácil e simultaneamente intrigante sobre as múltiplas fraudes descritas em ordem númerica como sugere a selecção das questões. É pois feliz a obra que vem a bom propósito como um testemunho histórico para gerações presentes e futuras que recorrerão aos seus dados para obterem as impressões necessárias que permitirão um julgamento com rigor a veracidade dos factos sobre as eleições legislativas de 2008 e mais feliz ainda o seu Autor que com senso de vigilância política e idoneidade intelectual para além de demonstrar um espírito de cidadania sólido veio brindar-nos com esta pequena obra de grande impacto político e gigantesca repercussão histórica. Parabéns!

Contacto do Autor da Obra: 923620814 / vascoquibio@yahoo.com.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

(DES)CONSTRUÇÃO DO ESTADO DE DIREITO

SOBRE OS 30 ANOS DE PODER DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Albano Pedro

Numa análise jurídica e política dos 30 anos de governação de José Eduardo dos Santos (JES) é possível adivinhar três fases essenciais em que os méritos e deméritos se confundem numa governação de cunho autocrático sob formas clássicas primeiro de democracia socialista (centralizada) e segundo de democracia pluripartidária. São essenciais a fase de ascensão (desde a sucessão ao primeiro presidente as primeiras eleições democráticas) – em que JES manifesta uma obediência canina ao MPLA quase confundindo a sua acção governativa com a do partido; a fase da consolidação (desde 1992 ao fim definitivo da guerra civil) – em que JES começa a tomar consciência da governabilidade do Estado de forma não colegial; e a fase do declínio (desde a assinatura do memorando de entendimento do Luena aos dias de hoje) – em que se verifica a separação entre o seu elenco governativo e o MPLA transparecendo apetência para concentração de riqueza e controlo do poder político para além dos interesses do MPLA com a ideia de eternidade no poder por eventual transmissão aos filhos. As três fases completam-se num gráfico em que a curva representa uma queda qualitativa na progressão governativa diminuindo ano após ano as expectativas políticas dos angolanos relativamente aos esforços empreendidos e sacrifícios consentidos na luta pela independência nacional em meio ao desvalor do quadro jurídico-constitucional e legal que ganha o ápice com o total desrespeitos aos mais elementares direitos humanos quer pela violação de direitos e interesses constitucionalmente protegidos quer pela falta de interesse em realizar as expectativas económicas e sociais auguradas pela maioria do eleitorado que tem depositado confiança e esperança a pessoa do Presidente da República.

Dentre os méritos surgem situações visíveis de concretização da soberania popular materializadas com a corporização dos diálogos com a UNITA que deram lugar aos acordos de Bicesse e de Luzaka para o fim da guerra civil – não está em causa quem terá tomado a iniciativa – e a consequente marcação das eleições de 1992 e 2008 – apesar da quase inexistente vontade de “cedência” do poder –, possibilitando o nascimento de um texto constitucional de relativo consenso na forma da Lei 23/92. Nos dias de hoje a grande tendência de extensão económica da governação de JES – embora em detrimento da dimensão social – é sensível com o investimento no betão (plano de megalópoles) e com a formação de uma classe capitalista detentora da maioria do capital, transferindo o poder financeiro do Estado a núcleos de confiança numa clara, porém precária, imitação de Dubai. Uma tentativa de reforma da Lei Constitucional – as restantes são meras “correcções ortográficas” pontuais num fundo constitucional centralista operadas antes de 1992 – podem ser inscritos no palmarés do mais alto magistrado da nação (Lei de Revisão Constitucional n.º 23/92), embora em nada tenha contribuído para conformar a realidade constitucional ao texto constitucional de forma a realizar o encontro dos cidadãos com o texto da Magna Carta.

Em demérito arrastam-se muitíssimos casos que podem ser pulverizados em todos os sectores da vida da nação basicamente sustentados pela existência de um sistema jurídico formal e a sua consequente ineficiência material. A prova primeira desta realidade é a contestável legitimidade do mandato presidencial que se arrasta há anos, desde o longínquo ano de 1992 em que se realizaram as inconclusivas primeiras eleições. Para a gestão do erário público constituem particulares desastres a alienação desregulada do património público em geral (imóveis públicos e expropriação ilegal de grandes extensões de terras aráveis de camponeses) e das empresas públicas por via de falência forçada (casos da Angonave e muitas outras que desapareceram do mapa empresarial do Estado sem visível justificações) dando origem a oligopólios privados. A aprovação da Lei de Terras, o novo regime Jurídico da delimitação das actividades económicas e vários outros diplomas legais reguladores do sector económico e financeiro são dos grandes instrumentos que JES utiliza qual boomerang para arremessar contra os seus partidárias para de seguida voltar-se contra si mesmo. É nesta óptica visível a pretexto de combater a corrupção, a tendência para a expropriação de propriedades, sobretudo imobiliária, detidas por altas patentes das FAA e membros do Governo. Assiste-se assim, a uma coreografia diabólica que levará certamente JES a uma situação de crise irreversível de governação culminando na falta de apoio interno no seio do próprio MPLA descrevendo com isso uma curva negativa na sua progressão política até aqui linear.

As injustiças descritas com inúmeras violações a Lei permitiram o surgimento da greve mais longa do mundo protagonizada pelos trabalhadores da extinta Angonave. É ainda, neste campo, marcante a existência de numerosos diplomas legais inconstitucionais vagando arbitrariamente pelo sistema jurídico angolano. São exemplos a Lei das Reuniões e Manifestações, a Lei de Imprensa entre muitos outros diplomas legais. É sensível neste particular a tendência para impor um quadro normativo antidemocrático para sustentar um modelo governativo do tipo centralista.

A invasão de estrangeiros, viabilizada por um regime jurídico dos estrangeiros perigosamente permissivo, tem sustentação paternal nestes 30 anos de Governação em que os cidadãos são-tomenses e cabo-verdianos tinham título de cooperantes ganhando salários avultados contra a magra remuneração dos angolanos, situação que modernamente se alargou para numerosos estrangeiros entre brasileiros e portugueses entrincheirados nos diversos organismos públicos e interesses detidos pela minoria capitalista emergente ligada ao regime. A negociação do contrato bilionário com a China favorecendo largamente o emprego da mão-de-obra chinesa em detrimento da nacional é o exemplo refinado da falta de vontade política em desenvolver os recursos humanos angolanos para os desafios em prol do desenvolvimento do país.

Com o advento das eleições de 2008 uma acção com vista ao desaparecimento de importantes partidos políticos e a consequente democracia pluripartidária foi desencadeada com a aprovação do pacote legal referente ao processo eleitoral numa clara violação aos princípios consagrados na Lei Constitucional culminando com a vitória esmagadora do MPLA numa clara implementação do projecto de controlo absoluto do poder para completa depredação do erário público e controlo das instituições do Estado ao serviço de interesses particulares. Assim, a democracia alcançada em 1992 foi gravemente diminuída infundindo um clima de incerteza quanto o futuro político nacional.

No campo criminal, mortes como as de Mfulumpinga Nlandu Victor e de Ricardo de Mello não foram sequer alvos de inquérito investigativo conclusivos. A criminalidade infantil impune foi alimentada durante muito tempo pela falta de estabelecimentos prisionais vocacionais. Milhões de dólares americanos desapareceram dos cofres do Estado através de Ministérios e outros departamentos governamentais em diversas ocasiões numa clara alusão a permissividade da corrupção institucional e sem quaisquer consequências graves para os seus titulares, enquanto que Fernando Garcia Miala desaparece aos poucos numa prisão legalmente infundada. Faculdades legais como a amnistia, indulto ou a comutação de penas foram fartas vezes exercidas para beneficiar cidadãos com envolvência criminal aos bens patrimoniais delapidados do Estado em detrimento de indivíduos como os ex-membros da SIE com cadastro criminal de causa e idoneidade duvidosa.

O reflexo das insuficiências, incoerências e violações legais durante os 30 anos de poder de JES é fundamentalmente marcada pela falta de certeza e segurança jurídica – formatado noutros termos como imprevisibilidade funcional das instituições do Estado – a que se encontram mergulhados os cidadãos angolanos ganhando o ponto máximo com situações como as demolições massivas de moradias que ocorrem um pouco por toda a parte de Angola desabrigando milhares de famílias em gritante apelo ao desrespeito aos mais elementares direitos humanos, quando muito e a descompensada petulância na violação das normas de procedimento administrativo, quando menos. O que nos permite dispor que Angola é hoje Estado de Direito sem consagração formal, sobrevivendo com uma prótese constitucional na forma da Lei n.º23/92 em suporte a um aparelho jurídico obsoleto quando se tratam de disposições de natureza cível e criminal e reflectindo, pelas enormes insuficiências, marcadas nuances de uma realidade pró-centralista quando em matérias públicas, cuja provisoriedade se estende de forma indefinida com a recém criada comissão de Revisão Constitucional.

Nesta última fase do mandato de JES (incluindo uma eventual reeleição) é adivinhável a crise instalada no seio do MPLA em que se percebe que JES perde cada vez mais apoio, o que recomenda a necessidade de instalar um mecanismo constitucional como as eleições ditas “atípicas” para não permitir que o MPLA ao controlar o processo eleitoral não o defraude com uma espécie de “golpe partidário” na expectativa de renovar o seu mandato. Urge pois controlar a olhos vistos quem o apoia neste projecto de renovação de mandato. Façanha possível apenas numa Assembleia Nacional habituada ao voto de mãos levantadas.

(Texto comemorativo dos 30 anos de poder de José Eduardo dos Santos como Presidente da República elaborado a pedido de Tandala Francisco, Director Geral do Semanário A CAPITAL)

AS OBRIGAÇÕES COMO MEIOS DE FINANCIAMENTO ALTERNATIVOS AS EMPRESAS

Albano Pedro

É prática no mercado financeiro angolano as empresas serem financiadas apenas pelo recurso ao crédito bancário. Quando, em mercados financeiros modernos, inúmeros mecanismos de financiamento são expostos à alternativa das empresas concorrendo com os produtos bancários e promovendo maior possibilidade de sobrevivência das empresas recém-criadas ou em risco de falência devido as naturais flutuações do mercado como as que se vivem com a actual crise financeira mundial.

Entre estes produtos financeiros está a obrigação – que se define como um título de dívida através da qual o seu titular tem um direito de crédito sobre a entidade que a emite, estando subjacente uma estrutura jurídica dominada pelo contrato de mútuo (tradicionalmente usada para a concessão de crédito bancário). Acontece que uma empresa é por Lei autorizada, e sob determinadas condições, a emitir títulos de dívidas para o seu próprio financiamento em caso de necessidade de aumento de capital para renovação de investimento entre outros fins (é o que se chama hetero-financiamento por alternativa aos meios de financiamento regulares proporcionados pelo mercado bancário). Quanto a finalidade é muito semelhante aos títulos de dívida pública (bilhetes do tesouro – Treasury bills – e obrigações do tesouro) normalmente emitidos pelo Banco Central para financiar a economia como um todo através de execução do Orçamento Geral do Estado. A obrigação é pois mutatis mutandis a versão privada dos títulos de dívida pública. O reconhecimento da capacidade das empresas para a emissão destes títulos varia de sistemas financeiros. Em Portugal, por exemplo, são as próprias empresas que têm capacidade de emissão directa. Em muitos outros países esta capacidade é reconhecida a entidades financeiras vocacionadas entre empresas gestoras de bolsas de valores e outras instituições financeiras.

A obrigação prevê o pagamento de juros ao seu titular (obrigacionista) numa periodicidade que pode ser semestral, anual ou outra, podendo mesmo acontecer que os juros sejam pagos ao obrigacionista no fim do período de vencimento total da obrigação, altura em que os mesmos são pagos conjuntamente ao reembolso dos valores titulados. Assim, os particulares (indivíduos e organizações com ou sem interesse comercial) emprestam as suas poupanças em reforço aos capitais das empresas quando estas não confiem nas ofertas do mercado bancário. Saiba-se que em certos países, entidades públicas como os municípios recorrem a este mecanismo de financiamento. A inexistência de uma legislação sobre valores mobiliários que regule as obrigações – estabelecendo modalidades, formas e prazos de vencimento bem como entidades com capacidade de emissão das mesmas – impede o surgimento legal deste valioso mecanismo de financiamento alternativo as empresas angolanas imputando-se nesta falta uma das causas da alta taxa de mortalidade das PME (pequenas e médias empresas) angolanas.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

OS DESRESPEITOS CONSTITUCIONAIS

COMENTANDO ABEL CHIVUKUVUKU E RAUL ARAÚJO

Albano Pedro

O apaixonante debate recentemente realizado pela TV Zimbo, opondo o jurista Raul Araújo e o político Abel Chivukuvuku, foi sem dúvidas um dos acontecimentos mais marcantes dos últimos meses na cena política angolana. Promoveu a abertura do “bau” dos segredos sobre as eleições indirectas a que o jurista Carlos Feijó glosou sabia e oportunamente como sendo atípicas na medida em que não se enquadram nos modelos tradicionais por serem produtos de vontades, por vezes disformes ou pouco claras, de indivíduos embora legalmente inofensivos, como de resto são as relações jurídicas atípicas entre as quais comummente encontramos a tipologia de contratos que recebe tal denominação, i.e., contratos atípicos. Procurando distrair a assistência com argumento de que não haveria contraponto discursivo na medida em que estaria como técnico sem compromissos de ordem política, o jurista Raul Araújo não curou de delimitar a sua acção no discurso meramente técnico revelando o grande segredo por detrás das eleições indirectas que é afinal, feitas as contas, a necessidade de impedir a candidatura de Abel Chivukuvuku como candidato independente enquanto ameaça a manutenção do mandato de JES para além das próximas eleições presidenciais. Era vísivel a defesa indisfarçável sobre o projecto de JES (porque Abel Chivukuvuku provou que o projecto não é do MPLA) sobre as eleições indirectas. Sem se afirmar como político Raul Araújo foi mesmo ao ponto de achar aceitável num Estado Democrático e de Direito que sejam impedidas candidaturas individuais – mesmo quando a vontade da maioria dos eleitores nelas se reflicta – por razões quase patéticas como a prevenção da demagogia, como se esta não fosse natural no perfil retórico de políticos para além de não ser mais prejudicial do que a existência de dirigentes corruptos. De tão precária resvalou para uma triste doutrina sobre a proibição da dupla revisão constitucional recomendando a desastrosa ideia de que a doutrina como fonte de Direito tem natureza reformadora sobre a Lei (no caso Constitucional) quando os mais elementares conhecimentos de Direito sustentam sem esforço lógico que a doutrina constitui mera opinião não sendo sequer considerada sobretudo em sistemas legais (Romano - germânico) como o nosso em que a Lei exerce um verdadeiro monopólio sobre as demais fontes de Direito. A dupla revisão constitucional é certamente condenável na opinião de um ou dois juristas – provavelmente agentes de sistemas jurídicos estranhos – não o é concerteza da nossa Lei Constitucional que permite a sua revisão a todo tempo sem curar de limitar as supostas duplicidades. Assim, mesmo quando não era possível defender-se politicamente Raul Araújo devolveu-se mal à sua condição de jurista em numerosos episódios. Por exemplo sustentar que o Presidente da República tem legitimidade para governar é do ponto de vista político um verdadeiro disparate atribuível a uma certa falta de reflexos técnico-legais quando é certo que a simples falta de eleição desse órgão retira o seu sentido de soberania, mesmo quando um suposto acórdão do Tribunal Supremo (nas vestes de Tribunal Constitucional) se esforce ingloriamente em aliviar a situação da ilegitimidade instalada. Erros de palmatória do género, já foram agenciados em foros diversos como na conferência havida na Universidade Lusíada em que o industrioso jurista sustentou que a construção de uma nação é um desafio difícil quando é certo que tal como o fenómeno da economia a nação é um conjunto de valores que evolui espontaneamente sem o concurso consciente dos agentes políticos, não importando esforços por não ser planificável, e que afinal a dificuldade construtiva esta menos no espírito (nação) que no corpo (Estado) de Angola. É o Estado que encerra enormes dificuldades na sua construção e a prova está em que o modelo de Estado unitário tem sido a maior dôr de cabeça dos angolanos ao ponto de fazer jorrar rios de sangue ao longo das guerras pós-coloniais, quando é quase certo a existência material de um modelo de Estado federal ou regional se quisermos com exemplos apresentados por Cabinda e pelas Lundas.

Dizer que o debate sobre as eleições indirectas está no início constitui flagrante falta de respeito a Constituição da República visto que nem devia sequer ter lugar devido aos impedimentos materiais consagrados na respectiva Lei. Tem certamente importância discursiva no plano académico. Houvesse coragem de ser desenvolvido nas universidades em meio aos trabalhos encomendados a estudantes que, sempre ávidos por aprovar de classe, não curam de examinar as matérias de estudo. Não se venha pois intrujar os cidadãos, já enturvados pela fraude eleitoral operada em 2008, com argumentos de tão precária sustentabilidade jurídica.

A chamada de atenção sobre a previsibilidade política do país é certamente o ponto máximo do debate em que Abel Chivukuvuku transpirando incomensurável maturidade académica e experiência política labutou de forma rica e eloquente. Se não fosse o contraponto discursivo – que se pretendeu evitar – Raul Araújo teria dado um grande contributo em sustentar este ponto visto estar atreito a sua condição de jurista como visionário da legalidade. Previsibilidade Política é tudo quanto Angola mais carece e constituindo, a sua falta, a base de toda a insegurança e incerteza jurídica que se vive nos dias de hoje atravessando a vida dos angolanos desde as abusivas demolições, expropriações de terras e bens desaguando na suspensão dos processos eleitorais de forma arbitrária e muitas vezes anárquica enriquecidos de propostas contra-constitucionais como o modelo das eleições indirectas. Graças a imprevisibilidade política o país esta parado e o medo instalado entre os cidadãos. Se houvesse um calendário – estabelecendo a cronometria do processo de eleições legislativas, presidenciais e até autárquicas – o povo ganharia confiança nas instituições e os actores políticos, esperança na estabilidade política.

Horas antes do debate, um parceiro nas lides jurídicas me tinha colocado a questão de saber se devido aos impedimentos constitucionais para o triunfo do modelo de eleições indirectas que caminhos podiam ser trilhados para que a vontade de JES sobrepusesse a da Lei Constitucional. Respondi nos mesmos termos em que Abel Chivukuvuku veio a responder como se houvera uma comunicação telepática sobre as soluções este projecto que se pretende imposto entre os angolanos. Abel Chivukuvuku foi magistral ao desenvolver os passos para que as eleições indirectas sejam viáveis a luz da Lei Constitucional: É necessário que este projecto constitucional ao ser aprovado preveja o referendo constitucional (se necessário em matérias electivas dos órgãos de soberania senão for útil estender materialmente os referendos constitucionais), usando da possibilidade de revisão a todo o tempo da Lei Constitucional esta seria revista após consulta popular favorável as eleições indirectas. O que ultrapassaria o imbróglio a que se prestam certos juristas e políticos do regime. É um raciocínio que ocorre apenas em mentes comprometidas com a boa vontade política e a estabilidade da nação. Foi de lamentar a tendência de refutar tal solução adivinhado nos argumentos de Raul Araújo. Tenham-se porém em conta que mesmo o projecto de eleição advogado por Carlos Feijó em entrevista recente na mesma cadeia televisiva em que pretende adequado a eleição do Presidente da República como cabeça de lista sem necessidade de ratificação parlamentar não deixa de arrepiar os actuais limites materiais que impõe a elegibilidade dos órgãos soberanos. Não colhe por isso o argumento das “eleições conjuntas obrigatórias” por ser, a luz da actual Lei Constitucional, impossível pelos impedimentos materiais da constituição que impõem a separação das eleições dos órgãos executivo e legislativo. Apenas um projecto de descontrução da ordem jurídica constitucional angolana torna viável uma pretensão do género.

Também é verdade que tanta artimanha sobre modelos de eleição violando a previsibilidade política do país é fruto de alguma insegurança no núcleo duro do poder. Razão pela qual é de aplaudir a discussão e aprovação de uma constituição que preveja mecanismo de segurança que garantam imunidades para quem venha abandonar o poder – Abel Chivukuvuku tocou no mais central dos dilemas da alternância política que se prende com o perigo da sobrevivência pessoal e patrimonial de JES e seu “séquito” na fase da pós-governação.

O debate valeu pela lucidez provocada aos telespectadores em particular e ao eleitorado angolano em geral sobre o processo eleitoral e os malabarismos que se cruzam em meio aos planos supervenientes às propostas constitucionais apresentadas a apreciação da Comissão Constitucional da Assembleia Nacional. Estão de parabéns, o político Abel Chivukuvuku pela clareza na explicação das artimanhas em montagem com vista a impor-se o modelo das eleições indirectas e o jurista Raul Araújo pela coragem em fazer conhecer, por opinião própria, um projecto que contraria a consolidação da democracia em Angola que é o impedimento de candidatos individuais as eleições presidenciais. Que Abel Chivukuvuku se regozije com o colossal e multisectorizado esforço em afastar a sua eventual candidatura visto que está aqui quase implícita a certeza de obtenção de resultados eleitorais aceitáveis que apenas uma sondagem aturada e dispendiosa pode fornecer como dado palpável.