(Texto comemorativo da aprovação do novo texto constitucional e da consagração da 3ª República)
Albano Pedro*
Na sequência do apelo ao combate a corrupção e ao desempenho transparente dos actos de governo lançado pelo Presidente da República, surgem os presentes escritos que pretendem lançar uma reflexão abrangente sobre os mecanismos para uma organização e funcionamento eficiente da economia nacional e do desempenho da sociedade. Embora lançado a leitura do mais alto magistrado da nação é contudo uma tentativa de levar ao debate público o sentido de nação e de Estado que desafia o país e os angolanos nos tempos modernos. Faz sentido que os textos não sejam endereçados em envelope, mas publicados.
É preliminar reconhecer que Angola vive momentos ímpares da sua existência pós-independencia. Após longos períodos de guerra civil, seguido de uma paz definitiva imposta pelo fim da cena militar e consequente bonança gerada pelas receitas petrolíferas o país tem diante de si oportunidades históricas para elevar os seus índices de desenvolvimento económico, social e humano. Porém, o sistema político, económico e social enferma de um grande mal: a corrupção. É certo que os resultados do investimento em infra-estruturas, embora nalguns casos contestáveis, são hoje sensíveis no quotidiano dos cidadãos angolanos. A mobilidade na maior parte do território nacional outrora difícil tornou-se um sonho realizado do pós-guerra. Um esforço do Governo angolano que deve ser obviamente complementado com a melhoria de outros sectores económicos e sociais. Contudo não hajam dúvidas que factores gravemente constrangedores da economia devem ser atacados para que a verdadeira solução nasça dos escombros da corrupção.
O apelo embora necessário é gerador de factores adversos, visto que o efeito será obviamente o aumento da corrupção para a extorsão do erário público em níveis acelerados por se adivinhar o fim destas oportunidades através dos mecanismos que venham a ser aprovados e implementados. Assim, se não são combatidas as causas da corrupção, novos mecanismos serão desenvolvidos protegendo cada vez mais aqueles que a praticam. A verdadeira causa da proliferação da corrupção bem como da sua persistência na economia nacional e na sociedade é para nós a falta de perspectiva no lançamento e crescimento de uma classe empresarial nacional forte que garanta cada vez mais postos de trabalho e garanta, através de remunerações sustentáveis, melhores condições de vida para os angolanos. A economia angolana encalhou precisamente por duas causas: primeira, a falta de circulação de capitais privados e segunda, a falta de oportunidades para os empreendedores. Numa palavra: a falta de libertação dos meios financeiros e forças criativas para o lançamento da verdadeira economia de mercado potenciadora de altos rendimentos e níveis de bem-estar económico e social aceitáveis. Aqui – acreditamos – estão as raízes da corrupção, do clientelismo, da ineficácia dos programas de combate a pobreza e de melhoria das condições das populações entre outros males crónicos que enfermam a nossa sociedade. É mais do que sabido que o Estado pode participar na estabilidade económica pela regularização dos grandes agregados económicos mas não garante emprego, senão aqueles que surjam das instituições públicas que em nada participam no crescimento directo da actividade económica. São certamente as empresas, sobretudo as pequenas e micro empresas, que dinamizam a economia. E é neste ponto em que a economia angolana encontra o seu ponto de estrangulamento ao não permitir que a capacidade geradora de receitas do petróleo seja transferida para um empresariado multisectorizado. A nosso ver, se a missão do Estado angolano assenta na melhoria de vida das populações como tem sido largamente defendida, então é o momento de estimular o pequeno e micro empresariado. Esta acção deve avançar em frentes fundamentais como: regularização dos valores sociais e da missão do Estado, regularização constitucional e legal, regularização da riqueza acumulada, regularização imobiliária e fundiária, regularização fiscal e regularização do mercado financeiro.
REGULARIZAÇÃO DOS VALORES SOCIAIS E DA MISSÃO DO ESTADO
Povos sem valores culturais e éticos sólidos dificilmente superam as dificuldades em tempos de crise social e económica. Pois, só o espírito de unidade gerado pelos ideais comuns tornam o povo capaz de unir esforços e superar rapidamente os problemas comuns. Os ideais podem ter origem ancestral – ideia de nação – ou difundido por programas eficientes de educação. O código de honra dos samurais (Bushido), elevou em muito o espírito de sacrifício dos japoneses na gigantesca e desproporcional batalha travada contra os americanos durante a segunda guerra mundial na zona do Pacífico donde os mártires apelidado como Kamikazes. Os americanos baseiam o seu espírito de empreendedorismo na fé em Deus (In God We Trust) e no sonho americano (American Dream) durante anos ventilados por todas raças que compõe aquele país-continente. Dentre os lusófonos, os brasileiros são os mais próximos a um povo com valores e sentido de missão mais identificados com a prosperidade e o bem-estar colectivo que se reflecte hoje na sua visível e sensível ascenção económica.
História tem provado que só a missão de um povo inspira os valores que os identifica. O ideal de grandeza dos americanos é certamente responsável pelo seu exponencial desenvolvimento económico e a incapacidade de assumirem derrotas em quaisquer circunstância a “vitamina” que permitiu superar a grande depressão dos anos 20 e o elemento que permitiu olhar a crise financeira recente com optimismo. O surpreendente desenvolvimento de Dubai, embora fruto da iluminação de seu líder, reflecte um ideal de bem-estar social e económico almejado por um povo que há menos de 40 anos passeava o deserto em camelos ocupados em trocas comerciais de subsistência. Do ideal nasceu a força e do deserto fez-se urbe, e Dubai é hoje um exemplo da infinita capacidade humana animada pela vontade imposta pelo ideal. A própria China esmagada pelo peso demográfico infundiu no povo o espírito de sacrifício que faz o seu orgulho moderno. Os exemplos arrastam-se para o passado da Pérsia, Esparta, Egipto, Grécia, Roma até a recente ex-URSS. Mesmo Alemanha nazista deveu a sua hegemonia ao espírito de orgulho nacional assumido pelo povo na pessoa de “herr Hitler”. Assim, é igualmente verdade que o desespero de um povo surge quando o sentido de unidade cede a crise. No passado das conquistas romanas, os lusitanos (actuais portugueses) registaram um episódio digno desta nota: procurando resistir em vão a invasão do exército romano, um grupo numeroso mais ou menos organizado por Viriato – citado por um conhecido historiador romano como chefe da orda lusitana tida como bárbara – foi sitiado junto a uma falésia com um enorme precipício ao mar. Perante tal situação a estratégia do exército romano consistiu em não manter o combate instalando acampamento em volta da falésia. Incapaz de enfrentar o disciplinado e bem nutrido exército romano, os lusitanos mantiveram-se unidos junto ao precipício durante dias até que a falta de víveres começou a dar lugar a necessidade de pôr em causa a integridade física dos mais fracos. O canibalismo surgiu precisamente no momento em que o ideal comum cedeu às necessidades fisiológicas.
Apenas programas de ensino voltados para a exaltação da cultura nacional permitirá infundir o espírito de unidade do povo e precipitar o sentido de nação que harmonizará todas as forças vivas da nação. Assim, mesmo animados pelas diferenças ideológico-partidárias em tempo de crise nacional os angolanos jamais deixarão de ver Angola como um todo. A falta de espírito de nação – acreditamos – é hoje a grande responsável pela intolerância política que se vive entre os angolanos que num passado recente estiveram em trincheiras diferentes.
Os programas de ensino de base podem ser reformados – do ponto de vista da História – para contemplar conhecimentos sobre a nossa história ancestral nos mais variados sentidos, da experiência dos líderes e da gesta heróica, do sentido de empreendedorismo dos angolanos e do passado glorioso dos Estados pré-coloniais. Estudos dos povos actuais e suas culturas podem atenuar o espírito regionalista que sobrevive ainda a guerra e a sensibilização sobre a realidade jurídica e económica vigente pode elevar o sentido de participação pública dos cidadãos e determinar a sua consciência política no momento da escolha dos seus representantes na administração da coisa pública. Para que os programas de ensino cumpram os seus objectivos, o Estado angolano deve patentear o seu sentido de missão económica. É sabido que a missão política do Estado se reporta para o quimérico bem-estar e segurança social. Entretanto, a missão económica é tangível. É aquela que nasce da estratégia a adoptar para o alcance da missão política. A estratégia deve responder a pergunta “para onde vão os angolanos?” com planos exequíveis no curto, médio e longo prazo. Da missão nasce a estratégia, da estratégia a táctica ou método, táctica é condicionada pelo prazo de execução. Assim feito, o caminho para o desenvolvimento fica absolutamente claro para todos os angolanos.
É verdade que houveram tentativas interessantes para a elaboração de um plano nacional que estabeleça as directrizes comuns dos angolanos no longo prazo. Porém desfeita pela própria falta de espírito de unidade nacional. Entretanto, entendemos que o sentido de missão é único: Tornar Angola numa potência económica regional e emancipa-la no contexto dos países ricos com elevados índices de desenvolvimento humano, social e económico. Uma tarefa aparentemente difícil – contudo a dificuldade está em que os angolanos olharão com cepticismo esta possibilidade, o que significa reconhecer incapacidade e consequente comodismo a situação actual – entretanto a consciência gerada por este sentido de missão é suficiente para desenterrar a criatividade e exaltar um movimento patriótico rumo ao desenvolvimento e bem-estar comum unindo todas forças da nação incluindo aquelas que se apresentam contrárias. A crença neste ideal leva a visualizar os mecanismos e soluções para o efeito. Uma palavra de ordem (ou slogan) que una a nação para o desenvolvimento pode ser criado e esta missão pode assentar em quatro áreas a saber:
a) EDUCAÇÃO – O acesso a uma educação de qualidade determina o sucesso dos planos de desenvolvimento. A falta de argúcia e perspicácia dos cidadãos na análise e formulação de soluções socialmente úteis é atribuído a falta de educação de qualidade. É aceitável que sejam importados formadores sobretudo em áreas tecnológicas e da saúde a partir de países com reconhecido mérito nas respectivas áreas de formação. Mas, escolas técnicas de nível médio e superior e universidades públicas em todas as provinciais é um plano que deve seguir a actual expansão da universidade ao nível regional e diminuir as bolsas de estudos suportadas pelo estado no exterior do país. É mais fácil, económico e rentável sustentar um professor estrangeiro em Angola dos milhares de estudantes angolanos no exterior – sem desprimor da política de bolsas do estado. As bolsas de estudos internas devem ser exponencialmente incrementadas para criarmos génios em áreas específicas. As bolsas de estudos no exterior podem ser orientadas paulatinamente para os cursos ou níveis de formação que não existam em Angola. O ensino pré-escolar é muito mais promissor a despertar a solidez de conhecimento e disciplina do aluno do que o dos ciclo seguintes. A falta de atenção ao ensino pré-escolar é responsável pelo mau aproveitamento dos alunos mesmo até a universidade.
b) SAÚDE – o sistema de saúde é normalmente complementar ao sistema de educação. Garantir saúde a cidadãos formados com o sacrifício de parte significativa do erário público é condição de continuidade técnica e tecnológica para o desenvolvimento. O programa de saúde pública deverá ser complementado com melhorias na cesta básica das populações que numa primeira fase pode ser garantida mediante isenções aduaneiras na sua importação e controlo de preços na sua comercialização, se necessário, sem prejuízo das regras de mercados.
c) ECONOMIA – Todos os grandes agregados económicos podem ser manipulados desde que tenham como fim favorecer uma determinada opção estratégica. Se a missão é tornar Angola numa potência regional vários modelos de desenvolvimento podem ser estudados e ensaiados. Entretanto, pensar no desenvolvimento a partir da exploração dos recursos naturais (incluindo agricultura), do comércio ou da indústria é de ponderação obrigatória que deve levar em conta as estratégias de desenvolvimento dos países da região e dos pontos fortes e fracos das suas economias.
d) FORÇAS ARMADAS – Para que economia progrida escalando as suas metas no curto, médio e longo prazo sem perturbações relevantes é necessário garantir a integridade territorial. Por isso, a elevação da capacidade técnica militar é uma condicionante obrigatória dos países que avançam para o desenvolvimento. O Brasil é um exemplo interessante neste sentido. Angola é um exemplo temido de experiência militar na região contudo, a técnica militar nos tempos de paz deve ser actualizada, para além de que o serviço militar activo – através de turnos regulares de recrutamento e incorporação – deve manter a sua rotação para manter os cidadãos prontos para quaisquer eventualidades, já porque qualquer declaração de guerra decretada pelos Estados normalmente atrasa ante a guerra efectiva. Não é por acaso que os antigos diziam “si vis pacem bellum” (se quiseres paz esteja preparado para guerra) um brocardo sempre actual para os chineses ou americanos. A organização das forças armadas é urgente. Começaria por desmobilizar e reformar a maior parte do seu efectivo actual já sem prontidão combativa e introduzir – a semelhança da Polícia Nacional – novos efectivos dinâmicos e enérgicos pela juventude por um lado e capacitado pelo conhecimento académico elevado por outro. Tal reforma humana precipitaria a reforma estrutural de todas as forças armadas angolanas. O que passa não só pela rotação dos principais chefes militares na cúpula das forças armadas como pela actualização técnica e tecnológica do exército, da força aérea e da marinha. A Marinha de Guerra parece ser a menina órfã das Forças armadas angolanas pela nudez que apresenta do ponto de vista técnico e tecnológico, porém é urgente equiparmos este ramo das forças armadas. Para um país cobiçado pelos enormes recursos naturais que comporta a protecção do mar é prioridade absoluta e garantia eficaz da integridade territorial. Contudo, uma política de desenvolvimento integrado das forças armadas é urgente.
Em nosso entender a consciência de missão económica colectiva inspirado por políticas de incentivos a classe empresarial é primeiro passo para uma estratégia de desenvolvimento em larga escala.
REGULARIZAÇÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL
A aprovação da Lei Constitucional traz como garantia, a nosso ver, dois elementos chaves: a titularidade originária da terra e o modelo económico (solução económica) e modelo de governo do Estado (solução política). Tais questões chaves devem ser vistas no ângulo da harmonização das variantes económicas e políticas com vista a libertar as forças geradoras de riqueza e bem estar social que se emparelham nos problemas causados pela falta de correspondência entre os modelos políticos e económicos formais e materiais. É bem visível a existência de uma realidade formal diversa da realidade material. A regularização constitucional e legal tem como consequência o esclarecimento dos modelos políticos e económicos. Esta regularização passa pela aprovação de um conjunto de leis no domínio económico, financeiro e empresarial que tornem efectiva a harmonia dos modelos político e económico e tornem o modelo económico formal correspondente ao modelo económico material. As assimetrias existentes entre a organização económica formal e a economia real seriam extirpadas juntamente com os mecanismos que libertam os excessos burocráticos e permitem a corrupção institucional. A regularização legal significa igualmente que as leis aprovadas sejam prontamente regulamentadas como forma de as tornar eficazes na sua aplicação visto que a ineficácia das leis é o maior factor de constrangimento da economia frenando o seu desempenho.
REGULARIZAÇÃO DA RIQUEZA ACUMULADA
É sensível a existência de riqueza acumulada entre grandes personalidades do mundo político e militar angolano. Porém riqueza não declarada por razões óbvias. Entretanto, a falta de declaração destas riquezas constitui um dos grandes impasses para o relançamento da economia angolana. A falta de declaração leva a exportação dos capitais e a investimentos no estrangeiro como forma de protecção das grandes fortunas individuais, retirando a oportunidade aos angolanos de verem tais fortunas investidas no país. Esta situação torna clara a falta de interesse na afirmação de uma classe de detentores de capitais que em boa verdade impulsionariam o surgimento do empresariado nacional pelo financiamento das iniciativas privadas geradoras de riqueza. Urge pois, regularizar as fortunas acumuladas através da aprovação de mecanismos legais que sancionem, sem efeitos retroactivos, a acumulação de riqueza pela via do exercício dos poderes públicos. Tal lei traria duas consequências: primeira, a protecção das fortunas acumuladas até a sua entrada em vigor, segundo, a preocupação dos seus detentores de investirem tais fortunas no sector privado da economia como forma de garantir a manutenção das mesmas. Visto que o fim da acumulação indevida de riquezas leva a procura de novas fontes de enriquecimento que certamente se encontram nas forças alojadas na iniciativa privada. A declaração efectiva de riqueza trará igualmente a agregação de fortunas entre os grandes detentores de capitais estimulando o surgimento de grandes grupos empresariais que levariam ao aparecimento frenético de milhares de pequenas iniciativas empresariais como meios de suporte para tais interesses económicos congregados. Políticos, seriam estimulados a abandonar a carreira governamental para melhor cuidarem das riquezas acumuladas transformando-se em empresários declarados. Esta classe de ricos estimularia então o nascimento de uma classe de pequenos empresários prósperos que aparelhados pelo talento nos negócios seriam certamente incorporados nos interesses económicos daqueles beneficiando de meios financeiros e lobbies para o florescimento dos negócios.
REGULARIZAÇÃO IMOBILIÁRIA E FUNDIÁRIA
Consta que o imóvel constitui o principal meio de enriquecimento nas economias modernas – e até antes da crise financeira internacional o investimento mais estável. Através dos bens imóveis os agentes económicos têm acesso ao crédito bancário e com ele podem financiar seus projectos, desenvolver actividades económicas e acumular riquezas monetária mais tarde transformada em bens materiais acumulados configurando fortunas estáveis. O bem imobiliário é, em regra, o ponto de partida para o enriquecimento. Ironicamente em Angola o bens imobiliários carecem de títulos visto que desde a independência da República os bens imobiliários maioritariamente confiscados pelo Estado angolano não foram devolvidos ao sector privado – apesar da Lei que autoriza a venda do património imobiliário do estado aos particulares deles ocupantes. Verifica-se a existência da posse exercida pelos actuais ocupantes dos imóveis residenciais, mas não existe propriamente transferência de título de propriedade de tais imóveis aos particulares apesar de muitos já terem cumprido as exigências legais para a mesma. O resultado é a falta de meio de garantia hipotecária – constituído pelos títulos de propriedade imobiliária – para acesso ao crédito bancário. O mesmo se passa com os ocupantes de imóveis destinados a exploração agrária e pecuária. Os títulos precários como direito de uso (vulgo direito de superfície) não constituem títulos com idoneidade bastante para assegurar o crédito bancário. A iniciativa empresarial privada encontra aqui o seu obstáculo inicial.
Especial atenção deve ser prestada a regularização do parque imobiliário existente – sobretudo herdado do período colonial. Entendemos que constrangimentos sérios animam o processo de regularização imobiliária e fundiária. Um deles é sem dúvidas a falta de definição dos planos directores urbanísticos em todo o território nacional. Assim, a regularização do ordenamento do território – passando pela aprovação de planos directores – é prioridade absoluta, mesmo para facilitar a gestão na concessão de terras para os mais diversos fins sociais e económicos. Permitirá igualmente a elaboração de um plano nacional que proporcione maior facilidade no acesso a terra pelas populações menos favorecidas e permitirá uma distribuição real do parque imobiliário rústico a todos os angolanos mediante critérios que ponderem a dimensão do território e a escassez dos recursos fundiários disponíveis por região. Assim, uma visão realista da gestão dos conflitos no uso e aproveitamento dos solos nascerá desta parametrização.
REGULARIZAÇÃO FISCAL
Para aqueles que por meios próprios se lançam a actividade empresarial, o seu desenvolvimento encontra um segundo obstáculo: a carga fiscal, geralmente associada a barreiras burocráticas no processo relacional com as instituições públicas afins. A demorada reforma fiscal que a nossa ver deve privilegiar a todos os títulos o empresariado privado é necessária para o relançamento da actividade económica nacional. Ela deve trazer três soluções:
a) Isenções fiscais – para importação de certas matérias-primas para indústria (com destaque a indústria alimentar, de materiais de construção e industria metalomecânica);
b) Isenção fiscal (incluindo isenção aduaneira) para actividades económicas desenvolvidas pelos ex-militares nos primeiros dois anos de vida empresarial – o que encorajaria o direccionamento da experiência empreendedora dos milhares de militares de carreira reformados habituados ao árduas actividades e portadores de grande capacidade decisória muito importante para o desenvolvimento de empresas de sucesso – Mais: O incentivo sobretudo a oficiais superiores e generais (que devem ser licenciados a reforma com somas financeiras significativas como prémio de carreira militar para o seu restabelecimento como empresários) é uma das soluções para o incentivo da redução do actual efectivo militar já sem prontidão combativa;
c) Isenções fiscais temporárias para diminuídos físicos e portadores de deficiência, viúvas e órfãos de guerra – daqui pode nascer o estímulo para um verdadeiro plano de combate a pobreza extrema;
A política das isenções fiscais deve incluir zonas francas posicionadas em zonas geoestratégicas (sobretudo fronteiriças) do país; redução dos impostos – como o imposto industrial – com taxas que desencorajem a fuga ao fisco e a corrupção no sector empresarial. A política fiscal deve emancipar a economia informal pela tributação dos rendimentos. Neste domínio, medidas organizatórias e disciplinares sobre as actividades económicas informais devem ser adoptadas. Assim:
a) Os vendedores ambulantes (entre kínguilas e zungueiras) e artesãos (entre micro-industriais) devem ser licenciados mediante registos e credenciamento nos respectivos Municípios de residência (não da zona de actuação comercial por serem livres de circularem pelo território naciona) a partir dos quais são fiscal e administrativamente controlados;
b) As transgressões provocadas pelos vendedores ambulantes e artesãos devem ser sancionadas mediante coimas e nunca com violência. Esta força deve ser estimulada pelo Estado contribuindo para a riqueza nacional por um lado e não haverá certamente disciplina comercial destes agentes mais eficiente que é aquela que nasce dos prejuízos financeiros suportados pelas coimas. Estes agentes aprendem a cuidar melhor da aparência das cidades quando as transgressões custarem dinheiro e não humilhação que provoca revolta.
A margem da fiscalidade e afim ao plano de receitas do Estado vem a questão de que o pagamento a custo real de certas taxas e preços administrativos (luz, água, transportes públicos e combustíveis) é um factor estimulador do empreendedorismo. Mercê dos custos não reais – abaixo dos custos verdadeiros – os serviços são mal prestados e em consequência o cidadão deles não reclama com a autoridade necessária. Assim, ao mesmo tempo que são alargadas as categorias de cidadão isentos ou favorecidos em certas taxas e preços é necessário a elevação dos mesmos aos preços reais, certo de que toda a política fiscal deve proporcionar o máximo de riqueza para o Estado e estimular o espírito de sacrifício e empreendedorismo dos cidadãos.
REGULARIZAÇÃO DO MERCADO FINANCEIRO
O surgimento de um mercado financeiro que atenda a dinâmica do sector privado da economia constitui uma das principais bases para o impulso do empresariado privado. Este ponto está muito relacionado com a regularização da fortunas nacionais e com uma política de privatização de alguns sectores económicos que constituem reservas absolutas e relativas do Estado. A libertação das fortunas estimularia o aumento da circulação de capitais no mercado financeiro interno e a privatização dos sectores económicos do Estado levaria a viabilização comercial de empresas públicas. Ambos factores lançam o elemento chave do mercado financeiro: A bolsa de valores mobiliários. Está, não só provoca um rápido desenvolvimento do sector privado da economia como eleva a maioria das actuais pequenas e micro empresas (sob forma de estabelecimentos comerciais ou sociedades comerciais de responsabilidade limitada) a categoria de médias e grandes empresas (sociedades por quotas). Estas últimas, pela complexidade organizacional e altos níveis de investimentos que suportam, são as verdadeiras responsáveis pelo desenvolvimento da economia. Pois, geram grandes níveis de emprego, volumes de receitas, estimulam vários segmentos de fornecedores e consumidores – projectando miríades de iniciativas micro-empresarias – e acima de tudo fornecem maiores contribuições fiscais ao Estado por serem progressivas nos volumes de negócios. Países como Portugal, pela existência maioritária de empresas familiares, têm sido prova evidente de que nenhuma economia desenvolve sem a existência crescente de empresas em forma sociedades anónimas – participadas por milhares de anónimos detentores de capitais (entre grandes detentores e pequenos proprietários ou trabalhadores que investem as suas poupanças na bolsa de valores).
REGULARIZAÇÃO COMERCIAL
Angola pode adoptar um modelo de desenvolvimento económico baseado fundamentalmente no estímulo a exploração de actividades comerciais propiciadoras de um rápido e volumoso nível de transacções financeiras (tornar Angola numa plataforma de transacções comerciais da região a semelhança do modelo adoptado por Dubai), porém o facto de termos como vizinho a Africa do Sul somos obrigados a enveredar numa política de desenvolvimento comercial que relance a indústria multisectorizada como base das exportações e que torne dependente países como a RDC, Congo Brazzaville e o agora fragilizado Zimbabwe para que pelo paulatino domínio comercial da região, Angola se torne numa verdadeira potência económica da região controlando e condicionado o poder aquisitivo das moedas regionais. Neste âmbito o empresariado nacional pode ser encorajado e fortalecido atendendo aos seguintes ângulos:
a) Política de investimento estrangeiro condicionada – o investimento estrangeiro deve ser direccionado para áreas da economia de alto risco de investimento (certos sectores industriais e financeiros) e de alto esforço financeiro (capitais superiores a cinquenta milhões). O forte do investimento condicionado está em que o estrangeiro não é vedado a investir em todos os outros sectores de actividade económica. Pode fazê-lo desde que o investimento seja autorizado mediante apresentação de uma guia de permissão (outro nome pode ser dado) assinado por um cidadão nacional para o qual é obrigado a pagar uma espécie de taxa mensal de permanência no território nacional equivalente a uma parte percentual do rendimento mensal com exploração do negócio paralelo as suas obrigações fiscais. Aqui o nacional torna-se numa espécie de sócio do investidor estrangeiro (porém sem participação directa) controlando a empresa e ganhando capacidade financeira para novos empreendimentos;
b) Política de integração regional – a entrada na zona comercial da SADC para além de ser o estágio mais alto da integração regional de Angola na região é igualmente o calcanhar de Aquiles de toda a participação regional de Angola. A abertura comercial de Angola não só permitiria a oficialização do Rand como moeda forte da região como tornaria a economia angolana fortemente dependente da sul-africana. Para evitar tal situação, a criação de uma moeda regional deve estar em forja simultaneamente a uma política acelarada de industrialização nacional – esta industrialização deve ser associada a políticas fiscais favoráveis a agentes exportadores entre outras medidas;
c) Política de imigração estrangeira – Se é verdade que a facilidade na imigração é estimuladora do “garimpo” económico pelo aproveitamento de oportunidades reservadas aos nacionais e ao desenvolvimento de rapinagem económica própria de estrangeiros que têm pouco que cuidar da boa gestão do país hospedeiro por outro lado é sabido que o país desenvolve, de forma acelerada, com entrada de estrangeiros que até ajudam a resolver um problema económico: o baixo índice populacional que em nada ajuda na capacidade de consumo interno quando se trata de estimular a indústria nacional. A reforma na política de imigração deve privilegiar facilidade de vistos de permanência (apenas temporária) para estrangeiros investidores independentemente dos volumes de investimento dentro da estratégia do investimento estrangeiro condicionado. Da mesma forma a facilidade de vistos para estrangeiros pode ser legalmente aberta para trabalhadores de qualquer área de trabalho – contrariamente a actual legislação que privilegia apenas determinados sectores ou condiciona a entrada do trabalhador estrangeiro a inexistência de especialistas na área de actuação –. Contudo esta permissividade é reforçada com uma carga fiscal acrescida ao rendimento do trabalhador estrangeiro que compete com o nacional no mercado de emprego entre outras medidas. Porém, atente-se que a política de imigração deve facilitar o estímulo da mão-de-obra barata para que os custos de produção na economia produzam o efeito competitivo necessário para a hegemonia regional.
d) Política de exportação de capitais – se por um lado é pouco producente o estímulo a exportação de capitais de investidores estrangeiros por outro lado é pouco estimulante para o investidor estrangeiro que hajam restrições notórias para tais procedimentos. Um meio-termo é necessário: permitir a exportação capitais mas premiando com estímulos fiscais e oportunidades comerciais os capitais que permaneçam no país. A concentração de avultados capitais estrangeiros – para além do estímulo na entrada de capitais estrangeiros para o mercado nacional – é a base da rápida industrialização da economia nacional.
Da regularização comercial nasce a competitividade que é a chave do desenvolvimento do sector empresarial e da satisfação aprimorada do consumidor. Assim, Angola estará preparada para exportar produtos transformados cumprindo com os níveis de exigências do mercado internacional. Com este passo começa a corrida ao desenvolvimento que pelas enormes potencialidades em recursos naturais, e com a predisposição económica da região austral em que nos inserimos, pode ser perspectivado num horizonte temporal de 10 a 15 anos.
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