sexta-feira, 7 de maio de 2010

ENTREVISTA COM ALBANO PEDRO

(cedida gentilmente pela angolainfo para o jukulomesso.blogspot.com)

Em face das transformações políticas e económicas que vêem sendo operadas em Angola com a realização das eleições de 2008, a aprovação da Constituição da República e a consequente reestruturação do Governo, a ANGOLAINFO convidou o Jurista e Político Albano Pedro, que tem publicado inúmeros artigos e comentado na imprensa nacional e estrangeira sobre questões jurídicas e políticas, para reflectir este quadro, sem deixar de analisar o impacto político da recente conferência de imprensa apresentada pelos Ministros de Estado e traçar as grandes expectativas no horizonte futuro para os angolanos de uma maneira geral.

ANGOLAINFO: - Que balanço faz do estado da Nação?
ALBANO PEDRO: - Positivo, se vermos a normalização democrática de Angola com a realização das últimas eleições legislativas, as transformações, do ponto de vista de produção de documentos regentes da III República desde 2008 com as estradas e pontes em reconstrução a ligarem aos poucos o país por dentro. Negativo, se olharmos para o desrespeito pelos direitos humanos, intolerância política e agregação avultada de riqueza privada a custo do Estado juntamente com a persistência dos musseques de lamas e águas concentradas, demolições anárquicas de moradias pelo Governo em todo o território nacional, as escolas sem carteiras ou alunos sem escolas se quer, os funcionários públicos sem salários aceitáveis para além de atrasos crónicos no seu pagamento, exércitos numerosos de vendedores ambulantes nas ruas das cidades sem enquadramento na economia formal através de registos, licenças ou inscrição para pagamento de impostos, os jovens sem perspectiva de continuar a formação ao nível superior pelo número exíguo de universidades e sem emprego pela falta de política de incentivo do sector privado da economia nacional!

ANGOLAINFO: - Recentemente o Governo apresentou um plano executivo que se pretende exequível até 2018. Que análise faz?
ALBANO PEDRO
: - É um sinal interessante, embora estejamos habituados a exercícios ora dilatórios ora diversionistas de um Governo que nunca mostra nada de novo mesmo depois das promessas eleitorais. Planos a longo termo de um governo sem hábito de cumprir com as promessas políticas são pouco credíveis e no meio disto é de recear a racionalização do volume bilionário de investimento público a custo da acumulação de dívidas públicas que virão certamente a onerar as próximas gerações. Entretanto, julgo que começa a haver vontade política visível apenas pela forma como se procurou adequar o executivo a um modelo de governação dinâmica com Ministros de Estado no meio a procurar apresentar uma nova feição executiva ao Presidente da República para quem a nova Lei Constitucional confirmou poderes centralizadores do Estado!

ANGOLAINFO: - O Governo ora criado é adequado para os desafios que se impõem?
ALBANO PEDRO:
- Os programas executivos desde que sejam realistas em relação aos números fornecidos pela economia real são os únicos factores de eficácia dos governos. A sua composição ou estrutura pouco importa. Penso que o Presidente da República começa a revelar-se mais interessado no relançamento económico de Angola!

ANGOLAINFO: - Nunca esteve interessado?
ALBANO PEDRO:
- O país mergulhou em corrupção e clientelismo crónico e durante muito tempo não se ouviu falar de programas executivos concretos nem em conferências de imprensas voluntárias. Penso que a reforma do sistema de Governo esta a ajudar para este novo quadro!

ANGOLAINFO: - Neste quadro que papel se reserva a oposição política?
ALBANO PEDRO:
- Quase nenhum porque a oposição civil está historicamente ultrapassado. O GURN (Governo de Reconciliação Nacional) habituou os partidos políticos, incluindo o próprio MPLA a debates insultuosos a volta do exercício político, com acusações sobre autorias de guerras, sofrimentos e misérias, na sequência do qual o parlamento foi transformado até hoje num círculo com palhaçadas que desviam o povo do verdadeiro plano de reconstrução política, jurídica e democrática da nação. A nova postura do Governo, inaugurada com explicações públicas sobre os programas executivos, recomenda acção analítica de governação do Estado. É preciso que os partidos políticos passem a monitorizar a acção governativa do Estado desenvolvendo crítica sequencial e sustentada sobre os programas executivos, o que não é possível sem hábitos neste sentido!

ANGOLAINFO: - O GURN não cumpriu com o seu papel?
ALBANO PEDRO:
- O GURN foi um instrumento de relançamento da convivência pacífica do pós-guerra. Mas se tornando num palco de troca de acusações sobre a governação responsabilizada ao MPLA numa mistura inédita de partidos da oposição no Governo. Por isso, educou mal o povo para a coexistência democrática resultando no afastamento da oposição civil das preferências da maioria de eleitores. E também mal gerida pela UNITA que não soube ao abrigo do mesmo exigir o cumprimento global dos acordos de Lusaka através do mecanismo bilateral criado para o efeito ou pelas prerrogativas internacionais que assistiam a sua condição de contraparte do Governo nos acordos de paz. Não conseguiu inserir os seus antigos efectivos militares e políticos na vida social com sustentabilidade para além de ter sido incapaz de criar um ambiente envolvente para todos os partidos da oposição despoletando a condição explosiva em seu desfavor verificada com as eleições de 2008. Com o fim do GURN a oposição civil junto com milhares de expectativas geradas pelos acordos de Lusaka caíram até ao fundo do poço!

ANGOLAINFO: - É possível uma recuperação da oposição?
ALBANO PEDRO:
- Claro! Desde que haja uma visão estratégica de estabilização e relançamento político nacional em prol de uma governação eficaz. Os partidos políticos devem ver o país como um todo e agir em conjunto se identificarem as causas comuns de alternância do poder, nomeadamente a caducidade política do actual regime e a falta viciosa de cumprimento de programas executivos. Visão estratégica significa também acordos permanentes com vista ao derrube eleitoral de um regime que em nada beneficia o povo. A UNITA e a FNLA por exemplo foram cúmplices na aprovação da Lei Eleitoral que arrumou com a maioria dos partidos da oposição em 2008. Quer melhor exemplo de falta de visão estratégica?

ANGOLAINFO: - Havia muitos partidos políticos…!
ALBANO PEDRO:
- Os muitos partidos manifestam a existência do Democracia consagrada na Lei Constitucional para além de oferecer maior leque de opções ao eleitorado. Não importa o número. Sabe-se que alguns desaparecerão com o tempo. Cabe ao eleitorado fazer a selecção dos partidos políticos num ambiente de livre e sã concorrência garantindo ao povo a oportunidade amadurecer as suas opções democráticas. Nos Estados Unidos da América apesar do poder político estar entre os Democratas e os Republicanos há em volta destes centenas de partidos que procuram discutir os vários ângulos da política pública. Mais partidos, mais discussão. Mais discussão, mais soluções. É a lógica das democracias. Os que defendem a redução de partidos políticos mostram estarem presos as regras de regime totalitaristas do partido-Estado e não terem, por isso, clara consciência do que seja Democracia!

ANGOLAINFO: - Esta a falar de caducidade política? O partido no poder ainda goza de grande influência eleitoral!
ALBANO PEDRO:
- O MPLA perdeu quase toda a credibilidade política junto do eleitorado nacional e do seu próprio eleitorado. Não por acaso. É fruto de anos de incoerência no cumprimento e execução dos programas políticos no interesse do povo. O pouco de credibilidade está nas mãos de históricos como Mendes de Carvalho, Paulo Teixeira Jorge, Lopo do Nascimento, França Van-Dúnem e até Lúcio Lara entre poucos outros que se encontram visivelmente marginalizados pelo regime vigente ou em políticos vigorosos como João Melo, João Lourenço, Aníbal Rocha, Marcolino Moco, Vicente Pinto de Andrade, Virgílio de Fontes Pereira que pouca expressão têm nas decisões do partido conduzido por José Eduardo dos Santos. O descrédito só não está evidente porque a oposição tem ainda menos credibilidade junto do eleitorado, o que arrasta o povo num ambiente de incerteza em que reina o medo de piores governos. E o resultado é a preferência em manter o mau partido porque ninguém precisa conhecer o pior partido angolano em estreia pelo Governo numa espécie de concurso de “mister partido político terrível”. O MPLA tem beneficiado desta situação!

ANGOLAINFO: - A guerra não permitiu muita coisa ao MPLA. Isso não desculpa a sua inoperância junto do eleitorado?
ALBANO PEDRO:
- O problema é que o MPLA continua com as mesmas desculpas do período da guerra mesmo quando governa com maiorias folgadíssimas que eu e o cientista político Nelson Pestana Bonavena chamamos de maioria abusiva na sequência dos resultados forçados de 2008. A falta de fornecimento regular da água e da energia eléctrica em todo o território nacional ainda é presente quando no período da guerra a única causa era o inimigo. A guerra terminou a III república nasceu e sempre temos os problemas de habitação, de saúde, de educação, saneamento básico, enfim no mesmo plano de gritante necessidade do passado!

ANGOLAINFO: - Os resultados eleitorais foram forçados?
ALBANO PEDRO:
- A fraude eleitoral em 2008 foi evidente. Embora o povo tenha efectivamente votado no MPLA os resultados envolveram números que ultrapassaram na realidade o eleitorado registado. A falsificação dos resultados não era necessária porque o povo tinha mais certeza de ter um MPLA tido como ladrão mas com experiência no poder do que um bando de assaltantes ansiosos pelos benefícios do poder do Estado vindo de uma oposição feita sombra de si mesma. É por isso que durante as campanhas eleitorais de Setembro de 2008 as vozes populares lardeavam o slogan “ comeram-me os ossos agora comam-me a carne!” ou “É maluco, mas é nosso filho!” para proteger um MPLA que não proporciona qualquer benefício aos cidadãos desfavorecidos. Essa situação vai manter-se nas próximas eleições até a oposição ganhar credibilidade!

ANGOLAINFO: - Como ultrapassar este quadro?
ALBANO PEDRO
: - Com o surgimento de partidos credíveis. De políticos não comprometidos com a corrupção ou com a necessidade de transformar a cena política num conjunto de oportunidades de negócios. É preciso credibilizar a oposição com agentes políticos sérios que não mendiguem cargos públicos por razões de sobrevivência económica, promovendo um verdadeiro saneamento político que force o afastamento dos “presos pela barriga”, como tem dito o jornalista William Tonet, quer no MPLA quer na oposição, o que é possível se o eleitorado passar a votar nos programas e não em pessoas. Para isso uma nova geração de políticos é chamada a intervir; Uma geração de profissionais multisectorizados que vêem no exercício político uma missão meramente altruísta, ou seja, em prol do desenvolvimento do país e que tenha saudade de voltar para as suas ocupações privadas depois dos mandatos. Acabaremos assim com os profissionais da política deixando de inspirar sonhos as crianças de virem a tornar-se presidente da república como perspectiva de realização profissional!

ANGOLAINFO: - Fora disso?
ALBANO PEDRO:
- Fora disso continuaremos a ver na oposição uma passeata de oportunistas sedentos de oportunidades materiais e financeiras proporcionadas pelo exercício do poder político e um MPLA acarinhado por milhões de falsos militantes e simpatizantes em busca das tetas do Estado para sugar o máximo!

ANGOLAINFO: - No meio disso existem políticos sérios na oposição!
ALBANO PEDRO:
- São poucos no meio daqueles que exibem o seu oportunismo para descredibilizarem a oposição civil. E quando se expõem a própria oposição trata de combatê-los devido a falta de cumplicidade na missão “secreta” de delapidar o erário público. Abel Chivukuvuku só tem sido combatido pelo seu próprio partido porque perspectivou uma UNITA verdadeiramente comprometida com uma governação pelo povo. Filomeno Vieira Lopes não teve os sucessos de coligação desejados entre a extinta FpD e outros partidos da oposição para as eleições de 2008 pela sua visão reformista do Estado apostada para uma governação pela dimensão social e humana ao contrário daquele que o MPLA prioriza com as infra-estruturas económicas. A maioria dos partidos políticos da oposição não quer trabalhar em prol do bem-estar dos cidadãos porque tem projectos alheios aos interesses do povo angolano é por isso facilmente subornada e desviada do seu papel fiscalizador do governo!

ANGOLAINFO: - A mesma análise vale para o MPLA?
ALBANO PEDRO:
- Acho que sim. O MPLA tem figuras políticas de respeito que mostram o seu descontentamento pelo silêncio que exercem no exercício político. Isso percebe-se sobretudo na Assembleia Nacional!

ANGOLAINFO: - Há o problema da dependência financeira dos partidos políticos ao Orçamento Geral do Estado…!
ALBANO PEDRO:
- Está aqui a prova do oportunismo dos políticos. Como é que queremos partidos sérios com membros que nem sequer contribuem para as organizações em que acreditam. Porquê é que não se pagam as quotas exigidas pelos próprios estatutos? Porquê é que os políticos acreditam no que querem com o Estado e não no que fazem pelos partidos políticos? Quem acredita na honestidade dos seus actos investe sem receios e não precisa condicionar a sua acção política com orçamentos afectados pela gestão do adversário político, para depois queixar-se dos atrasos de verbas em plenas campanhas eleitorais. É tudo para ser o cúmulo da negligência!

ANGOLAINFO: - O partido no poder também depende do OGE …!
ALBANO PEDRO:
- Não deixa de haver oportunismos!

ANGOLAINFO: - Não será porque os próprios membros e simpatizantes dos partidos políticos não ajudam em nada neste sentido?
ALBANO PEDRO:
- Acho que os membros e simpatizantes perceberam que embarcaram em navios sem rumo onde os capitães não traçam coordenadas claras sobre os propósitos colectivos. É uma questão de percepção das realidades partidárias que os leva a não gastar os seus parcos recursos em projectos publicamente indefinidos. Veja que Barack Obama teve a maior parte do financiamento para a sua campanha as presidenciais do Estados Unidos da América vinda de contribuições do povo. E foram somas avultadas juntadas de tostão a tostão que serviu para enfrentar a grande capacidade financeira por detrás do seu rival mandatado pelo partido republicano. E porquê? Porque o povo americano acreditou no seu programa de governo! Em Angola quantos partidos conseguem transmitir publicamente os seus programas de governo para o eleitorado com números, prazos e metas incluídos?

ANGOLAINFO: - Voltando ao Governo. Acredita que Angola pode perspectivar o desenvolvimento em pouco tempo?
ALBANO PEDRO:
- Escrevi uma carta aberta ao Presidente da República que foi publicada pelo Club-K e pelo Folha 8 em que apresentei a minha perspectiva sobre os mecanismos jurídicos e económicos a adoptar pelo Governo para que Angola entre na corrida pelo desenvolvimento num processo a concluir entre 5 a 15 anos, se a memória não me falha. O Governo tem desejado ir neste sentido, embora deixe de lado a dimensão humana em benefício da dimensão material, o que torna inexequível este projecto!

ANGOLAINFO: - Como assim?
ALBANO PEDRO:
- O Governo anunciou uma série de medidas executivas até 2018. Espera-se que até lá as infra-estruturas económicas e os serviços inerentes estejam concluídos e funcionais. Teremos então estradas, novas casas, água e energia eléctrica em todo o território nacional incluindo a possibilidade de interligação rodoviária e energética com todos países vizinhos. Mas onde fica a formação do homem e a sua dignificação através de planos de saúde, emprego e mesmo de educação de qualidade?

ANGOLAINFO: - Temos novas universidades públicas…!
ALBANO PEDRO:
- Nem gostaria de falar da formação universitária, embora as universidades públicas criadas não tenham capacidade para absorver se quer 1/3 da população estudantil que se marginaliza do ensino todos os anos. Falo da educação como base prioritária para o desenvolvimento de Angola. Não há prioridade efectiva neste sentido, se atendermos que os números de crianças e jovens fora do sistema de ensino continua assustador!

ANGOLAINFO: - Mesmo com ensino privado?
ALBANO PEDRO:
- O ensino privado serve apenas a franja do povo com alguma capacidade económica. A maioria do povo angolano está nos limites da pobreza e não tem como pagar colégios ou universidades privadas. Por isso, apesar do número crescente de escolas privadas continuamos a registar muitas pessoas a margem do ensino!

ANGOLAINFO: - É a mesma explicação para a saúde?
ALBANO PEDRO:
- Com as necessárias adaptações é claro! Morrem centenas de milhares de pessoas todos os dias em hospitais públicos por falta de medicamentos ou tratamentos adequados, enquanto as clínicas privadas não acessíveis a maioria dos angolanos reflectem todo o conforto que estes carecem. Não se pode perspectivar desenvolvimento neste quadro. Os programas traçados num ambiente deste género são perfeitamente falíveis. Nem precisamos de especialistas em economia para dar parecer neste sentido. Construir estradas, pontes e cidades para pessoas pobres e analfabetas é como construir parques de recreação com todos os brinquedos e meios de diversão para nele colocarmos porcos. O resultado é lógico. Parece até um quadro cómico pela absoluta ineficácia que representa para o crescimento e sustentabilidade económica de Angola. Completa perda de dinheiro se quisermos!

ANGOLAINFO: - De qualquer modo verifica-se alguma atenção nos sectores da saúde e educação!
ALBANO PEDRO:
- É quase nada se olharmos as realizações do Governo numa perspectiva de proporcionalidade entre o investimento humano e material. Construíram-se quatro estádios de futebol em menos de um ano por causa do CAN, ao passo que o campus universitário de Luanda não tem prazo marcado para atender os primeiros estudantes devido a injustificada lentidão nas obras. Inauguram-se escolas sem carteiras enquanto se instalam passagens aéreas com desenhos de ponta e muitas vezes desnecessários nos pontos em que são colocados. Começam a surgir shopping center e edifícios modernos, mas não se perspectivam zonas verdes dentro das cidades para lazer e conservação do ambiente e nem a construção de museus para garantir a continuidade cultural do povo. Aliás o próprio CAN foi um exemplo disso. Investiram-se milhões de dólares na construção e outros tantos na organização do evento, mas quase nada para o apoio, prémio e reconhecimento dos jogadores nacionais que eram afinal as estrelas principais do show. O resultado foi o fraco desempenho da selecção nacional cujos resultados levaram certas pessoas a visitarem hospitais em situação de emergência, embora os atletas se tenham batido de forma exemplar e heróica. De que valeu para o orgulho dos angolanos? Tem de haver correlação entre o aspecto humano e material. É o que proporciona o chamado desenvolvimento sustentado!

ANGOLAINFO: - Para si quais devem ser as prioridades do novo executivo angolano?
ALBANO PEDRO:
- As prioridades clássicas. Não tem segredo nenhum para o novo executivo que até conta com executivos de alto nível académico e intelectual para concepção e execução de programas idóneos de governação do qual cito apenas o jurista Carlos Feijó e o economista Manuel Nunes Júnior pelas posições executivas cimeiras que ocupam. O Governo deve olhar de forma harmoniosa para a educação, para a saúde e para o relançamento económico concentrando toda a atenção ao desenvolvimento integrado do homem. Isto envolve uma governação atenta a protecção dos direitos humanos e interesses colectivos e a gestão parcimoniosa do erário público com uma visão coerente até para a segurança e defesa nacional como garantes da execução estável dos programas executivos no curto, médio e longo prazo!

ANGOLAINFO: - Comente a Tolerância Zero?
ALBANO PEDRO:
- É curioso que Joseph Kabila Kabange, Presidente da República Democrática do Congo também adoptou esse mecanismo numa altura em que a sua governação já não tem credibilidade absolutamente nenhuma entre os congoleses. Isto significa que não é uma medida séria. É mais fácil ver na tolerância zero um artifício para afastar de oportunidades financeiras os membros do Governo e do aparelho do Estado que não estejam próximos das honras palacianas. Tudo indica que no ambiente que paira sobre as acções do novo governo está sub-repticiamente perspectivada uma classe burguesa com membros bem definidos cuja missão é no futuro breve sustentar e condicionar o exercício do poder político em Angola. Esses burgueses têm de ser membros da “família” e não aventureiros ou forasteiros se quisermos. Na base da famosa Lei da Probidade Administrativa os aventureiros que forem apanhados estão lixados. Assim, os principais colaboradores da cidade alta que gerem estas oportunidades através de negócios privados que dias após dias se transformam em verdadeiros oligopólios têm garantido o seu ingresso na futura classe burguesa afunilando tudo num esquema que mantém o clientelismo e a corrupção no alto nível do Estado. A tolerância zero não vai sair do âmbito da administração pública de nível básico e intermédio para cair sobre as empresas que se criam por aí a custo de avultadas somas fornecidas pelo erário público. Em boa verdade a boa governação e transparência não implicam exercícios malabaristas como estes. Bastam a regularidade na apresentação das contas públicas e a responsabilização dos funcionários públicos desde o Presidente da República até ao empregado de limpeza em todo o sistema administrativo do Estado. Para isso as Leis são abundantes. Temos Leis contra práticas ilícitas de funcionários públicos, temos leis que criminalizam condutas nos domínios económicos, financeiros, etc., para servir estas medidas. Não precisamos de Tolerância Zero, precisamos sim de cumprir e exigir a aplicação de todas as leis vigentes em Angola sem distinção de cidadãos ou cargos políticos. A tolerância zero significa em síntese que “nós agora podemos ter e vocês já não devem ter!”.

ANGOLAINFO: - Com esta situação, o que propõe aos angolanos?
ALBANO PEDRO:
- Maior seriedade e sentido de responsabilidade política para os governantes e para os governados, já que o povo tem sempre o governo que merece. É necessário que todos saibamos o país que queremos. O que não é difícil. Em Setembro de 2008, as eleições ocorreram num clima de plena emoção com jovens a experimentar o voto pela primeira vez e adultos a verem o regresso das eleições há muito desaparecidas no horizonte político. Não houve seriedade se olharmos para o conjunto de eleitores que num dia falava mal do MPLA e noutro já estava a rever tudo subornado pelas maratonas promovidas pelo partido no poder. Nem se quer houve consciência de aposta na oposição civil em nome da estabilidade política nacional que já dava sinais positivos com o GURN. Recomendo pois, que o povo eleja com consciência de estar a eleger um governo sério e não com medo de ver emergir um bando de velhacos no poder vindo do desconhecido, porque o povo pode sempre fiscalizar os seus actos para além de que pode sempre não votar se não for possível ver um partido sério para um governo alternativo!

ANGOLAINFO: - Em Cabinda morreram atletas estrangeiros que colocaram Angola na imprensa mundial. Acções da FLEC FAC justificadas?
ALBANO PEDRO:
- Ataques armados nunca justificam nada nem mesmo interesses independentistas. Mahatma Ghandi e Nelson Mandela são exemplos mundiais de que as grandes reivindicações políticas podem ser agenciadas de forma pacífica com muito sucesso. Mas nem todas condições são iguais e acho que a intenção de quem despoletou a acção armada foi chamar a atenção ao mundo e aos próprios angolanos distantes da realidade política e militar de Cabinda que a paz no enclave não é efectiva como nos foi ensaiada com a criação do Fórum Cabindes para o Diálogo integrado por figuras seriamente contestadas pelos próprios cabindas em nome de uma suposta reconciliação entre as forças rebeldes e o Governo!

ANGOLAINFO: - Neste caso como resolver o problema de Cabinda?
ALBANO PEDRO:
- Cabinda não tem problema. O problema está nas formas pouco claras em como o Governo administra os interesses económicos em Cabinda e nas atrocidades praticadas contra os que se levantam contra estas mesmas formas pouco claras violando direitos humanos. Os cabindas querem apenas que o petróleo que tanto produzem sirva também para o seu bem-estar e desenvolvimento e que não é justo que o nível de vida seja bastante alto com milhões de barris dia produzidos. É claro que também existe a necessidade de ligar o enclave ao resto do país por terra de modo a permitir que os cabindas se envolvam com outras realidades sociais e culturais de Angola para que abandonem aos poucos a tendência para verem nos congoleses parentes mais próximos do que os restantes angolanos. Se o projecto de construção da ponte da província do Zaire à Cabinda materializar-se será um passo histórico nesse sentido. O Acesso ao resto de Angola será barato e fácil e o Tratado de Simulambuco muito reclamado pelas alas belicistas pró independentistas deixará de ter suporte do povo que verá mais vantagens em manter-se parte de Angola do que em ganhar o estatuto de Estado. Nem será preciso que o Governo pense na regionalização de Cabinda para lhe conferir estatuto especial!

ANGOLAINFO: - Desarmamento da população civil é sinónimo de paz efectiva?
ALBANO PEDRO:
- Não acredito na eficácia do desarmamento da população civil porque não é sinónimo de paz e de segurança, embora entre nós consolide o fim da guerra estabelecido com memorando de entendimento do Luena de 4 de Abril. Nos EUA existem Estados com volumes assustadores de armas na posse de particulares sem afectar a paz das comunidades, simplesmente porque os EUA são uma nação com índices avançados de desenvolvimento que se reflecte nas populações. Porque a paz é sobretudo assegurado pela melhoria das condições económicas e sociais que ajudam a reduzir os índices de criminalidade. Cidadãos marginalizados podem desenvolver acções perturbadoras da ordem pública e da integridade física das pessoas com armas brancas, instrumentos contundentes e muitos outros artefactos causando enormes prejuízos e perdas de vidas humanas sem recurso a arma de fogo. Prefiro que as populações sejam desarmadas da fome e das necessidades básicas que os enterram na pobreza muitas vezes extrema!

ANGOLAINFO: - A nova Constituição da República. Quer comentar?
ALBANO PEDRO:
- Constituição é a dimensão política dos valores fundamentais de um povo da qual são decantados aqueles que constarão de um pacto que é a Lei Constitucional enquanto dimensão jurídica. Prefiro o conceito de Lei Constitucional porque nem sempre os deputados positivam aquilo que é fundamental, colectivo e ancestral na convivência dos povos. Aliás foi durante as duas primeiras repúblicas utilizado o conceito de Lei Constitucional e só na III República é que passou a ser Constituição por razões de mera academia, quero crer. Ora a nova Lei Constitucional pode ser vista sob dois planos. Do plano formal a nova Lei Constitucional é feliz pelo volume normativo que comporta superando todas as outras até antes desta vigentes, mas contém imprecisões semânticas, tal é o exemplo do conceito de “auto-demissão” como pedido entre tantos outros, e é muito concretizadora em muitos episódios normativos retirando o sentido abstracto das normas de natureza constitucional. Nalguns casos é ingenuamente imperativa como por exemplo quando diz que “a maioridade é adquirida aos 18 anos” sem ressalvar outras formas de emancipação estabelecidas no Código Civil. Do plano material os méritos todos morrem pela inconstitucionalidade parcial da nova Lei Constitucional que foi aprovada com a violação das cláusulas pétreas constantes na Lei Constitucional de 1992. Devia ser solicitada a fiscalização sucessiva da nova Lei Constitucional ao Tribunal Constitucional!

ANGOLAINFO: - A nova Lei Constitucional acaba com a possibilidade de candidatos independentes as eleições presidenciais. Como encara essa situação?
ALBANO PEDRO:
- Do ponto de vista jurídico um verdadeiro desastre porque coloca em regressão a ideia de Estado Democrático e de Direito, embora acho promissor o novo regime de eleição do Presidente da República no que toca a alternância efectiva do poder político no médio e longo prazo. Mas, do ponto de vista político é uma oportunidade para os ex-candidatos as eleições presidenciais darem a volta acima aderindo a forças políticas mortas para as revitalizarem. Mas eu ainda penso que toda a oposição civil devia juntar-se em torno de um único canditado para as próximas eleições conjuntas!

ANGOLAINFO: - Quer avançar um nome para candidato da oposição?
ALBANO PEDRO:
- Há figuras bem conhecidas que transpiram coerência e dignidade no mosaico político angolano!

ANGOLAINFO: - A propósito, quais são as figuras políticas que mais lhe despertam simpatia ou admiração?
ALBANO PEDRO:
- Figuras simpáticas são muitas. Em Angola existem pessoas que interpretam cenas de comédia até em situações de alta responsabilidade política e que nos ajudam a esquecer as nossas amarguras com as gargalhadas que nos proporcionam. Sobretudo aqueles que defendem os partidos políticos ou dirigentes destes de forma tão fanática como se de suas próprias almas se tratassem. Mas a admiração eu reservo apenas para aqueles que começam a ver a necessidade de olhar para a nação como um todo independentemente da filiação partidária ou credo religioso. São os que exercitam a tolerância política e acreditam que os seus partidos políticos também falham e os seus representantes cometem erros passíveis de crítica honesta e séria. Não vou citar nomes para não correr o risco de excluir qualquer deles, mas estes estão no MPLA, nos partidos da oposição civil e na sociedade civil só não têm espaços cimeiros na governação do país porque os oportunistas são muito mais velozes. Estou certo que é com a influência ética e moral de tais homens que é possível o relançamento do Estado Democrático e de Direito nos próximos anos!

ANGOLAINFO: - O futuro de Angola?
ALBANO PEDRO:
- Apesar de tudo, muito promissor, se trabalharmos juntos sem intolerâncias políticas ou ganâncias no exercício do poder político que impeçam o desenvolvimento da iniciativa privada. Porque cabe a todos os angolanos transformar todo esse manancial de recursos naturais fartamente dados por Deus, em riqueza que sirva ao bem-estar social e económico de todos. Temos tudo o que precisamos, apenas falta a capacidade humana cuja superação depende somente de nós. Não há maior dádiva que um povo tenha recebido em todo o mundo!

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