Albano Pedro
A maioria dos líderes políticos da e na oposição está longe de imaginar que o modelo de organização administrativa adoptado pelo MPLA, nos termos do qual as estruturas orgânicas do partido repartem-se pelo território nacional na dimensão da extensão da divisão administrativa do Estado, atravessando províncias, municípios, comunas, sectores, aldeias, povoações e “Kimbos”, obedece a lógica das formações partidárias de cunho comunista que, sendo verdadeiros monopólios políticos, têm a gigantesca função de administrar o Estado por tempo indefinido, tutelando o povo a tempo inteiro e em todos os locais de existência social possíveis (residências, salas de espectáculos e lazer, acampamentos, lavras, campos militares, escolas, agremiações culturais, artísticas e desportivas; empresas, repartições públicas, etc.) através de pulverizantes, recorrentes e asfixiantes mensagens propagandísticas que afectam todos os sentidos e proliferam nas artes, letras e mesmo ciências com o fim de “viciar” o raciocínio dos seus destinatários; configurando um verdadeiro universo cultural fictício sob o peso da ideologia forjada pela “classe dominante” dentro de um padrão paternalista de Estado que alcança o último cidadão dando-lhe inclusive o que comer e o que beber em quantidade e qualidade “politicamente” determinada. É pois a lógica de partido-Estado de que a UNITA igualmente se revestiu ao longo dos anos em que apostou na oposição armada. O que justifica o facto de ambas as formações políticas terem na forma de organização do Estado o seu modelo.
É um modelo organizativo que, por mais próximo da base social, permite maior controlo sobre a massa militante, divisando neles aqueles cuja evolução psicossocial, tendencialmente orientada ao questionamento da existência social, ameaça a estabilidade da ideologia no seio da maioria procurando prevenir a subversão com medidas compulsivas como ameaças e todas as formas de intimidação e torturas. Sendo um modelo em que o Partido dispõe da vida do cidadão.
A imitação deste modelo de organização partidária, por parte de outras formações políticas, pode resultar de uma “vontade inocente”, visto que estão longe de relacionar esta forma de organização com os modelos ditatoriais de que o ambiente democrático procura, pela sua natureza, despir-se. Porém, configura a ideia de que os partidos assim organizados apelam por um perfil ditatorial de controlo do Estado pretendendo assenhorar-se do pensamento do último cidadão.
O que vale reflectir é que, para além de ultrapassado pelos ventos da democracia, este modelo tem o defeito de trazer consigo consequências interessantes. O primeiro grupo de consequências compreende a excessiva “massa” humana no quadro orgânico devido a gigantesca complexidade que os partidos atingem ao abarcar o território e o desvio de grande parte dos recursos materiais e financeiros em actividades não relacionadas com a vocação partidária. O segundo grupo de consequências, derivadas do primeiro, comporta a falta de qualidade técnica dos recursos humanos devido a incapacidade natural de que se vestem os partidos políticos, que assim se estendem pelo território, de conferirem remunerações aceitáveis, para além de outras. Resultando deste quadro, o clima de “impotência” financeira da maioria das organizações partidárias e da escassez de quadros técnicos capazes de “exaltar” a vocação política destas mesmas formações partidárias.
Nos dias de hoje, em que os partidos políticos vivem as expensas do povo através do Orçamento Geral do Estado, o debate sobre a possibilidade de supressão de tão gigantescas estruturas partidárias ou para o “redimensionamento” dos partidos políticos angolanos tem absoluta prioridade. Já porque os perto de 200 partidos “roem” significativa fatia das finanças públicas que bem serviria para importantes e proveitosos empreendimentos públicos, já porque estes mesmos recursos financeiros nem sequer chegam para que os partidos políticos cumpram com os seus objectivos. Assim, os recursos disponibilizados em somas significativas, se perdem sem proveito para os cidadãos.
O que a democracia recomenda, e o mundo tem exemplos que proliferam aos milhares, é que os partidos se desfaçam da pretensão de “acumular” cada vez mais militantes, insuflando neles o espírito de “confiança cega” pela ideologia partidária, desprezo pelos interesses não identificados com as organizações em que militam e ódio contra os membros de outras organizações partidárias. Resultando disto, que nenhum partido sóbrio deve pretender controlar a massa de militantes senão com o interesse único de consciencializá-la para o exercício eleitoral. E nesta realidade, o principal papel dos partidos políticos é o de alcançar o poder político preparando os seus militantes para a administração do Estado, libertando-os para o senso de simpatia pelos programas e agendas políticas afastando deles o sentimento fanático pelos chefes como se de uma irmandade se tratasse.
Esta atitude passa naturalmente pela forma de organização dos partidos políticos cuja extensão territorial se bastaria, quando muito, ao nível das províncias. Não já como representações orgânicas locais burocratizadas (Secretariados Provinciais ou Divisões Regionais), mas como núcleos de interesses políticos organizados em níveis de hierarquia horizontal, sendo modelo disto os clubes e casas de sócios.
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