Albano Pedro
(Texto reservado à publicação ao Semanário Angolense)
A edição passada deste semanário surpreendeu o público ao trazer a matéria relativa ao processo de investigação criminal a que está a ser sujeito, Quim Ribeiro, comandante da Polícia Nacional de Luanda suspenso das suas actividades por este facto, dando conta que o mesmo está a ser conduzido por agentes afectos ao SINFO. O que coloca a questão de saber se este organismo pode, à luz da Lei, proceder a diligências investigativas normalmente desenvolvidas pelos serviços de investigação criminal ligados a Direcção Nacional de Investigação Criminal (DNIC). Ou seja, pode o SINFO substituir-se a DNIC?
É uma questão que não se responde directamente sem convocar uma outra questão do tipo: qual deve ser o órgão, em países de regularidade legal, a conduzir tais diligências? Desde logo, é mister considerar que a instrução de um processo criminal, normalmente iniciada com uma denúncia ou auto de notícia do cometimento de uma infracção criminal, se reporta a investigação e recolha de provas (formação do corpo de delito) com vista a fundamentação da acusação do Ministério Público em juízo, i.e., tem fins judiciais, levando a que o indivíduo objecto da referida investigação (arguido ou réu conforme a fase processual) seja condenado ou absolvido em competente processo judicial e no respectivo julgamento mediante a convicção carreada pelos elementos de prova assim reunidos.
Em países como Portugal (o exemplo vem menos por mérito do que pela aproximação de culturas jurídicas) a investigação e recolha de provas com fins judiciais é feita pela Polícia Judiciária (PJ) sob direcção do Ministério Público embora a Polícia tenha também órgãos de investigação e recolha de provas, porém, com finalidade diferente (eventualmente a de fundamentar as próprias diligências policiais em relação as matérias ligadas a crimes e outros actos relacionados de que tenha responsabilidade em provar ou investigar).
Nada repugna que Angola siga o mesmo caminho, como aliás muito se tem discutido a esse propósito, i.e., nada impede que paralelamente exista uma DNIC integrada no Ministério do Interior e uma Polícia Judiciária integrada no Ministério Público (PGR) contando que as suas funções e finalidade (competências e/ou atribuições) sejam distintas e para este último órgão se reconheça o papel de conduzir a investigação criminal com fins judiciais. Todavia, em Angola, a função de investigação e recolha de provas é desenvolvida visivelmente pela DNIC (ou DPIC conforme o caso), embora a Lei impõe que a condução da instrução processual (sobretudo em fase de instrução preparatória) seja feita pelo Ministério Público representada pela Procuradoria Geral da República (PGR) que exerce, «ultima ratio» a acção judicial geralmente materializada com a acusação (art.º 12.º - Dec. Lei 35.007 – 13 de Outubro de 1945).
Nada impede que outros órgãos integrem ou participem da instrução preparatória do processo criminal contando que a direcção desta seja assumida pelo Ministério Público (art.º 14.º - Dec. Lei 35.007). O que, desde logo retira a hegemonia do Ministério do Interior, mesmo através da DNIC, de conduzir de modo autónomo a fase da instrução preparatória do processo criminal, ainda que com argumentos de, posteriormente, vir a “depositar” o processo correspondente nas “mãos” da PGR.
A interferência de órgãos não vocacionais e outras anomalias do género ou não que se registam durante a fase da instrução preparatória do processo criminal, são tributários da falta de clareza e definição do sistema de instrução processual angolano que é fortemente dominado pelo Ministério do Interior (DNIC) por razões pacificamente justificadas num passado recente em que as matérias de segurança do Estado estavam no centro das atenções em razão do clima de instabilidade provocada pela guerra civil e pela debilidade do sistema político vigente. Modernamente há uma ponderação obrigatória: a irreversível caminhada para a regularização das instituições legais e democráticas angolanas recomenda uma postura organizante nova e sobretudo orientada para a reposição da normalidade funcional das instituições. O que a acontecer em relação ao sistema judicial e serviços afins ofereceria mais garantias de materialização da justiça em benefício dos cidadãos e outros entes sociais.
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