ENTRE A ÉTICA E O DIREITO – A PROTECÇÃO E O CONFLITO DE INTERESSES INERENTES
Albano Pedro
O percurso histórico da humanidade revela um processo tendencialmente orientado para a melhoria das garantias de preservação e conservação da vida. Assim, podemos notar desde as civilizações primárias que a vida vem sendo cada vez mais protegida dispensando todas as formas de atentados contra ela, quer pelos próprios homens quer pelos mecanismos sociais criados para a segurança dos homens. Assim é que na fase primitiva da formação da sociedade humana a dignidade humana era um valor quase imperceptível e os homens tinham uma convivência social próxima a realidade animalesca onde a auto-conservação sobrepunha-se a conservação colectiva. A vida estava tanto a disposição do seu utente como dos restantes membros da sociedade. O suicídio e o homicídio coexistiam pacificamente entre os instrumentos de contenção dos interesses sociais. Nas fases mais avançadas que chegam a antiguidade clássica (Egipto, Grécia, Roma, etc.) o questionamento sobre a dignidade humana é crescente e a diferenciação de estatutos de membros da sociedade torna-se um factor de garantia de protecção da vida conferindo maior dignidade aos homens de acordo com o seu estatuto social. Assim, temos os escravos cuja vida estava a disposição do seu proprietário a semelhança do gado. O plebeu e o patrício cujas vidas mereciam maior protecção embora sujeitas por vezes a trocas em caso de dívidas e para os estrangeiros que gozavam de um reconhecimento pelo menos melhor que o dos escravos, embora sem os privilégios daqueles que tinham estatuto de cidadania (não tanto no sentido moderno do conceito). A escravatura persistiu em todo período medieval como reflexo da coisificação do homem e expressão da mais violenta forma de degradação da dignidade e da vida humana a par das execuções por queima ou enforcamento. Nesta altura a hegemonia da Igreja Católica Romana na sociedade coexistindo com a monarquia absoluta determinam formas violentas de controlo social pontuada pela Santa Inquisição. Com o derrube da monarquia e a afirmação do movimento constitucional os direitos humanos nasceram de forma específica e passaram a fazer parte do catálogo das garantias contra toda a forma de degradação da dignidade humana. Mas, é com o fim da II Guerra Mundial que esta realidade se torna evidente entre os povos das diferentes nações. O perigo de extinção em massa da humanidade desencadeada pelo emprego das tecnologias bélicas da época levou os líderes mundiais a um novo estágio de reflexão sobre os interesses da humanidade dando lugar a soluções contratuais entre os Estados que levariam as sociedades a assumirem uma postura mais pacífica na coexistência humana. Isso passou pela afirmação de um catálogo de direitos do homem com consagração universal (carta das nações unidas, carta africana do direito do homem e dos povos, etc.). A dignidade humana passou a ter maior destaque e as sociedades de uma maneira geral deram por finda as formas mais hediondas de atentados contra a vida humana. Portugal é o primeiro país a abandonar a solução da pena de morte seguido de muitos outros países. Sendo que nos dias de hoje poucos Estado mantém esta prática.
A era do respeito pelos direito humanos inaugurada no século passado, deixou atrás o puro criminalismo como filosofia de controlo da sociedade pela igreja através das execuções sumárias que ocorriam por diversas razões. Inverteu-se o quadro. Da disposição que a Igreja tinha da vida passou-se a criminalização de quem atenta contra a mesma. Seja o próprio (proibição do suicídio) seja de outrem (proibição do Homicídio). Já acontecia de certo modo na altura ao ponto do suicida ser enterrado agrilhoado como uma forma de sanção. Porém, o movimento dos direitos humanos do século XXI conferiu-lhes maior protecção através do reforço das garantias que lhes assistem. De tal modo que mesmo quando a vida é atentada involuntariamente responsabiliza o seu autor (mortes resultantes de acidentes de viação configuram em geral crimes de homicídio involuntário). Mas a maior das conquistas da era dos direitos humanos é o movimento abolicionista iniciado por Portugal com o afastamento da pena de morte. O linchamento e o enforcamento muito antes em voga passaram a ser eliminados das pautas penais das sociedades, embora sobrevivendo ainda em alguns Estados que apelam pela pena de morte como penalização máxima.
Ao mesmo tempo que a morte como penalidade tende a desaparecer, nasce o movimento que pretende levar a vida a disposição do seu utente com a consagração da Eutanásia ou suicídio assistido. Através desta figura se pretende que o doente terminal ponha fim a sua própria vida solicitando os préstimos do médico que o assiste ou não. A resistência à sua consagração está no facto de ter-se como presumível a indeclinação do direito a vida pelo seu utente (a iure suo nemo recedere praesumitur). O auxílio ao suicídio (como forma de suicídio assistido) por enquanto é crime no nosso sistema jurídico-penal, contudo o mundo vai registando cada vez mais o surgimento dessa figura penal ao ponto de ser necessário um debate franco e honesto, incluindo os diversos sectores sociais, a semelhança daquele que envolve o Aborto e que Portugal teve a oportunidade de relançar entre os povos da lusofonia há menos de uma década para actualizar o seu sistema jurídico-penal.
É ponto assente que a vida humana é o bem mais importante das sociedades modernas. Não existe outro bem que esteja acima e que com ele conflitua em termo de prioridades. E é por essa hegemonia que assiste o Direito a Vida que se coloca o problema da colisão de direitos quando em causa está esse sublime direito. Instala-se a colisão de direitos quando um bem jurídico conflitua em termos de prioridade com um outro ao ponto de impor o desaparecimento do menos importante dos bens. Se tratando de bens patrimoniais (normalmente avaliados financeiramente como casas, viaturas e outros meios materiais) o problema da colisão de direitos resolve-se pela preservação do bem de maior valor patrimonial (art.º 335º - Código Civil - CC). A colisão de direitos é relativo às partes que pretendem ver conservados os seus respectivos direitos. Porém, nem sempre o problema de conflitos de direitos se coloca às partes directamente envolvidas. As vezes há apenas uma mera necessidade de escolha entre um direito e um outro (aqui até podemos falar em interesses jurídicos). Neste caso o Direito considera oportunamente Estado de Necessidade (art.º 339.º - CC). Mesmo assim, é fácil admitir que diante da forte possibilidade de embater contra uma moradia o motorista em alta velocidade desvie o veiculo contra a árvore ao lado porque há certeza de que o dano a provocar é menor e por isso desculpável. E quando o conflito de interesses envolver a vida humana e um bem patrimonial, a escolha pela primeira é mais fácil ainda. Mesmo quando esteja em causa bens patrimoniais de valores financeiros avultados. Por exemplo: diante de um edifício de tantos andares armadilhado por uma bomba potente e cronometrada. A escolha entre procurar salvar o edifício, descodificando a bomba para a desactivar, e a evacuação urgente das pessoas que nele se encontram. A decisão deve ir a favor da evacuação, mesmo quando a evacuação envolva apenas uma única pessoa. Assim, diante da escassez do tempo disponível a opção lícita é a que leva ao salvamento de vidas sacrificando o edifício por mais caro e complexo que ele seja.
O ponto crítico do Estado de Necessidade surge quando ambos os interesses são vidas. Aqui é polémico ver prioridade entre ambas. Na eminência de um atropelamento o condutor do veículo, sem solução diversa, não pode justificar-se desviando de um adolescente para colher mortalmente um ancião já farto de dias com argumento de que a vida nova era mais útil a sociedade e por isso se decidiu contra alguém menos importante. Até agora, as legislações não têm resolvido com satisfação esse diferendo axiológico. Ambas as vidas devem prevalecer. É essa crise que tem motivado acesos debates sobre a viabilidade do aborto por impor a decisão, nalguns casos, da preservação de vidas (entre a vida da gestante e a vida do feto). Sobretudo porque a vida do feto goza de protecção jurídica e assenta no reconhecimento parcial da sua personalidade (já é destinatário de certos direitos como sucessórios e outros). A maioria das legislações não dá solução directa a esse problema. E a nossa legislação não podia estar em caminho diferente porque prefere adoptar a solução da figura do Estado de Necessidade para resolver o problema. O que não deixa de ser uma solução in gremio legis. Logo, a favor da gestante em estado de saúde crítica se decide pela supressão da vida do feto. Desde que o seu nascimento implica a perda da vida da mãe. Esta solução, que constitui uma verdadeira tragédia das soluções sociais do problema responde a uma exigência aritmética da própria natureza e como tal incontornável. Não fosse a flexibilidade normativa, trazida por essa excepção, o problema seria insolúvel a luz da axiologia jurídica da vida. E por isso mesmo, não é uma solução extensiva a todas as crises que envolvam a vida. Uma vez que a protecção do bem vida é de tal ordem absoluta que poucas são as soluções contrárias a sua conservação encontradas nos diferentes sistemas jurídicos do mundo moderno para além daquela que pretende resolver a crise entre a vida da gestante e a do feto.Dixit.
No mercado das relações humanas e sociais, a expressão da palavra e a exposição do pensamento são as mercadorias mais preciosas!
sábado, 31 de dezembro de 2011
GOVERNAÇÃO E A SATISFAÇÃO DAS NECESSIDADES DAS POPULAÇÕES
ALBANO PEDRO
Um dos problemas sociais, económicos e políticos que levanta a realização das necessidades das populações pelos órgãos e serviços do Estado é a correspondência entre a afectação dos meios e a satisfação efectiva das populações. Embora um outro problema lateral se lhe acompanha: a falta de estudos prévios das condições concretas de satisfação das necessidades pelos serviços e órgãos do Estado. Tal como a não realização de serviços necessários para as populações pelo Estado a realização não correspondente as necessidades das populações produz o mesmo resultado: a falta de satisfação efectiva das populações alvos.
Atentemos a factos de grande valência na nossa realidade social: populações removidas de certas zonas por demolição das respectivas casas que são transferidas provisoriamente para as tendas e as graves consequências higieosanitárias, psicossosológicas e outras que desestruturam moral os individuos e as famílias com os problemas de degradação das condições mínimas de bem-estar, das dificuldades económicas que precipitam comportamentos desatrosos como a criminalidade, a prostituição, a infidelidade no lar, a desobediência dos filhos socialmente exigentes para os pais economicamente impotentes; a construção de infraestruturas sociais ou económicas que não interessam as populações visadas (o exemplo visivel é a instalaão de certos supermercados com participação financeira do Estado em certos locais de Angola cujas populações não têm hábitos de fazer compras – impera a permuta devido ao fraco uso do papel moeda entre outros milhares de exemplos semelhantes que denunciam a inoportuna interevenção do Estado na satisfação das necessidades das populações.
Aqui nasce a necessidade de diálogo entre a administração pública e as populações beneficiárias de modo que situações como aquelas que surgirão em Luanda com a instalação de passagens aéreas em zonas de travessia impróprias levou a que os equipamentos instalados de nada servissem em beneficio dos peões que não deixam de atravessar as estradas em locais de alto risco de vida e de grande embaraço para o trânsito automóvel.
É claro que os angolanos vivem uma era político-constitucional que dispensa a intervenção “totalitária” do Estado na satisfação das necessidades das poopulações. Não faz qualquer sentido que num pais aberto a iniciativa privada e a livre concorrência os governantes estejam engajados em atribuir viaturas e moradias as popuulações ligadas ao funcionalismo públicos, muitos dos quais com cargos de hierárquia média e superior. Tal como perde qualquer sentido lógico a atribuição de créditos financeiros a certos operadores económicos com fundos públicos quando a banca comercial para nada serve a economia privada. São pontos de estrangulamentos nas relações socioeconomica entre o Estado e as populações que urge corrigir com uma verdadeira consciencia de governaçãoo numa realidade que deve privilegiar a economia privada.
Mas não é este o ponto de análise que interessa ao tema em desenvolvimento já que o que está em causa é a efectiva satisfação das populações no momento da materialização dos esforços do Estado nesse sentido. Na verdade a problemática da saatisfação do interesse público prende-se com a proporcionalidade, i.é, com o ponto de equilibrio necessário entre o interesse satisfeito e a necessidade manifestada ou patente. Dixit.
Um dos problemas sociais, económicos e políticos que levanta a realização das necessidades das populações pelos órgãos e serviços do Estado é a correspondência entre a afectação dos meios e a satisfação efectiva das populações. Embora um outro problema lateral se lhe acompanha: a falta de estudos prévios das condições concretas de satisfação das necessidades pelos serviços e órgãos do Estado. Tal como a não realização de serviços necessários para as populações pelo Estado a realização não correspondente as necessidades das populações produz o mesmo resultado: a falta de satisfação efectiva das populações alvos.
Atentemos a factos de grande valência na nossa realidade social: populações removidas de certas zonas por demolição das respectivas casas que são transferidas provisoriamente para as tendas e as graves consequências higieosanitárias, psicossosológicas e outras que desestruturam moral os individuos e as famílias com os problemas de degradação das condições mínimas de bem-estar, das dificuldades económicas que precipitam comportamentos desatrosos como a criminalidade, a prostituição, a infidelidade no lar, a desobediência dos filhos socialmente exigentes para os pais economicamente impotentes; a construção de infraestruturas sociais ou económicas que não interessam as populações visadas (o exemplo visivel é a instalaão de certos supermercados com participação financeira do Estado em certos locais de Angola cujas populações não têm hábitos de fazer compras – impera a permuta devido ao fraco uso do papel moeda entre outros milhares de exemplos semelhantes que denunciam a inoportuna interevenção do Estado na satisfação das necessidades das populações.
Aqui nasce a necessidade de diálogo entre a administração pública e as populações beneficiárias de modo que situações como aquelas que surgirão em Luanda com a instalação de passagens aéreas em zonas de travessia impróprias levou a que os equipamentos instalados de nada servissem em beneficio dos peões que não deixam de atravessar as estradas em locais de alto risco de vida e de grande embaraço para o trânsito automóvel.
É claro que os angolanos vivem uma era político-constitucional que dispensa a intervenção “totalitária” do Estado na satisfação das necessidades das poopulações. Não faz qualquer sentido que num pais aberto a iniciativa privada e a livre concorrência os governantes estejam engajados em atribuir viaturas e moradias as popuulações ligadas ao funcionalismo públicos, muitos dos quais com cargos de hierárquia média e superior. Tal como perde qualquer sentido lógico a atribuição de créditos financeiros a certos operadores económicos com fundos públicos quando a banca comercial para nada serve a economia privada. São pontos de estrangulamentos nas relações socioeconomica entre o Estado e as populações que urge corrigir com uma verdadeira consciencia de governaçãoo numa realidade que deve privilegiar a economia privada.
Mas não é este o ponto de análise que interessa ao tema em desenvolvimento já que o que está em causa é a efectiva satisfação das populações no momento da materialização dos esforços do Estado nesse sentido. Na verdade a problemática da saatisfação do interesse público prende-se com a proporcionalidade, i.é, com o ponto de equilibrio necessário entre o interesse satisfeito e a necessidade manifestada ou patente. Dixit.
O EMPRESARIADO NACIONAL
NACIONALIZAÇÃO, REDIMENSIONAMENTO, PRIVATIZAÇÃO E REPRIVATIZAÇÃO CONTRA A LIVRE INICIATIVA ECONÓMICA E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTADO
Albano Pedro
Enquanto colónia (província) portuguesa, Angola chegou a estar, nos meados e finais dos anos 60 do século passado, entre as 6 maiores economias do mundo. Tinha então um vasto e sólido parque industrial chegando a exportar, ao lado de matéria-prima, produtos acabados sobretudo para Portugal, exibindo deste modo uma balança comercial satisfatória pontuada pela exportação de produtos diversificados. Os três sectores da economia estavam em perfeita sintonia havendo uma exploração diversificada de recursos minerais, florestais, marinhos e agro-pecuários com as correspondentes indústrias suportadas por uma rede de serviços multissectorizados. A produção de energia eléctrica e o fornecimento da água correspondiam as exigências médias da época tornando estável a economia. Nesta mesma década, o então Zaíre (hoje RDC – o exemplo vem pela vizinhança e aproximações histórico-económicas) era o segundo país mais industrializado de África seguindo a África do Sul com o seu monstruoso parque industrial multisectorizado. Em Angola, os lares das populações negras trabalhadoras e assalariadas tinham as três refeições e era frequente falar-se em vida regalada (onde o bom vinho a mesa das refeições era comum) mesmo para os que tinham rendimentos básicos. Os bens de consumo (mesmo os duradouros como viaturas, electrodomésticos, etc.) podiam ser adquiridos a créditos facilitados por um sector bancário robusto e funcional. Uma classe privada numerosa detentora de médios e grandes capitais (maioritariamente obtidos de explorações agropecuárias) começou a edificar imóveis que tornaram Luanda e algumas cidades de Angola nas mais modernas urbes do mundo na época.
Actualmente, Angola está entre as economias do planeta que mais rapidamente crescem, depois de recuperar da desgastante guerra civil e de pretender ultrapassar a inoportuna opção económica centralizada do pós-indepêndencia que ainda persiste na realidade económica actual. Apesar disso, está longe de estar entre as melhores economias de África. Porque ganha apenas países em estado de miséria económica e social patente. Os dados (fonte: CIA World Fact Book) indicam esse facto pelos elementos comparativos que passamos a descriminar: A Economia de Angola vem crescendo com uma taxa de 11.1% entre 2001 e 2010. O PIB (Produto Interno Bruto) em 2010 foi de 114.1 mil milhões de dólares e a dívida externa situada na ordem dos 17.98 mil milhões de dólares (até Dezembro de 2010). Exportações em 2010 situaram-se na ordem dos 51.65 mil milhões de dólares enquanto as importações no mesmo ano situaram-se na ordem dos 18.1 mil milhões de dólares. O Banco Mundial colocou Angola em 163 º na lista dos países com maior facilidade e segurança em investimentos (Ease of Doing Business Index). A RDC (República Democrática do Congo) é a 119ª Economia do Mundo com o PIB em 2009 de 21.64 mil milhões de dólares e a dívida externa situada em 10 mil milhões de dólares até 2009 contra a dívida interna (pública) não especificada. Neste mesmo ano as exportações situaram-se na ordem dos 6.1 mil milhões de dólares contra 5. 2 mil milhões de dólares de importação. Uma balança externa ligeiramente positiva neste ano. Infelizmente as exportações são baseadas em matéria-prima tal como Angola e o Banco Mundial situou a RDC em 182 º na lista dos países com maior facilidade e segurança em investimentos (Ease of Doing Business Index). A ÁFRICA DO SUL é qualificada em termos de rendimentos como uma Economia média-alta (em África está ao lado do Botswana, Gabão e Ilhas Maurícias) com o PIB em 2010 de 357.4 mil milhões de dólares e a dívida externa situada em 73.84 mil milhões de dólares até 2009 contra a dívida interna (pública) de 35.7% do PIB. Neste mesmo ano as exportações situaram-se na ordem dos 67.93 mil milhões de dólares contra 70. 24 mil milhões de dólares de importação. Uma balança de pagamentos negativa notória neste ano. Exportações baseadas em matéria-prima e produtos acabados (incluindo maquinarias e equipamentos). A NIGÉRIA é tida como 31ª Economia do Mundo em termos de PIB que em 2010 foi fixado em 377.6 mil milhões de dólares e a dívida externa situada em 9.689 mil milhões de dólares até 2009 contra a dívida interna (pública) de 17.8% do PIB. No mesmo ano as exportações fixaram-se em 45.43 mil milhões de dólares contra 42.1 Mil milhões de dólares de importação demonstrando uma balança de pagamentos ligeiramente positiva. Exportações baseadas em matéria-prima e produtos acabados (incluindo petróleo e seus derivados, comida processada, maquinarias e equipamentos). O KENYA é considerado a 86ª Economia do Mundo com o PIB em 2008 fixado em 60.361 mil milhões de dólares e a dívida interna (pública) em 7.729 mil milhões de dólares até 2009. Os dados sobre a dívida externa não são precisos. Neste mesmo ano as exportações situaram-se na ordem dos 4.479 mil milhões de dólares contra 9. 215 Mil milhões de dólares de importação. Uma balança de pagamentos negativa. Exportações baseadas em matéria-prima e produtos acabados (incluindo petróleo e seus derivados, produtos agrícolas, etc.).
Com a extrema dependência das exportações de hidrocarbonetos e a manutenção de uma economia dependente do sector público (sobretudo em contratos de concessão) Angola pode ser comparada a Guiné-Bissau, pela dependência a chamada mono-exportação (um único produto de exportação) e a Etiópia pela falta visível de uma economia privada auto-sustentada. Ambos os países em consideração inspiram delicadezas e fragilidades graves em todos os domínios. A Guine Bissau está entre os 10 países mais pobres do mundo, enquanto a Etiópia, famosa pelas crises periódicas de seca e fome, não só depende fundamentalmente de uma agricultura de subsistência (tipo familiar) como se dá ao “luxo” de não ter quaisquer infra-estruturas económicas privadas para além da terra ser dispensada para o cultivo ao povo mediante arrendamento. São, como é óbvio, países com uma manifesta desestruturação económica dominados por uma gestão pública, tão irreal quanto ilusória, incapaz de promover o bem-estar social e o desenvolvimento económico. O que se lhes leva a assemelhar-se a Angola nesse sentido. Afinal, Angola tem uma balança comercial positiva ilusória. Porque as exportações, que levam ao espantoso crescimento da economia angolana, são o reflexo da exportação privilegiada de um único produto: O petróleo. Infelizmente um crescimento assente exclusivamente na indústria petrolífera (no aumento discomensurado e, por vezes, irracional da exploração deste recurso não renovável). Mesmo que alguns países chamados à comparação não manifestem balanças de pagamento equilibradas ou manifesto crescimento económico notam-se nos mesmos a existência de infra-estruturas económicas maioritariamente privadas, um sistema comercial externo liberalizado, produção e distribuição de energia e água estável, tendência decrescente da taxa de analfabetismo bem como uma atenção clara aos sectores da saúde e da educação, diversidade económica por sectores quer na importação quer na exportação (nessa vertente destacam-se produtos acabados incluindo maquinarias e equipamentos), preocupação na estabilidade macroeconómica pela manipulação de agregados estratégicos para o desenvolvimento económico e social como a política de emprego (estímulo visível ao sector privado pela facilidade no investimento privado) e a política monetária (taxas de inflação controladas). Os exemplos da Nigéria, África do Sul e Kénia são invejáveis nesse sentido.
Na RDC, o desaparecimento quase total do parque industrial, fruto da gestão ruinosa do regime de Mobutu Sese Seko e das guerras civis dos anos 90 que levou sucessivamente os dois membros da família Kabila ao poder até aos dias de hoje, é a principal causa do desastre económico vivido pelos congoleses. Da mesma maneira que a gestão ruinosa das empresas pelo Estado e a prolongada guerra civil que se arrastou até momentos recentes, são, em Angola, as causas mais visíveis e sensíveis da ruína económica e social. Ambos os países têm a missão de lançar mãos com urgência à edificação do parque empresarial privado que ofereceu glórias no passado. E no caso de Angola, acresce-se a necessidade de esforçar-se em abandonar a tendência de desenvolver uma economia pública (criação e relançamento de empresas públicas que actuam em sectores de concorrência privada), deixar de manter a dependência do sector empresarial privado a economia pública e sobretudo estimular a diversificação da economia pelo abandono urgente da monoexportação. Já que as fotografias económicas da Guiné Bissau e da Etiópia podem não estar longe de se assemelharem à de Angola se nos próximos tempos as mudanças não se operarem apesar do “famoso” crescimento económico.
A história empresarial angolana não é encorajadora quanto a persistência do Executivo em relançar o empresariado público nos dias de hoje. Com a independência de Angola o parque empresarial privado foi transferido para o sector público através das nacionalizações operadas sobre todos os bens de produção. Foi aprovado um diploma legal (Lei das Nacionalizações e Confiscos) que produziu a transferência não só das empresas como de imóveis pertencentes aos particulares, num regime sancionatório no que toca aos confiscos da propriedade imobiliária para quem estivesse ausente do país por um lapso considerável de tempo. Era o mecanismo mais indicado para transferir inclusive o parque imobiliário ao sector público mercê das opções políticas da época assentes na centralização da economia e da propriedade pelo Estado feitas pelo Partido (MPLA) como detentor da vontade soberana do povo. Surgiram várias unidades de produção (UEE – Unidades Económicas Estatais) que foram, muitas delas recapacitadas tecnicamente com equipamentos importados de países de opção socialista (parceiros legítimos de Angola pro-comunista). Porém com um sistema de gestão prejudicado pelo elevado índice de analfabetismo e inexperiência empresarial, técnica e tecnológica da época. Como consequência a manutenção do sistema industrial tornou-se problemática. O sistema económico entrou em crise e começou a perder aceleradamente em favor de uma economia informal galopante que arrastou consigo todo o controlo fiduciário para fora de um sistema bancário completamente débil, estrangulando a política monetária que deu lugar as crónicas e galopantes inflações dos anos 80. Várias medidas políticas foram tomadas sem sucesso para controlar e estabilizar a economia planificada. Reorganizaram-se as empresas no plano directivo, produtivo e financeiro. Surgiram conselhos de Direcção e os Plafond (fundos financeiros) para importação de matérias-primas, para além da dependência orçamental estatal existente. Algumas iniciativas privadas começaram a ganhar espaço e o financiamento de algumas delas começaram acontecer ao abrigo das reformas do sector empresarial. No meio deste esforço inglório são famosos a troca da moeda (empréstimo forçado que levou a ruína boa parte da população angolana) e o SEF (Programa de Saneamento Económico e Financeiro). A queda veloz e inevitável da qualidade e quantidade das UEE levaram a substituir a produção interna pelas importações em muitos sectores da economia ao ponto de confinar-se a exportação aos hidrocarbonetos. Mas os dias do empresariado público nacional estavam contados. Nos finais da década de 80, a economia empresarial angolana conheceu o colapso definitivo com o reconhecimento da necessidade de privatizar e reprivatizar a maior parte do parque industrial. Com base nisso, do Conselho de Ministros nasceu a política do redimensionamento empresarial sustentadas pelo Decreto n.º 32/89, de 15 de Julho (mais tarde reforçado pelo Decreto n.º8 – F/91, de 16 de Março) que deu lugar a criação do Gabinete de Redimensionamento Empresarial (GARE), através do Decreto n.º 36189, de 22 de Julho. Estabeleceu-se um horizonte temporal de 10 anos para concluir todo o processo inerente a (re) transferência das empresas para o sector privado (1990 – 2000). As guerras civis descontroladas em quase todo o território nacional exerceram a pressão suficiente para considerar-se enterrado inclusive a opção económica fundamental assente na economia centralizada que acabou arrastando consigo o parque empresarial angolano à ruína.
Com a inauguração do Estado de Direito e Democrático nos limiares dos anos 90 uma nova visão económica emergiu para dar lugar a iniciativa privada. Em 1991, o Estado decide transferir igualmente para o sector privado o seu património imobiliário com aprovação da Lei n.º 19/91, de 21 de Maio como sinal de transformação das opções fundamentais para a livre iniciativa e para a propriedade privada como primado constitucional de 1992. Porém, a guerra civil foi retomada e Angola, com todos os seus projectos de recuperação económica, entrou em hibernação. O país conheceu uma era de plena importação de todos os bens com destaque aos materiais e equipamentos bélicos para sustentar a defesa da integridade territorial vulnerável com a possibilidade de invasões externas. 16 anos passaram e a paz voltou a pairar sobre os angolanos com o Memorando de Entendimento do Luena que pós fim a guerra civil em Angola. O que não impediu que o processo de privatização desse continuidade. A esse propósito em 1994 foi aprovada a Lei n.º 10/94, de 31 de Agosto (Lei das Privatizações) reforçando normativamente todo o processo (esta mesma Lei veio a ser alterada em 2003 pela Lei n.º 8/03, de 18 de Abril). As eleições legislativas de 2008 relançaram democraticamente o Estado e até o ano de 2010 (ano passado) um esforço legislativo e económico tem sido empreendido no sentido de viabilizar a estabilidade social e económica de Angola.
Desde o lançamento da política de Redimensionamento Empresarial dos idos anos 80, o balanço actual feito pelo Ministério das Finanças é de terem sido privatizadas 409 empresas perfazendo 1.533 unidades de produção o que corresponde a 29,5% do património do Estado (dados do projecto Portal do Governo). Ainda assim, temos um Estado nostálgico disposto a recuperar o parque empresarial público com um conjunto de reformas legais nesse sentido. Ao invés, o processo de investimento privado (nacional e estrangeiro) continua excessivamente burocrático e desmotivante (essa situação agravou com a recente reforma a Lei do Investimento Privado que estabelece medidas restritivas quanto ao volume financeiro para os investimentos e as condições da sua efectivação), o projecto de uma Bolsa de Valores Mobiliários está em banho-maria e não é sensível qualquer esforço no sentido de serem eliminadas as grandes barreiras que impossibilitam o florescimento de um empresariado nacional consentâneo com as opções fundamentais assentes na iniciativa privada consagrada na nova Lei Constitucional – LC (Constituição, segundo o legislador). A tão necessária e urgente reforma fiscal não acontece e a política fiscal e aduaneira actual não é convidativa para além de pesada, é notória a ausência de um circuito bancário que sirva as oportunidades empresariais e a iniciativa privada, excesso de burocracia na formação de empresas bem como a existência de obstáculos sérios no desenvolvimento do parque empresarial, impedimentos notórios ao investimento estrangeiro e à importação de capitais entre milhares de obstáculos que levaram o Banco Mundial a colocar Angola entre os países com mais dificuldades para se investir em todo o mundo (cfr. acima: Ease of Doing Business Index).
Para quem nota estes elementos no ambiente económico angolano facilmente conclui que o Estado angolano tem uma notável alergia ao surgimento de um parque empresarial privado sólido e multiparticipado por estas medidas de “contenção” e obstrução que desenvolve contra os investidores privados em benefício de um monopólio de Estado sobre a economia. Sem o ambiente empresarial adequado as empresas transferidas para o sector privado entram em desamparo completo ao lado da impotência do empreendedor nacional ante as vicissitudes apontadas. Diante deste quadro é fácil perceber o clientelismo e a corrupção como instrumento que tem viabilizado alguma estabilidade financeira das empresas privadas maioritariamente controlada por estrangeiros pela dependência que têm do sector público.
Paralelamente, o Executivo não só estimula o empresariado público como leva o Estado a engajar os recursos públicos em substituição dos esforços do sector privado (construindo imóveis habitacionais e demais infra-estruturas económicas de vocação privada). Nasce disso a impossibilidade de assistir aos sectores de vocação pública como a saúde, a educação e as infra-estruturas e equipamentos sociais provocando um processo de progressão económica e regressão social que tem motivado as mais variadas ondas de manifestações que se têm assistido nos últimos dias. O Estado angolano encontra-se assim numa gestão desvirtuada dos interesses colectivos.
Assim, torna-se mais do que evidente que o Executivo está fora da trajectória que leva ao desenvolvimento sustentado. E a falta de humildade em admitir tal erro crasso leva o partido no poder a minimizar as reivindicações sociais generalizadas em favor da ostentação eleitoralista das obras públicas feitas em atendimento ao sector económico em detrimento do sector social. A correcção do tiro passa necessariamente por libertar e capacitar a iniciativa económica e todo o empresariado privado cumprindo três etapas fundamentais: (1) organizar o mercado financeiro interno (Bolsa de Valores Mobiliários, sistema de juros e subvenções adequados ao empresariado, reforma fiscal e aduaneira adequada (incluindo políticas de subvenção para bens e agentes económicos estratégicos), simplificar o processo de organização, formação e instalação de empresas, incrementar e diversificar legalmente as modalidades empresariais à luz das exigências das economias modernas (Lei das Sociedades Comerciais), estabelecer uma política de investimento estrangeiro condicionado para os capitais mínimos entre outras medidas urgentes; (2) estimular o investimento privado (nacional e estrangeiro) e a importação generalizada de capitais e (3) aderir aos acordos de livre comércio e de união aduaneira ao nível da região (SADC), acertando o passo com os demais países membros rumo ao desenvolvimento de um mercado regional simétrico. Ao mesmo tempo, o Estado deve repor-se à função regulatória da economia, desviando em consequência o esforço financeiro no capítulo do investimento público para os sectores vocacionais naturalmente orientados a organização e estabilidade social que correspondam a capacitação e sustentação humana através da educação e saúde, para além da ordem interna, da defesa territorial, do reforço institucional público, do estímulo das instituições públicas vocacionadas ao apoio das iniciativas privadas, da política de apoio social (reforma, subsidio de desemprego, etc.). Dixit.
Albano Pedro
Enquanto colónia (província) portuguesa, Angola chegou a estar, nos meados e finais dos anos 60 do século passado, entre as 6 maiores economias do mundo. Tinha então um vasto e sólido parque industrial chegando a exportar, ao lado de matéria-prima, produtos acabados sobretudo para Portugal, exibindo deste modo uma balança comercial satisfatória pontuada pela exportação de produtos diversificados. Os três sectores da economia estavam em perfeita sintonia havendo uma exploração diversificada de recursos minerais, florestais, marinhos e agro-pecuários com as correspondentes indústrias suportadas por uma rede de serviços multissectorizados. A produção de energia eléctrica e o fornecimento da água correspondiam as exigências médias da época tornando estável a economia. Nesta mesma década, o então Zaíre (hoje RDC – o exemplo vem pela vizinhança e aproximações histórico-económicas) era o segundo país mais industrializado de África seguindo a África do Sul com o seu monstruoso parque industrial multisectorizado. Em Angola, os lares das populações negras trabalhadoras e assalariadas tinham as três refeições e era frequente falar-se em vida regalada (onde o bom vinho a mesa das refeições era comum) mesmo para os que tinham rendimentos básicos. Os bens de consumo (mesmo os duradouros como viaturas, electrodomésticos, etc.) podiam ser adquiridos a créditos facilitados por um sector bancário robusto e funcional. Uma classe privada numerosa detentora de médios e grandes capitais (maioritariamente obtidos de explorações agropecuárias) começou a edificar imóveis que tornaram Luanda e algumas cidades de Angola nas mais modernas urbes do mundo na época.
Actualmente, Angola está entre as economias do planeta que mais rapidamente crescem, depois de recuperar da desgastante guerra civil e de pretender ultrapassar a inoportuna opção económica centralizada do pós-indepêndencia que ainda persiste na realidade económica actual. Apesar disso, está longe de estar entre as melhores economias de África. Porque ganha apenas países em estado de miséria económica e social patente. Os dados (fonte: CIA World Fact Book) indicam esse facto pelos elementos comparativos que passamos a descriminar: A Economia de Angola vem crescendo com uma taxa de 11.1% entre 2001 e 2010. O PIB (Produto Interno Bruto) em 2010 foi de 114.1 mil milhões de dólares e a dívida externa situada na ordem dos 17.98 mil milhões de dólares (até Dezembro de 2010). Exportações em 2010 situaram-se na ordem dos 51.65 mil milhões de dólares enquanto as importações no mesmo ano situaram-se na ordem dos 18.1 mil milhões de dólares. O Banco Mundial colocou Angola em 163 º na lista dos países com maior facilidade e segurança em investimentos (Ease of Doing Business Index). A RDC (República Democrática do Congo) é a 119ª Economia do Mundo com o PIB em 2009 de 21.64 mil milhões de dólares e a dívida externa situada em 10 mil milhões de dólares até 2009 contra a dívida interna (pública) não especificada. Neste mesmo ano as exportações situaram-se na ordem dos 6.1 mil milhões de dólares contra 5. 2 mil milhões de dólares de importação. Uma balança externa ligeiramente positiva neste ano. Infelizmente as exportações são baseadas em matéria-prima tal como Angola e o Banco Mundial situou a RDC em 182 º na lista dos países com maior facilidade e segurança em investimentos (Ease of Doing Business Index). A ÁFRICA DO SUL é qualificada em termos de rendimentos como uma Economia média-alta (em África está ao lado do Botswana, Gabão e Ilhas Maurícias) com o PIB em 2010 de 357.4 mil milhões de dólares e a dívida externa situada em 73.84 mil milhões de dólares até 2009 contra a dívida interna (pública) de 35.7% do PIB. Neste mesmo ano as exportações situaram-se na ordem dos 67.93 mil milhões de dólares contra 70. 24 mil milhões de dólares de importação. Uma balança de pagamentos negativa notória neste ano. Exportações baseadas em matéria-prima e produtos acabados (incluindo maquinarias e equipamentos). A NIGÉRIA é tida como 31ª Economia do Mundo em termos de PIB que em 2010 foi fixado em 377.6 mil milhões de dólares e a dívida externa situada em 9.689 mil milhões de dólares até 2009 contra a dívida interna (pública) de 17.8% do PIB. No mesmo ano as exportações fixaram-se em 45.43 mil milhões de dólares contra 42.1 Mil milhões de dólares de importação demonstrando uma balança de pagamentos ligeiramente positiva. Exportações baseadas em matéria-prima e produtos acabados (incluindo petróleo e seus derivados, comida processada, maquinarias e equipamentos). O KENYA é considerado a 86ª Economia do Mundo com o PIB em 2008 fixado em 60.361 mil milhões de dólares e a dívida interna (pública) em 7.729 mil milhões de dólares até 2009. Os dados sobre a dívida externa não são precisos. Neste mesmo ano as exportações situaram-se na ordem dos 4.479 mil milhões de dólares contra 9. 215 Mil milhões de dólares de importação. Uma balança de pagamentos negativa. Exportações baseadas em matéria-prima e produtos acabados (incluindo petróleo e seus derivados, produtos agrícolas, etc.).
Com a extrema dependência das exportações de hidrocarbonetos e a manutenção de uma economia dependente do sector público (sobretudo em contratos de concessão) Angola pode ser comparada a Guiné-Bissau, pela dependência a chamada mono-exportação (um único produto de exportação) e a Etiópia pela falta visível de uma economia privada auto-sustentada. Ambos os países em consideração inspiram delicadezas e fragilidades graves em todos os domínios. A Guine Bissau está entre os 10 países mais pobres do mundo, enquanto a Etiópia, famosa pelas crises periódicas de seca e fome, não só depende fundamentalmente de uma agricultura de subsistência (tipo familiar) como se dá ao “luxo” de não ter quaisquer infra-estruturas económicas privadas para além da terra ser dispensada para o cultivo ao povo mediante arrendamento. São, como é óbvio, países com uma manifesta desestruturação económica dominados por uma gestão pública, tão irreal quanto ilusória, incapaz de promover o bem-estar social e o desenvolvimento económico. O que se lhes leva a assemelhar-se a Angola nesse sentido. Afinal, Angola tem uma balança comercial positiva ilusória. Porque as exportações, que levam ao espantoso crescimento da economia angolana, são o reflexo da exportação privilegiada de um único produto: O petróleo. Infelizmente um crescimento assente exclusivamente na indústria petrolífera (no aumento discomensurado e, por vezes, irracional da exploração deste recurso não renovável). Mesmo que alguns países chamados à comparação não manifestem balanças de pagamento equilibradas ou manifesto crescimento económico notam-se nos mesmos a existência de infra-estruturas económicas maioritariamente privadas, um sistema comercial externo liberalizado, produção e distribuição de energia e água estável, tendência decrescente da taxa de analfabetismo bem como uma atenção clara aos sectores da saúde e da educação, diversidade económica por sectores quer na importação quer na exportação (nessa vertente destacam-se produtos acabados incluindo maquinarias e equipamentos), preocupação na estabilidade macroeconómica pela manipulação de agregados estratégicos para o desenvolvimento económico e social como a política de emprego (estímulo visível ao sector privado pela facilidade no investimento privado) e a política monetária (taxas de inflação controladas). Os exemplos da Nigéria, África do Sul e Kénia são invejáveis nesse sentido.
Na RDC, o desaparecimento quase total do parque industrial, fruto da gestão ruinosa do regime de Mobutu Sese Seko e das guerras civis dos anos 90 que levou sucessivamente os dois membros da família Kabila ao poder até aos dias de hoje, é a principal causa do desastre económico vivido pelos congoleses. Da mesma maneira que a gestão ruinosa das empresas pelo Estado e a prolongada guerra civil que se arrastou até momentos recentes, são, em Angola, as causas mais visíveis e sensíveis da ruína económica e social. Ambos os países têm a missão de lançar mãos com urgência à edificação do parque empresarial privado que ofereceu glórias no passado. E no caso de Angola, acresce-se a necessidade de esforçar-se em abandonar a tendência de desenvolver uma economia pública (criação e relançamento de empresas públicas que actuam em sectores de concorrência privada), deixar de manter a dependência do sector empresarial privado a economia pública e sobretudo estimular a diversificação da economia pelo abandono urgente da monoexportação. Já que as fotografias económicas da Guiné Bissau e da Etiópia podem não estar longe de se assemelharem à de Angola se nos próximos tempos as mudanças não se operarem apesar do “famoso” crescimento económico.
A história empresarial angolana não é encorajadora quanto a persistência do Executivo em relançar o empresariado público nos dias de hoje. Com a independência de Angola o parque empresarial privado foi transferido para o sector público através das nacionalizações operadas sobre todos os bens de produção. Foi aprovado um diploma legal (Lei das Nacionalizações e Confiscos) que produziu a transferência não só das empresas como de imóveis pertencentes aos particulares, num regime sancionatório no que toca aos confiscos da propriedade imobiliária para quem estivesse ausente do país por um lapso considerável de tempo. Era o mecanismo mais indicado para transferir inclusive o parque imobiliário ao sector público mercê das opções políticas da época assentes na centralização da economia e da propriedade pelo Estado feitas pelo Partido (MPLA) como detentor da vontade soberana do povo. Surgiram várias unidades de produção (UEE – Unidades Económicas Estatais) que foram, muitas delas recapacitadas tecnicamente com equipamentos importados de países de opção socialista (parceiros legítimos de Angola pro-comunista). Porém com um sistema de gestão prejudicado pelo elevado índice de analfabetismo e inexperiência empresarial, técnica e tecnológica da época. Como consequência a manutenção do sistema industrial tornou-se problemática. O sistema económico entrou em crise e começou a perder aceleradamente em favor de uma economia informal galopante que arrastou consigo todo o controlo fiduciário para fora de um sistema bancário completamente débil, estrangulando a política monetária que deu lugar as crónicas e galopantes inflações dos anos 80. Várias medidas políticas foram tomadas sem sucesso para controlar e estabilizar a economia planificada. Reorganizaram-se as empresas no plano directivo, produtivo e financeiro. Surgiram conselhos de Direcção e os Plafond (fundos financeiros) para importação de matérias-primas, para além da dependência orçamental estatal existente. Algumas iniciativas privadas começaram a ganhar espaço e o financiamento de algumas delas começaram acontecer ao abrigo das reformas do sector empresarial. No meio deste esforço inglório são famosos a troca da moeda (empréstimo forçado que levou a ruína boa parte da população angolana) e o SEF (Programa de Saneamento Económico e Financeiro). A queda veloz e inevitável da qualidade e quantidade das UEE levaram a substituir a produção interna pelas importações em muitos sectores da economia ao ponto de confinar-se a exportação aos hidrocarbonetos. Mas os dias do empresariado público nacional estavam contados. Nos finais da década de 80, a economia empresarial angolana conheceu o colapso definitivo com o reconhecimento da necessidade de privatizar e reprivatizar a maior parte do parque industrial. Com base nisso, do Conselho de Ministros nasceu a política do redimensionamento empresarial sustentadas pelo Decreto n.º 32/89, de 15 de Julho (mais tarde reforçado pelo Decreto n.º8 – F/91, de 16 de Março) que deu lugar a criação do Gabinete de Redimensionamento Empresarial (GARE), através do Decreto n.º 36189, de 22 de Julho. Estabeleceu-se um horizonte temporal de 10 anos para concluir todo o processo inerente a (re) transferência das empresas para o sector privado (1990 – 2000). As guerras civis descontroladas em quase todo o território nacional exerceram a pressão suficiente para considerar-se enterrado inclusive a opção económica fundamental assente na economia centralizada que acabou arrastando consigo o parque empresarial angolano à ruína.
Com a inauguração do Estado de Direito e Democrático nos limiares dos anos 90 uma nova visão económica emergiu para dar lugar a iniciativa privada. Em 1991, o Estado decide transferir igualmente para o sector privado o seu património imobiliário com aprovação da Lei n.º 19/91, de 21 de Maio como sinal de transformação das opções fundamentais para a livre iniciativa e para a propriedade privada como primado constitucional de 1992. Porém, a guerra civil foi retomada e Angola, com todos os seus projectos de recuperação económica, entrou em hibernação. O país conheceu uma era de plena importação de todos os bens com destaque aos materiais e equipamentos bélicos para sustentar a defesa da integridade territorial vulnerável com a possibilidade de invasões externas. 16 anos passaram e a paz voltou a pairar sobre os angolanos com o Memorando de Entendimento do Luena que pós fim a guerra civil em Angola. O que não impediu que o processo de privatização desse continuidade. A esse propósito em 1994 foi aprovada a Lei n.º 10/94, de 31 de Agosto (Lei das Privatizações) reforçando normativamente todo o processo (esta mesma Lei veio a ser alterada em 2003 pela Lei n.º 8/03, de 18 de Abril). As eleições legislativas de 2008 relançaram democraticamente o Estado e até o ano de 2010 (ano passado) um esforço legislativo e económico tem sido empreendido no sentido de viabilizar a estabilidade social e económica de Angola.
Desde o lançamento da política de Redimensionamento Empresarial dos idos anos 80, o balanço actual feito pelo Ministério das Finanças é de terem sido privatizadas 409 empresas perfazendo 1.533 unidades de produção o que corresponde a 29,5% do património do Estado (dados do projecto Portal do Governo). Ainda assim, temos um Estado nostálgico disposto a recuperar o parque empresarial público com um conjunto de reformas legais nesse sentido. Ao invés, o processo de investimento privado (nacional e estrangeiro) continua excessivamente burocrático e desmotivante (essa situação agravou com a recente reforma a Lei do Investimento Privado que estabelece medidas restritivas quanto ao volume financeiro para os investimentos e as condições da sua efectivação), o projecto de uma Bolsa de Valores Mobiliários está em banho-maria e não é sensível qualquer esforço no sentido de serem eliminadas as grandes barreiras que impossibilitam o florescimento de um empresariado nacional consentâneo com as opções fundamentais assentes na iniciativa privada consagrada na nova Lei Constitucional – LC (Constituição, segundo o legislador). A tão necessária e urgente reforma fiscal não acontece e a política fiscal e aduaneira actual não é convidativa para além de pesada, é notória a ausência de um circuito bancário que sirva as oportunidades empresariais e a iniciativa privada, excesso de burocracia na formação de empresas bem como a existência de obstáculos sérios no desenvolvimento do parque empresarial, impedimentos notórios ao investimento estrangeiro e à importação de capitais entre milhares de obstáculos que levaram o Banco Mundial a colocar Angola entre os países com mais dificuldades para se investir em todo o mundo (cfr. acima: Ease of Doing Business Index).
Para quem nota estes elementos no ambiente económico angolano facilmente conclui que o Estado angolano tem uma notável alergia ao surgimento de um parque empresarial privado sólido e multiparticipado por estas medidas de “contenção” e obstrução que desenvolve contra os investidores privados em benefício de um monopólio de Estado sobre a economia. Sem o ambiente empresarial adequado as empresas transferidas para o sector privado entram em desamparo completo ao lado da impotência do empreendedor nacional ante as vicissitudes apontadas. Diante deste quadro é fácil perceber o clientelismo e a corrupção como instrumento que tem viabilizado alguma estabilidade financeira das empresas privadas maioritariamente controlada por estrangeiros pela dependência que têm do sector público.
Paralelamente, o Executivo não só estimula o empresariado público como leva o Estado a engajar os recursos públicos em substituição dos esforços do sector privado (construindo imóveis habitacionais e demais infra-estruturas económicas de vocação privada). Nasce disso a impossibilidade de assistir aos sectores de vocação pública como a saúde, a educação e as infra-estruturas e equipamentos sociais provocando um processo de progressão económica e regressão social que tem motivado as mais variadas ondas de manifestações que se têm assistido nos últimos dias. O Estado angolano encontra-se assim numa gestão desvirtuada dos interesses colectivos.
Assim, torna-se mais do que evidente que o Executivo está fora da trajectória que leva ao desenvolvimento sustentado. E a falta de humildade em admitir tal erro crasso leva o partido no poder a minimizar as reivindicações sociais generalizadas em favor da ostentação eleitoralista das obras públicas feitas em atendimento ao sector económico em detrimento do sector social. A correcção do tiro passa necessariamente por libertar e capacitar a iniciativa económica e todo o empresariado privado cumprindo três etapas fundamentais: (1) organizar o mercado financeiro interno (Bolsa de Valores Mobiliários, sistema de juros e subvenções adequados ao empresariado, reforma fiscal e aduaneira adequada (incluindo políticas de subvenção para bens e agentes económicos estratégicos), simplificar o processo de organização, formação e instalação de empresas, incrementar e diversificar legalmente as modalidades empresariais à luz das exigências das economias modernas (Lei das Sociedades Comerciais), estabelecer uma política de investimento estrangeiro condicionado para os capitais mínimos entre outras medidas urgentes; (2) estimular o investimento privado (nacional e estrangeiro) e a importação generalizada de capitais e (3) aderir aos acordos de livre comércio e de união aduaneira ao nível da região (SADC), acertando o passo com os demais países membros rumo ao desenvolvimento de um mercado regional simétrico. Ao mesmo tempo, o Estado deve repor-se à função regulatória da economia, desviando em consequência o esforço financeiro no capítulo do investimento público para os sectores vocacionais naturalmente orientados a organização e estabilidade social que correspondam a capacitação e sustentação humana através da educação e saúde, para além da ordem interna, da defesa territorial, do reforço institucional público, do estímulo das instituições públicas vocacionadas ao apoio das iniciativas privadas, da política de apoio social (reforma, subsidio de desemprego, etc.). Dixit.
terça-feira, 27 de dezembro de 2011
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
ENTRE O TITULAR, O CARGO E O ÓRGÃO DE SOBERANIA – DIFERENÇAS E PARTICULARIDADES A CONSIDERAR NO SISTEMA JURÍDICO ANGOLANO
Albano Pedro
O Presidente da República enquanto titular do cargo máximo de direcção do Estado não se confunde com o cargo e com o órgão Presidente da República. O Presidente da República enquanto titular do cargo é um cidadão livremente escolhido entre os membros da sociedade. É o primeiro dos cidadãos. Os latinos justamente consideravam-no o príncipe ou chefe sendo nos momentos históricos recentes o primus inter pars por surgir entre os seus pares ou iguais em alusão a igualdade de direitos que todos os cidadãos têm perante a lei em aceder aos cargos públicos conforme as previsões constitucionais da maioria dos Estados, embora já não seja assim à luz da nova Lei Constitucional - LC (Constituição, segundo o legislador) como veremos adiante. Este cidadão tem de ter os requisitos gerais determinados pela LC (art.º 110º, n.º 1) como sejam a maioridade mínima que é de 35 anos, residência habitual em território nacional num tempo mínimo de 10 anos; que esteja no gozo da plenitude dos seus direitos civis e políticos e tenha capacidade física e mental para exercer o cargo. Por capacidade física e mental se entende a possibilidade de estar apto para as várias actividades que implicam o exercício das funções presidenciais. Não se pretende considerar a diminuição física como incapacidade física se não impedir o exercício das funções em causa. Da mesma forma (e por argumento a fortiori) é discutível se a demência, episódica ou permanente, mesmo clinicamente atestada impede o acesso ao cargo em causa, uma vez que a lei considera apenas impeditiva a demência que cause interdição e como tal declarada em tribunal mediante sentença competente. Também há que considerar os requisitos negativos de elegibilidade (art.º 110º, n.º 2) traduzidos em condições de inelegibilidade para o cargo de Presidente da República. Neste caso, há a apontar o facto de o candidato ao cargo não ter qualquer outra nacionalidade (não ter nacionalidade adquirida); não ser Magistrado Judicial ou do Ministério Público no exercício de funções e nem juiz do Tribunal Constitucional, do Tribunal de Contas no activo; não pode ser Provedor de Justiça tão pouco adjunto dessa função; não pode ser membro dos órgãos da administração eleitoral ou militar ou membro de forças militarizadas no activo. Se já tiver sido Presidente da República é admitido como candidato se tiver tido um único mandato e não tiver sido interrompido por destituição, renúncia ou abandono das correspondentes funções presidenciais. A luz da LC, o candidato presidencial é proposto pelo partido concorrente as eleições (art.º 111º) estando descartada a possibilidade de concorrem a esse cargo os candidatos independentes e que como tal concorram sem apoio de partidos políticos como foi legislado ao abrigo da LC antiga. De todo modo, podem ser indivíduos não filiados nos respectivos partidos políticos ou coligação de partidos políticos concorrentes. Não basta ter apoio do partido político concorrente. Tem de ser o cabeça de lista, i.e., tem de figurar como o primeiro da lista dos deputados que o partido elencar oficialmente (oficialmente porque a lista tem de dar entrada válida no Tribunal Constitucional). Assim realizam-se duas eleições simultaneamente. As eleições parlamentares (para eleger deputados) e as presidenciais (com a concorrência implícita dos primeiros deputados das listas dos diferentes partidos políticos concorrentes às eleições. As eleições gerais devem ser convocadas até 90 dias antes do termo do mandato do Presidente da república e dos Deputados à Assembleia Nacional em funções e realizam-se até 30 dias antes do fim do mandato dos mesmos. O mandato do Presidente da República tem a duração de 5 anos e obviamente dura o mesmo tempo que o mandato dos deputados e pode candidatar-se até dois mandatos consecutivos ou interpolados. O cidadão eleito ao cargo de Presidente da República é empossado pelo Presidente do Tribunal Constitucional nos 15 dias que se seguem a publicação oficial dos resultados definitivos. No acto da posse o cidadão presta juramento nos termos descritos pela LC (art.º 115º) em que fica evidente que toma posse como titular de um cargo presidencial. Boa nota a tomar é que a luz da nova LC o conceito de eleição presidencial deve ser substituído pelo conceito de indicação presidencial por questões de rigor técnico-legal e semântico.
O cargo de Presidente da República implica competências distribuídas em funções como Chefe de Estado (art.º 119º), titular do Poder Executivo ou Governo (art.º 120.º) e como Comandante em Chefe (art.º 122º). É no exercício do cargo de Presidente da República que o seu titular representa o Estado e o Governo praticando todos os actos nessa qualidade. Dentre as competências do Presidente da República figuram algumas que representam um verdadeiro atentado ao Estado de Direito e Democrático que se pretende edificado em Angola por violar o princípio da separação e interdependência de poderes dos órgãos máximos do Estado (para a nova LC a denominação de órgãos soberanos, para além da Assembleia Nacional, é radicalmente duvidosa como veremos). Entre elas está o poder de nomear os juízes do Tribunal Supremo. Já era assim à luz da LC antiga. Porém, muito se esperou que essa disposição normativa fundamental fosse expurgada para enfraquecer, nesse sentido, a vinculatividade da Lei 18/88 – Sistema Unificado de Justiça, aprovada no âmbito do sistema de Estado centralizado. É verdade que esta disposição normativa mantém o sistema judicial na linha dos órgãos máximos do Estado não soberanos. Mas compromete gravemente a imparcialidade de todo o sistema judicial angolano na aplicação das leis aos casos concretos. Sobretudo quando os litígios envolvam questões de interesse público e implicam entidades ligadas aos órgãos do Estado.
O órgão Presidente da República é consagrado constitucionalmente como soberano (embora hoje seja contestável como veremos adiante) e compreende um conjunto de serviços entre os quais se encontra o cargo de Presidente da República. São de destacar o gabinete Presidente da República, o gabinete da Primeira Dama da República, a Casa Civil, a Casa Militar entre outros serviços. O órgão, embora juridicamente considerado singular por a titularidade e autoridade assentar in propria persona, tem carácter colectivo porque compreende um conjunto mais ou menos complexo de serviços, em geral, auxiliares em relação ao titular do cargo de Presidente da República. Deste modo, e assim diferenciado, o fim do mandato do titular do cargo de Presidente da República não implica alteração das competências (porque não são específicas da pessoa do titular), tão pouco importa a cessação das funções dos membros dos órgãos e serviços auxiliares do respectivo órgão. Embora nesse caso, o provimento das vagas para as funções principais de tais órgãos e serviços se opere na base da confiança pessoal e como tal dependem da temporalidade implícita ao mandato do cargo de Presidente da República e das conveniências das funções exercidas pelo seu titular.
É perfeitamente contestável o estatuto soberano do Presidente da República à luz da LC. A soberania desapareceu com a consagração das eleições parlamentares que promovem o primeiro deputado da lista do partido político vencedor para o cargo de Presidente da República. O povo já não elege o Presidente. Logo, a soberania que pertence originalmente ao povo não se transfere e em consequência o Presidente da República deixa de ser um órgão de soberania como foi consagrado na Lei Constitucional de 1991 até antes da vigência da actual LC. Assim também é aceitável que nem se fale em eleições presidenciais por estas não existirem em favor de uma indicação interna do candidato pelo partido político vencedor. Em consequência disto é razoável admitir que o Presidente da República já não tenha nenhum poder de soberania (ius imperi) cujas decisões vinculem os dirigidos (Governo ou Executivo) ou representem estes perante terceiros, sobretudo no plano internacional (Chefe de Estado). Acresce-se nessa confusão debilitante o facto de o Presidente da República acumular as funções de Deputado à Assembleia Nacional no momento da tomada de posse como o mais Alto Magistrado do Estado (alguns chamam Nação, por estranho que pareça como veremos mais abaixo). Aqui fica clara a feição que aproxima o sistema de governo angolano ao parlamentarismo inglês em que o Primeiro-Ministro enquanto chefe do Governo é também membro do Parlamento. Mas, o Presidente da República no exercício das suas funções suspende materialmente as suas funções como membro da Assembleia Nacional uma vez que deixa de comparecer as sessões parlamentares nessa qualidade. Aqui devia ocorrer uma suspensão formal como Deputado à Assembleia Nacional no momento da “transferência” de cargo para Presidente da República. O que não está previsto na LC, traduzindo assim uma verdadeira lacuna normativa no nível fundamental das normas jurídicas. Dessa combinação polémica, e de difícil digestão académica e até política, resulta o facto de o Presidente da República beneficiar do estatuto da Assembleia Nacional como único órgão eleito pela transferência da soberania a partir do povo.
Uma outra abordagem a considerar é a personalização do Poder Executivo (Governo) pelo Presidente da República. Ao abrigo da LC antiga o Governo era um órgão colegial e os seus membros (Presidente da República, Primeiro-Ministro e ministros) eram parte da soberania do estado e como consequência eram considerados membros do governo, para além de órgãos políticos, tornando o Conselho de Ministros o órgão superior de administração pública. A nova LC deposita toda a responsabilidade do governo numa única pessoa: O Presidente da República. Aqui nasce a semelhança do nosso sistema de governo com o sistema presidencialista americano. Logo, o Vice-Presidente, os Ministros de Estado, os ministros e demais altos funcionários do Estado são meros funcionários do gabinete presidencial completamente despidos de quaisquer dignidades política. Então o Executivo é uma única pessoa e não faz sentido que o Presidente da República seja chamado chefe do Executivo por não ter mais ninguém para responsabilizar a acção governativa do Estado. Por isso é que hoje faz sentido que o Conselho de Ministros seja um mero órgão auxiliar do Presidente da República. Logo, está muito bem a denominação constitucional de Titular do Executivo (embora o conceito de Executivo tenha um mero cariz estético não invalidando a axiologia inerente ao conceito de Governo).
A confusão do Presidente da República no exercício das suas funções e fora delas, nomeadamente no exercício de funções partidárias, tem gerado toda a sorte de especulações na compreensão dos governados. Não raro, surgem, dessa confusão, sérias violações de limites entre o exercício das funções presidenciais e das funções partidárias que se apresentam na forma de decisões parciais, desvio de património público, favorecimento de oportunidades económicas e sociais aos membros do partido entre outras anomalias. Para evitar acidentes do género, alguns Estado consagraram constitucionalmente a impossibilidade do Presidente da República em funções estar igualmente no exercício de quaisquer funções no partido que o indica ou apoia. Infelizmente não está assim consagrado na actual LC. O que de lege ferenda deixa uma clara obrigação normativa fundamental nesse sentido. Pois, há a necessidade de diferenciação de exercícios pela demarcação do inicio e fim de cada uma das funções em referência.
O mais grave problema que o exercício combinado de cargos estadual e partidário, pelo Presidente da República, implica, é a “intromissão” na Assembleia Nacional pelo controlo da actividade parlamentar do seu partido influenciando as decisões ao arrepio da liberdade de exercício dos seus deputados. Sendo Presidente do Partido, o Presidente da República tem o privilégio de lançar mãos a determinados instrumentos internos da sua organização (disciplina partidária entre outros) para conformar toda a decisão parlamentar do seu partido aos interesses do seu mandato. O que reforça sobremaneira os seus poderes no controlo do Estado. É dessa variante que vem o aspecto dictatorial (no sentido do controlo absoluto do poder) do Presidente da República como órgão consagrado pela LC.
Essa crise na demarcação entre as funções presidenciais e as funções partidárias é também a principal causa da intolerância política em Estados cujos presidentes, sendo chefes de Estado e de Governo, são igualmente chefes das sua formações partidárias como acontece na maior parte do continente africano, americano e asiático. Não estranha que o maior índice de revoltas sociais se situe em tais países porque o Estado é tendencialmente repartido entre cidadãos privilegiados (os militantes do partido do Presidente da República) e os não privilegiados (militantes de outros partidos e apartidários – entre objectores de consciência). Assim, o acesso aos cargos públicos e as oportunidades económicas estão abertos aos militantes do partido do Presidente da República revelando na maioria das vezes uma aparente má distribuição da riqueza nacional e das oportunidades que ela gera. À intolerância política que nasce deste privilégio em relação ao Estado segue-se a intolerância partidária (porque os militantes de partidos na oposição se acham descriminados pelos militantes do partido no poder e estes acham que as reclamações daqueles não têm razão de ser). Gradativamente a intolerância atinge núcleos laborais, escolares, residenciais e familiares numa espiral que envolve impotência e violência levando ao caos, com todas as sugestões anti-sociais geradas pela corrupção e clientelismo daí resultantes, todo um projecto de sociedade e de nação.
Não é suficientemente persuasiva a afirmação segundo a qual o Presidente da República é o mais Alto Magistrado da Nação. O correcto seria do Estado (descontada a parte em que este poder se encontra debilitado pela novo modelo eleitoral). Porque o Presidente da República garante o controlo da legalidade dos actos públicos apenas na base da LC que conforma o Estado e não a Nação. Quer directamente (pela promulgação das leis, ratificação de tratados, solicitação do controlo preventivo da constitucionalidade das leis, etc.), quer indirectamente (pelos actos praticados pelo seu mandatário que é o Procurador Geral da República). Seria magistrado da Nação se tivéssemos uma verdadeira Constituição no sentido que essa ligasse à LC todos os valores culturais que identificam o povo angolano (a nação angolana) ao contrário desta LC que sufraga valores culturais ocidentais e como tal se impõe, em detrimento da realidade social dos angolanos, com ditames meramente legalistas (sobre este assunto já expendemos em diversos textos a consultar em: www.jukulomesso.blogspot.com).
Recuperando as considerações tecidas acima sobre o titular do cargo de Presidente da República e a questão da igualdade de direitos em relação aos dirigidos ou governados, há que verificar que o exercício das funções presidenciais eleva o cidadão indicado acima das sanções legais, na maioria dos casos, tornando-o imune às previsões legais de um modo geral. É uma situação de discussão obrigatória já que as leis servem para todos e por isso abstractas (Ius non in singula personas, sed generaliter constituitur), sendo que por interesse de particular nenhum devem ser modificadas (Ius publicum privatorum pactis mutari non potest). Disto resulta que as normas convencionadas entre os particulares acabam tendo um suporte abstracto na sua observância (Ius privatum, sub tutela iuris publici, latet). É bem verdade que vale a máxima Lex cavet civibus, magistratus legibus (As leis protegem os cidadãos e o magistrado as leis) por oferecer melhor a compreensão sobre a necessidade de o magistrado estar protegido das próprias leis para melhor protegê-las. Torna-se, por isso, razoável que na qualidade de mais Alto Magistrado do Estado e como tal o primeiro garante da observância das leis e seu protector-mor seja imune das suas sanções para que o sentido de positivação e reforma das leis não seja conduzido em atenção aos interesses pessoais. Todavia, o titular do cargo de Presidente da República se afigura como uma verdadeira excepção ao princípio da universalidade de direitos (art.º 22º). Desde logo, porque é constitucionalmente irresponsabilizado pelos actos praticados no exercício das suas funções e como tal não se lhe administram quaisquer sanções na esmagadora maioria das situações e casos, sobretudo de natureza criminal, senão passado o exercício do mandato. Ou seja, fora do mandato e cumprido certo lapso de tempo. É claro que tais privilégios não são aceites contra o próprio Estado (Privilegium contra rem publicam non valet). Porém, o seu exercício contra o interesse público é muitas vezes evidente e sem qualquer controlo eficaz. Aqui prevalece sempre a ideia equivalente ao favorecimento das leis ao juiz (pro iudice iura praesumunt) descontada a parte do exercício ilícito. Nesse sentido, deixa bem clara a concordância com a afirmação justiniana que consagra a inutilidade do acto praticado com a proibição legal: Ea quae lege fieri prohibentur, si fuerint facta, non solum inutilia, sed pro infectis etiam habeantur. O que significa que a lei no caso de imunização sancionatória do Presidente da República consagrou uma verdadeira ficção jurídica. Dixit.
Albano Pedro
O Presidente da República enquanto titular do cargo máximo de direcção do Estado não se confunde com o cargo e com o órgão Presidente da República. O Presidente da República enquanto titular do cargo é um cidadão livremente escolhido entre os membros da sociedade. É o primeiro dos cidadãos. Os latinos justamente consideravam-no o príncipe ou chefe sendo nos momentos históricos recentes o primus inter pars por surgir entre os seus pares ou iguais em alusão a igualdade de direitos que todos os cidadãos têm perante a lei em aceder aos cargos públicos conforme as previsões constitucionais da maioria dos Estados, embora já não seja assim à luz da nova Lei Constitucional - LC (Constituição, segundo o legislador) como veremos adiante. Este cidadão tem de ter os requisitos gerais determinados pela LC (art.º 110º, n.º 1) como sejam a maioridade mínima que é de 35 anos, residência habitual em território nacional num tempo mínimo de 10 anos; que esteja no gozo da plenitude dos seus direitos civis e políticos e tenha capacidade física e mental para exercer o cargo. Por capacidade física e mental se entende a possibilidade de estar apto para as várias actividades que implicam o exercício das funções presidenciais. Não se pretende considerar a diminuição física como incapacidade física se não impedir o exercício das funções em causa. Da mesma forma (e por argumento a fortiori) é discutível se a demência, episódica ou permanente, mesmo clinicamente atestada impede o acesso ao cargo em causa, uma vez que a lei considera apenas impeditiva a demência que cause interdição e como tal declarada em tribunal mediante sentença competente. Também há que considerar os requisitos negativos de elegibilidade (art.º 110º, n.º 2) traduzidos em condições de inelegibilidade para o cargo de Presidente da República. Neste caso, há a apontar o facto de o candidato ao cargo não ter qualquer outra nacionalidade (não ter nacionalidade adquirida); não ser Magistrado Judicial ou do Ministério Público no exercício de funções e nem juiz do Tribunal Constitucional, do Tribunal de Contas no activo; não pode ser Provedor de Justiça tão pouco adjunto dessa função; não pode ser membro dos órgãos da administração eleitoral ou militar ou membro de forças militarizadas no activo. Se já tiver sido Presidente da República é admitido como candidato se tiver tido um único mandato e não tiver sido interrompido por destituição, renúncia ou abandono das correspondentes funções presidenciais. A luz da LC, o candidato presidencial é proposto pelo partido concorrente as eleições (art.º 111º) estando descartada a possibilidade de concorrem a esse cargo os candidatos independentes e que como tal concorram sem apoio de partidos políticos como foi legislado ao abrigo da LC antiga. De todo modo, podem ser indivíduos não filiados nos respectivos partidos políticos ou coligação de partidos políticos concorrentes. Não basta ter apoio do partido político concorrente. Tem de ser o cabeça de lista, i.e., tem de figurar como o primeiro da lista dos deputados que o partido elencar oficialmente (oficialmente porque a lista tem de dar entrada válida no Tribunal Constitucional). Assim realizam-se duas eleições simultaneamente. As eleições parlamentares (para eleger deputados) e as presidenciais (com a concorrência implícita dos primeiros deputados das listas dos diferentes partidos políticos concorrentes às eleições. As eleições gerais devem ser convocadas até 90 dias antes do termo do mandato do Presidente da república e dos Deputados à Assembleia Nacional em funções e realizam-se até 30 dias antes do fim do mandato dos mesmos. O mandato do Presidente da República tem a duração de 5 anos e obviamente dura o mesmo tempo que o mandato dos deputados e pode candidatar-se até dois mandatos consecutivos ou interpolados. O cidadão eleito ao cargo de Presidente da República é empossado pelo Presidente do Tribunal Constitucional nos 15 dias que se seguem a publicação oficial dos resultados definitivos. No acto da posse o cidadão presta juramento nos termos descritos pela LC (art.º 115º) em que fica evidente que toma posse como titular de um cargo presidencial. Boa nota a tomar é que a luz da nova LC o conceito de eleição presidencial deve ser substituído pelo conceito de indicação presidencial por questões de rigor técnico-legal e semântico.
O cargo de Presidente da República implica competências distribuídas em funções como Chefe de Estado (art.º 119º), titular do Poder Executivo ou Governo (art.º 120.º) e como Comandante em Chefe (art.º 122º). É no exercício do cargo de Presidente da República que o seu titular representa o Estado e o Governo praticando todos os actos nessa qualidade. Dentre as competências do Presidente da República figuram algumas que representam um verdadeiro atentado ao Estado de Direito e Democrático que se pretende edificado em Angola por violar o princípio da separação e interdependência de poderes dos órgãos máximos do Estado (para a nova LC a denominação de órgãos soberanos, para além da Assembleia Nacional, é radicalmente duvidosa como veremos). Entre elas está o poder de nomear os juízes do Tribunal Supremo. Já era assim à luz da LC antiga. Porém, muito se esperou que essa disposição normativa fundamental fosse expurgada para enfraquecer, nesse sentido, a vinculatividade da Lei 18/88 – Sistema Unificado de Justiça, aprovada no âmbito do sistema de Estado centralizado. É verdade que esta disposição normativa mantém o sistema judicial na linha dos órgãos máximos do Estado não soberanos. Mas compromete gravemente a imparcialidade de todo o sistema judicial angolano na aplicação das leis aos casos concretos. Sobretudo quando os litígios envolvam questões de interesse público e implicam entidades ligadas aos órgãos do Estado.
O órgão Presidente da República é consagrado constitucionalmente como soberano (embora hoje seja contestável como veremos adiante) e compreende um conjunto de serviços entre os quais se encontra o cargo de Presidente da República. São de destacar o gabinete Presidente da República, o gabinete da Primeira Dama da República, a Casa Civil, a Casa Militar entre outros serviços. O órgão, embora juridicamente considerado singular por a titularidade e autoridade assentar in propria persona, tem carácter colectivo porque compreende um conjunto mais ou menos complexo de serviços, em geral, auxiliares em relação ao titular do cargo de Presidente da República. Deste modo, e assim diferenciado, o fim do mandato do titular do cargo de Presidente da República não implica alteração das competências (porque não são específicas da pessoa do titular), tão pouco importa a cessação das funções dos membros dos órgãos e serviços auxiliares do respectivo órgão. Embora nesse caso, o provimento das vagas para as funções principais de tais órgãos e serviços se opere na base da confiança pessoal e como tal dependem da temporalidade implícita ao mandato do cargo de Presidente da República e das conveniências das funções exercidas pelo seu titular.
É perfeitamente contestável o estatuto soberano do Presidente da República à luz da LC. A soberania desapareceu com a consagração das eleições parlamentares que promovem o primeiro deputado da lista do partido político vencedor para o cargo de Presidente da República. O povo já não elege o Presidente. Logo, a soberania que pertence originalmente ao povo não se transfere e em consequência o Presidente da República deixa de ser um órgão de soberania como foi consagrado na Lei Constitucional de 1991 até antes da vigência da actual LC. Assim também é aceitável que nem se fale em eleições presidenciais por estas não existirem em favor de uma indicação interna do candidato pelo partido político vencedor. Em consequência disto é razoável admitir que o Presidente da República já não tenha nenhum poder de soberania (ius imperi) cujas decisões vinculem os dirigidos (Governo ou Executivo) ou representem estes perante terceiros, sobretudo no plano internacional (Chefe de Estado). Acresce-se nessa confusão debilitante o facto de o Presidente da República acumular as funções de Deputado à Assembleia Nacional no momento da tomada de posse como o mais Alto Magistrado do Estado (alguns chamam Nação, por estranho que pareça como veremos mais abaixo). Aqui fica clara a feição que aproxima o sistema de governo angolano ao parlamentarismo inglês em que o Primeiro-Ministro enquanto chefe do Governo é também membro do Parlamento. Mas, o Presidente da República no exercício das suas funções suspende materialmente as suas funções como membro da Assembleia Nacional uma vez que deixa de comparecer as sessões parlamentares nessa qualidade. Aqui devia ocorrer uma suspensão formal como Deputado à Assembleia Nacional no momento da “transferência” de cargo para Presidente da República. O que não está previsto na LC, traduzindo assim uma verdadeira lacuna normativa no nível fundamental das normas jurídicas. Dessa combinação polémica, e de difícil digestão académica e até política, resulta o facto de o Presidente da República beneficiar do estatuto da Assembleia Nacional como único órgão eleito pela transferência da soberania a partir do povo.
Uma outra abordagem a considerar é a personalização do Poder Executivo (Governo) pelo Presidente da República. Ao abrigo da LC antiga o Governo era um órgão colegial e os seus membros (Presidente da República, Primeiro-Ministro e ministros) eram parte da soberania do estado e como consequência eram considerados membros do governo, para além de órgãos políticos, tornando o Conselho de Ministros o órgão superior de administração pública. A nova LC deposita toda a responsabilidade do governo numa única pessoa: O Presidente da República. Aqui nasce a semelhança do nosso sistema de governo com o sistema presidencialista americano. Logo, o Vice-Presidente, os Ministros de Estado, os ministros e demais altos funcionários do Estado são meros funcionários do gabinete presidencial completamente despidos de quaisquer dignidades política. Então o Executivo é uma única pessoa e não faz sentido que o Presidente da República seja chamado chefe do Executivo por não ter mais ninguém para responsabilizar a acção governativa do Estado. Por isso é que hoje faz sentido que o Conselho de Ministros seja um mero órgão auxiliar do Presidente da República. Logo, está muito bem a denominação constitucional de Titular do Executivo (embora o conceito de Executivo tenha um mero cariz estético não invalidando a axiologia inerente ao conceito de Governo).
A confusão do Presidente da República no exercício das suas funções e fora delas, nomeadamente no exercício de funções partidárias, tem gerado toda a sorte de especulações na compreensão dos governados. Não raro, surgem, dessa confusão, sérias violações de limites entre o exercício das funções presidenciais e das funções partidárias que se apresentam na forma de decisões parciais, desvio de património público, favorecimento de oportunidades económicas e sociais aos membros do partido entre outras anomalias. Para evitar acidentes do género, alguns Estado consagraram constitucionalmente a impossibilidade do Presidente da República em funções estar igualmente no exercício de quaisquer funções no partido que o indica ou apoia. Infelizmente não está assim consagrado na actual LC. O que de lege ferenda deixa uma clara obrigação normativa fundamental nesse sentido. Pois, há a necessidade de diferenciação de exercícios pela demarcação do inicio e fim de cada uma das funções em referência.
O mais grave problema que o exercício combinado de cargos estadual e partidário, pelo Presidente da República, implica, é a “intromissão” na Assembleia Nacional pelo controlo da actividade parlamentar do seu partido influenciando as decisões ao arrepio da liberdade de exercício dos seus deputados. Sendo Presidente do Partido, o Presidente da República tem o privilégio de lançar mãos a determinados instrumentos internos da sua organização (disciplina partidária entre outros) para conformar toda a decisão parlamentar do seu partido aos interesses do seu mandato. O que reforça sobremaneira os seus poderes no controlo do Estado. É dessa variante que vem o aspecto dictatorial (no sentido do controlo absoluto do poder) do Presidente da República como órgão consagrado pela LC.
Essa crise na demarcação entre as funções presidenciais e as funções partidárias é também a principal causa da intolerância política em Estados cujos presidentes, sendo chefes de Estado e de Governo, são igualmente chefes das sua formações partidárias como acontece na maior parte do continente africano, americano e asiático. Não estranha que o maior índice de revoltas sociais se situe em tais países porque o Estado é tendencialmente repartido entre cidadãos privilegiados (os militantes do partido do Presidente da República) e os não privilegiados (militantes de outros partidos e apartidários – entre objectores de consciência). Assim, o acesso aos cargos públicos e as oportunidades económicas estão abertos aos militantes do partido do Presidente da República revelando na maioria das vezes uma aparente má distribuição da riqueza nacional e das oportunidades que ela gera. À intolerância política que nasce deste privilégio em relação ao Estado segue-se a intolerância partidária (porque os militantes de partidos na oposição se acham descriminados pelos militantes do partido no poder e estes acham que as reclamações daqueles não têm razão de ser). Gradativamente a intolerância atinge núcleos laborais, escolares, residenciais e familiares numa espiral que envolve impotência e violência levando ao caos, com todas as sugestões anti-sociais geradas pela corrupção e clientelismo daí resultantes, todo um projecto de sociedade e de nação.
Não é suficientemente persuasiva a afirmação segundo a qual o Presidente da República é o mais Alto Magistrado da Nação. O correcto seria do Estado (descontada a parte em que este poder se encontra debilitado pela novo modelo eleitoral). Porque o Presidente da República garante o controlo da legalidade dos actos públicos apenas na base da LC que conforma o Estado e não a Nação. Quer directamente (pela promulgação das leis, ratificação de tratados, solicitação do controlo preventivo da constitucionalidade das leis, etc.), quer indirectamente (pelos actos praticados pelo seu mandatário que é o Procurador Geral da República). Seria magistrado da Nação se tivéssemos uma verdadeira Constituição no sentido que essa ligasse à LC todos os valores culturais que identificam o povo angolano (a nação angolana) ao contrário desta LC que sufraga valores culturais ocidentais e como tal se impõe, em detrimento da realidade social dos angolanos, com ditames meramente legalistas (sobre este assunto já expendemos em diversos textos a consultar em: www.jukulomesso.blogspot.com).
Recuperando as considerações tecidas acima sobre o titular do cargo de Presidente da República e a questão da igualdade de direitos em relação aos dirigidos ou governados, há que verificar que o exercício das funções presidenciais eleva o cidadão indicado acima das sanções legais, na maioria dos casos, tornando-o imune às previsões legais de um modo geral. É uma situação de discussão obrigatória já que as leis servem para todos e por isso abstractas (Ius non in singula personas, sed generaliter constituitur), sendo que por interesse de particular nenhum devem ser modificadas (Ius publicum privatorum pactis mutari non potest). Disto resulta que as normas convencionadas entre os particulares acabam tendo um suporte abstracto na sua observância (Ius privatum, sub tutela iuris publici, latet). É bem verdade que vale a máxima Lex cavet civibus, magistratus legibus (As leis protegem os cidadãos e o magistrado as leis) por oferecer melhor a compreensão sobre a necessidade de o magistrado estar protegido das próprias leis para melhor protegê-las. Torna-se, por isso, razoável que na qualidade de mais Alto Magistrado do Estado e como tal o primeiro garante da observância das leis e seu protector-mor seja imune das suas sanções para que o sentido de positivação e reforma das leis não seja conduzido em atenção aos interesses pessoais. Todavia, o titular do cargo de Presidente da República se afigura como uma verdadeira excepção ao princípio da universalidade de direitos (art.º 22º). Desde logo, porque é constitucionalmente irresponsabilizado pelos actos praticados no exercício das suas funções e como tal não se lhe administram quaisquer sanções na esmagadora maioria das situações e casos, sobretudo de natureza criminal, senão passado o exercício do mandato. Ou seja, fora do mandato e cumprido certo lapso de tempo. É claro que tais privilégios não são aceites contra o próprio Estado (Privilegium contra rem publicam non valet). Porém, o seu exercício contra o interesse público é muitas vezes evidente e sem qualquer controlo eficaz. Aqui prevalece sempre a ideia equivalente ao favorecimento das leis ao juiz (pro iudice iura praesumunt) descontada a parte do exercício ilícito. Nesse sentido, deixa bem clara a concordância com a afirmação justiniana que consagra a inutilidade do acto praticado com a proibição legal: Ea quae lege fieri prohibentur, si fuerint facta, non solum inutilia, sed pro infectis etiam habeantur. O que significa que a lei no caso de imunização sancionatória do Presidente da República consagrou uma verdadeira ficção jurídica. Dixit.
sábado, 24 de dezembro de 2011
GOVERNAÇÃO VERSUS DIREITOS HUMANOS
A EXPERIÊNCIA E A VIVÊNCIA DAS POPULAÇÕES NA PROVÍNCIA DO KUANDO KUBANGO
ALBANO PEDRO
Entre nós está mais do que evidente que a governação do Estado nem sempre atende as mais elementares necessidades dos governados. Isso é até mais do que óbvio. Questões como a distribuição de água (ainda que não seja potável), energia eléctrica, problemas com a saúde pública e o saneamento básico tornaram-se canções tão recorrentes que o hábito de os ter presente no dia-a-dia tornaram-nos capazes de sentir saudades em caso dos problemas virem a desaparecer completamente. Abordar esses temas tornaram-se lugar-comuns tanto nos discursos partidários quanto nas reclamações diárias dos cidadão e por essa vulgaridade não merecerem aqui a nossa reflexão. Na verdade o que se pretende é abordar uma perspectiva de interação entre a governação e a realização dos direitos humanos completamente estranha ao discurso habitual. E daqui vem a experiencia e a vivencia das populações da provincia do Kuando Kubango.
Convém adiantar que as populações mais autoctones desta provincia comportam características semi-nomadas e são em geral identificadas como pertencendo ao grupo étnico-linguistico Nganguela veiculando a lingua com o mesmo nome. Tendo uma vivencia assente fundamentalmente na busca de recursos providos pela própria natureza através da caça, da recolecção e da produção de carvão, os membros desse grupo etnico, não sedentarizados, fazem da mudança de espaços territóriais uma ocupação permanente ao longo do seu ciclo vital. É claro que muitos elementos e familias inteiras pertecentes a este grupo etnolinguistico se encontram sedentarizados nos pequenos e grandes espaços urbanos dessa Angola imensa. Mas no caso das populações ligadas ao estilo de vida tradicional localizadas na provincia do Kuando Kubango, o semi-nomadismo é o elemento chamado para análise nesta abordagem ja que levanta situações muito particulares no contexto da governação do Estado. Com efeito, enquanto as populações da maioria das provincias de Angola procuram imputar ao Governo todas as falhas possíveis no processo de obtenção de bens e de satisfação das mais básicas necessidades para a sua sobrevivência, na provincia do Kuando Kubango esse quadro é visto numa perspectiva diferente. É bem verdade que certos hábitos dos Nganguela por si só inviabilizam o sentido de cooperação entre as autoridades públicas e as populações. Por exemplo, é frequente vermos o abandono em massa das aldeias por destruição das casas devidas a chuvas. O conceito de reconstrução e manutenção de imóveis simplesmente não existe. As paredes da casa cairam então abandona-se pura e simplesmente. Aqui até fica bem patente a ausencia da ideia de limite do território para tais populações. Contudo, estes habitos colocados na confrontação analitica da governação local provocam situações alarmentes para além de resultados estrondosamente dramáticos. por exemplo, os esforços do Governo em construir escolas e postos médicos em localidades de fraca densidade populacional (aldeias e certas sedes comunais) são completammente anulados simplesmente porque as populações abandonam as aldeias com as suas infraestruturas e equipamentos sociais por qualquer razão que lhes seja pertinente. Por morte de um membro residente ou até pelas mais bizarras das razões, tais como a chegada de um forrasteiro (mukwakwiza) que venha instalar um negócio no local.
Os equipamentos sociais servem as populações por escassos periodos acontecendo mesmo que os alunos recém matriculados atendam apenas um trimestre antes de se mudarem para zonas sem quaisquer contactos com poderes públicos. O analfabetismo nessas paragens tornou-se num problema crónico e de difícil solução enquanto que as soluções para certos problemas de saúde pública se perdem nas gavetas das puras intenções das autoridades públicas. Neste ambiente, assiste-se então um tipo de desemprego que a minha incapacidade de analise dos fenomenos economicos não consegue tipificar. O Professor (escola) ou enfermeito (posto de saúde) que como funcionário público se ve sem trabalho para prestar porque as populações pura e simplesmente desapareceram do local. A vinculatividade e até a efectividade de tais funcionários embora inquestionável perdem razão de ser por falta de trabalho para prestar.
Aqui parece que os órgãos e serviços do Estado se veêm impossibilitados de realizarem as exigências cosntitucionais em matérias de direitos humanos diante de uma população que foge dessas mesmas condições, nascendo aqui um verdadeiro paradoxo. É bom ressalvar que nas sedes municipais esse problema não tem contornos alarmantes porque o abandono de casas não é sensivel quanto é nas pequenas comunidades sobretudo distantes da cidade de Menongue. Mas vale concluir que numa provincia com largos kilometros de espaços territoriais desabitados e com uma população quase rara, a sedentarização torna-se num grande desafio do Governo na relação com essas populações. No passado a igreja teve sucessos nesse processo. Durante os últimos séculos da colonização a igreja “obrigou” as populações a fixarem-se nos espaços territoriais ocupados. Ao longo das grandes vias rodoviárias podem ser vistas algumas aldeias com comunidades apresentado caracteristicas sedentárias lá aonde há uma capela ou paróquia. Tudo indica que a igreja viabilizaou a sedentarização dessas populações com elementos adicionais tais como a craição de condições alternativas para a sobrevivencia das populações pela adopção de hábitos de cultivo e criação de gado e pequenos animais domésticos. O que não parece ser a visão estratégica da governação do Estado no pós-independência.
De todo modo, a experiência da igreja nessas paragens é sem dúvidas a mais certa para estancar esse estado de coisas de formas a permitir que os órgãos e serviços dos Estado prestem os serviços devidos as populações. Dixit.
ALBANO PEDRO
Entre nós está mais do que evidente que a governação do Estado nem sempre atende as mais elementares necessidades dos governados. Isso é até mais do que óbvio. Questões como a distribuição de água (ainda que não seja potável), energia eléctrica, problemas com a saúde pública e o saneamento básico tornaram-se canções tão recorrentes que o hábito de os ter presente no dia-a-dia tornaram-nos capazes de sentir saudades em caso dos problemas virem a desaparecer completamente. Abordar esses temas tornaram-se lugar-comuns tanto nos discursos partidários quanto nas reclamações diárias dos cidadão e por essa vulgaridade não merecerem aqui a nossa reflexão. Na verdade o que se pretende é abordar uma perspectiva de interação entre a governação e a realização dos direitos humanos completamente estranha ao discurso habitual. E daqui vem a experiencia e a vivencia das populações da provincia do Kuando Kubango.
Convém adiantar que as populações mais autoctones desta provincia comportam características semi-nomadas e são em geral identificadas como pertencendo ao grupo étnico-linguistico Nganguela veiculando a lingua com o mesmo nome. Tendo uma vivencia assente fundamentalmente na busca de recursos providos pela própria natureza através da caça, da recolecção e da produção de carvão, os membros desse grupo etnico, não sedentarizados, fazem da mudança de espaços territóriais uma ocupação permanente ao longo do seu ciclo vital. É claro que muitos elementos e familias inteiras pertecentes a este grupo etnolinguistico se encontram sedentarizados nos pequenos e grandes espaços urbanos dessa Angola imensa. Mas no caso das populações ligadas ao estilo de vida tradicional localizadas na provincia do Kuando Kubango, o semi-nomadismo é o elemento chamado para análise nesta abordagem ja que levanta situações muito particulares no contexto da governação do Estado. Com efeito, enquanto as populações da maioria das provincias de Angola procuram imputar ao Governo todas as falhas possíveis no processo de obtenção de bens e de satisfação das mais básicas necessidades para a sua sobrevivência, na provincia do Kuando Kubango esse quadro é visto numa perspectiva diferente. É bem verdade que certos hábitos dos Nganguela por si só inviabilizam o sentido de cooperação entre as autoridades públicas e as populações. Por exemplo, é frequente vermos o abandono em massa das aldeias por destruição das casas devidas a chuvas. O conceito de reconstrução e manutenção de imóveis simplesmente não existe. As paredes da casa cairam então abandona-se pura e simplesmente. Aqui até fica bem patente a ausencia da ideia de limite do território para tais populações. Contudo, estes habitos colocados na confrontação analitica da governação local provocam situações alarmentes para além de resultados estrondosamente dramáticos. por exemplo, os esforços do Governo em construir escolas e postos médicos em localidades de fraca densidade populacional (aldeias e certas sedes comunais) são completammente anulados simplesmente porque as populações abandonam as aldeias com as suas infraestruturas e equipamentos sociais por qualquer razão que lhes seja pertinente. Por morte de um membro residente ou até pelas mais bizarras das razões, tais como a chegada de um forrasteiro (mukwakwiza) que venha instalar um negócio no local.
Os equipamentos sociais servem as populações por escassos periodos acontecendo mesmo que os alunos recém matriculados atendam apenas um trimestre antes de se mudarem para zonas sem quaisquer contactos com poderes públicos. O analfabetismo nessas paragens tornou-se num problema crónico e de difícil solução enquanto que as soluções para certos problemas de saúde pública se perdem nas gavetas das puras intenções das autoridades públicas. Neste ambiente, assiste-se então um tipo de desemprego que a minha incapacidade de analise dos fenomenos economicos não consegue tipificar. O Professor (escola) ou enfermeito (posto de saúde) que como funcionário público se ve sem trabalho para prestar porque as populações pura e simplesmente desapareceram do local. A vinculatividade e até a efectividade de tais funcionários embora inquestionável perdem razão de ser por falta de trabalho para prestar.
Aqui parece que os órgãos e serviços do Estado se veêm impossibilitados de realizarem as exigências cosntitucionais em matérias de direitos humanos diante de uma população que foge dessas mesmas condições, nascendo aqui um verdadeiro paradoxo. É bom ressalvar que nas sedes municipais esse problema não tem contornos alarmantes porque o abandono de casas não é sensivel quanto é nas pequenas comunidades sobretudo distantes da cidade de Menongue. Mas vale concluir que numa provincia com largos kilometros de espaços territoriais desabitados e com uma população quase rara, a sedentarização torna-se num grande desafio do Governo na relação com essas populações. No passado a igreja teve sucessos nesse processo. Durante os últimos séculos da colonização a igreja “obrigou” as populações a fixarem-se nos espaços territoriais ocupados. Ao longo das grandes vias rodoviárias podem ser vistas algumas aldeias com comunidades apresentado caracteristicas sedentárias lá aonde há uma capela ou paróquia. Tudo indica que a igreja viabilizaou a sedentarização dessas populações com elementos adicionais tais como a craição de condições alternativas para a sobrevivencia das populações pela adopção de hábitos de cultivo e criação de gado e pequenos animais domésticos. O que não parece ser a visão estratégica da governação do Estado no pós-independência.
De todo modo, a experiência da igreja nessas paragens é sem dúvidas a mais certa para estancar esse estado de coisas de formas a permitir que os órgãos e serviços dos Estado prestem os serviços devidos as populações. Dixit.
terça-feira, 20 de dezembro de 2011
ENTREVISTA COM ALBANO PEDRO
Alda Sousa, jornalista free-lancer luso-moçambicana conduziu uma entrevista telefónica com Albano Pedro cujo teor foi solicitado antes da sua publicação pelo entrevistado que retoma para o seu blogue com a devida vénia. A mesma pretende descortinar a visão do entrevistado sobre o ambiente político em Angola em vista as eleições de 2012 que se avizinham, para além de outros aspectos da vida social, política e económica que os angolanos vivem de uma maneira geral. Eis o teor:
ALDA SOUSA: Aproximam-se as eleições de 2012 que colocará fim ao actual mandato legislativo. Que balanço faz?
ALBANO PEDRO: O mandato em curso é uma tentativa falhada dos angolanos de se reencontrarem atravéz de um verdadeiro relançamento da democracia, do diálogo franco e aberto entre as diversas forças políticas e sociais, da tolerância política e da aplicação dos mecanismos de transparência na governação. Fez-se alguma coisa no domínio da implementação de projectos públicos: a continuação das obras e de muitos outros projectos públicos. Mas, é claro que o povo, de uma maneira geral, ainda ressente das falhas de uma governação pouco atenta aos questões sociais com todos os problemas “endémicos” bem patentes como a falta de distribuição sustentada da água e da energia electrica bem como a fraca capacidade de produção existente ante a rápida espanção das cidades em todo o território nacional. Na verdade há ainda muita coisa em falta para que se fale em condições mínimas para um verdadeiro relançamento económico e social dos angolanos. Do ponto de vista político cometeram-se erros craços, um pouco fruto do desespero do actual titular do Executivo no controlo do poder: a alteração da Lei Constitucional favorecendo a reeleição do actual Presidente e a supressão das eleições presidenciais; a manipulação do processo eleitoral bem como a falta de consenso induzido para a aprovação do pacote legislativo eleitoral; a injustificável contenção e matrato dos activistas ligados as manifestações populares; a corrupção generalizada, o elevado índice de desemprego e a subida vertiginosa dos níveis de pobreza...São erros que hão de despoletar mais tarde ou mais cedo um ambiente de descontentamento generalizado de contornos imprevisíveis no seio do povo angolano. Portanto, o mandato de 2008 tem criado as condições para uma desarmonização política e social dos angolanos e para a insustentabilidade do mandato político após as eleições da 2012.
AS: Que mudanças significativas prevê com as próximas eleições?
AP: Mudanças significativas? Nenhumas. Haverão obviamente algumas mudanças induzidas pelo próprio percurso histórico. Mas a maioria deles serão mudanças negativas, para não dizer dramáticas. Prevejo por exemplo, que os partidos políticos com assento no parlamento terão os números de deputados reduzidos se se mantiverem nele, o MPLA poderá vir a ter uma maioria com números de assentos que venham a superar os actuais. Isso quer dizer que o povo vai abster-se de votar em massa por descrédito da política e vai favorecer a mobilização de militantes que o MPLA tem feito para o registo eleitoral. Por falta de motivação, muitos angolanos não terão o registo actualizado e não poderão votar enquanto que os que tiverem o registo actualizado poderão não ter à quem votar. Portanto, prevejo uma grande dificuldade na promoção da alternância política e uma vitória com maioria esmagadora do MPLA que vai atrapalhar a sua própria governação e vai precipitar a sua própria queda daí em diante. Por isso, o partido no poder também tem de estar preocupado com este quadro porque não vai favorecer a nada e nem a ninguém!
AS: É de lei que os partidos políticos que não concorreram em 2008 e não volteram a concorrer nas proximas eleições desaparecerão do cenário político. Como visualiza a participação política dos cidadãos?
AP: Embora estejamos diante de uma previsão normativa inconstitucional, o facto é que o mercado político-partidário vai registar a pior recessão de sempre com a verredura de mais de 80% das forças político-partidárias existentes. O desespero poderá sugerir muitas coligações partidárias mas o desastre é inevitável. De todo o modo, era de esperar um momento em que os partidos políticos fossem postos a prova ante a letargia em que a maioria se encontra. Era de esperar um verdadeiro saneamento político que promova um clima de maior participação de cidadãos honestos e interessados pelo bem comum na política despromovendo aqueles que fazem da política um palco de oportunidades pessoais para o auto-sustento e enriquecimento a custo do erário público.
AS: Angola é o país que mais cresce economicamente. Como explica o alto indice de pobreza que se vive e os grandes problemas com a saúde, educação...?
AP: A corrupção e a distribuição injusta das oportunidades e da riqueza estão na linha da frente para explicar a nossa desgraça. Mas atenção: os economistas dizem que crescimento não é desenvolvimento, o que não devo deixar de admitir não só por ignorar tais matérias como por ver nesta diferenciação uma verdade evidente. Crescer significa aumentar a produção de bens e serviços abrangendo progressivamente áreas sociais e económicas anteriormente não atingidas. Há países que já não crescem tanto, embora continuem a crescer como não podia deixar de ser, por ja terem níveis de vida muito aceitáveis. É o caso da África do Sul entre nós. Não é para fazer festas que se fala em crescimento. O crescimento em Angola é sinónimo de aumento da produção de um único produto: o petróleo. Não é para ficarmos sorridentes que nos passam essas informações por peritos internacionais. Por exemplo em termos de índices de bem-estar social e humano Angola está muito próxima da Guiné Bissau que se encontra entre os 10 países mais pobres do mundo. Do ponto de vista da economia a Etiopia é mais próxima porque não regista actividade económica significativa controlada pelo sector privado. Portanto estamos entre os países de África mais atrasados social e economicamente. Estamos muito longe de alcançar as economias da África do Sul, da Nigéria e do Kénia que estão entre as melhores de África. Mas lá se diz que em 2012 Angola vai bater o record mundial das economias que mais crescem!
AS: Como cidadão como participa das transformações sociais em Angola?
AP: Reflectindo e debatendo as grandes questões do Estado. Tenho o vício de discutir política em quase todos os ambientes sociais de tal maneira que sou capaz de estar numa festa com amigos a discutir questões públicas. Mas o que me garante participação nas grandes questões públicas é a escrita. Escrevo e torno público as minhas reflexões políticas. É dessa forma que me vejo a contribuir para as grandes questões do Estado.
AS: E como Político?
AP: Bem se quer dizer agente de partido político descarto a resposta a essa questão, com o devido respeito!
AS: Recentemente a RDC assistiu a reeleição do seu Presidente. Estabelece algum paralelo com nosso país?
AP: Penso que a experiência da RDC é um aviso a ter em conta porque esse país vizinho na verdade está há anos de distância para o futuro em relação a nossa realidade. Veja que a era de Mobutu desapareceu 32 anos depois e JES está precisamente há 32 anos no poder. A alternância foi violenta porque os congoleses não quiseram negociar a saida do ditador e hoje vivem as consequencias dessa falta com as irregularidades eleitorais que nunca promove uma verdadeira transição política e com uma governação igual ou pior do que a do ditador deposto. Os congolese até avançaram com uma coligação de cariz nacional, uma frente patriótica, que foi e tem sido liderada por Etienne Tshissekedi Wa Mulumba sem grandes êxitos. Nós os angolanos devemos ter essa lição em conta para não repeti-la na nossa realidade. Porque o que está hoje a acontecer na RDC é seguramente o que nos vai acontecer nas próximas décadas se não formos sensatos nas decisões a tomar hoje. Por isso defendo um plano de salvação nacional que nos habilite a todos a promover uma transição política não violenta!
AS: Qual acha ser o nível de satisfação do povo angolano com o actual mandato do partido no poder?
AP: Zero. É o nível de satisfação. O povo saiu da desilusão para o desespero...está a ver como sair das garras opressoras do regime e promover a sua própria libertação pela mudança do poder político. E como as lideranças políticas não ajudam, o povo mantem-se no silêncio de aparente ignorância da sua própria situação social e económica!
AS: Acha que as manifestações reflectem os índices de insatisfação do povo?
AP: Insatifação não. Desespero...As manifestações são alguns dos sintomas. Mas também temos as greves passivas. Os angolanos demonstram pouca vontade e empenho para o trabalho corporativo e institucional porque percebem que os seus esforços e capacidades não são nem valorizados nem recompensados e que os seus dirigentes não salvaguardam os seus interesses sobretudo diante dos estrangeiros que operam em Angola. Há neste momento a falta de aderência em massa para o registo eleitoral apesar dos programas de mobilização nesse sentido. Isso faz pairar no ar uma espécie de plano nacional para o boicote às eleições. Enfim, se ficarmos atentos veremos muitos sinais de completa insatisfação. Por isso podemos dizer que Angola é um autêntico barril de pólvora. Falta apenas um líder que saiba interpretar essa insatisfação e transformá-la em força política para tudo acontecer contra o actual regime no poder!
AS: Acha que essa situação favorece os partidos políticos na oposição?
AP: Claro que não. O cego não percebe nada do que se lhe apresenta pela frente. Os partidos políticos vivem uma espécie de cegueira provocada pela falta de interesse em promover uma alternância pelo povo e para o povo. A maioria dos partidos políticos fez-se cúmplice do regime recebendo envelopes as escondidas e enganando o povo com discursos verborreicos e impraticáveis. Não existe suficiente moral política na oposição para se tirarem proveitos as oportunidades que se manifestam. Há corruptos tanto na situação quanto na oposição que passam a vida a promover o caos e a impotência nas respectivas formações partidárias. O povo pede por uma liderânça iluminada e eloquente!
AS: Não adivinha qualquer possibilidade de surgirem novas forças políticas que apresentem um desempenho mais aceitável?
AP: Como procurei fazer entender até agora, o ambiente que se vive actualmente não favorece o surgimento de novos partidos políticos porque o povo já não acredita em partidos políticos. É claro que este desespero pode produzir surpresas incríveis. E nisto adivinho o surgimento de uma força coligacional de feição nacional. Uma frente patriótica que abranja as melhores inteligências políticas da oposição e os partidos que entenderem sobreviver aos próximos desafios políticos. Há sinais que evidenciam essa possibilidade. O clima político mostra que os militantes e simpatizantes do MPLA e da maioria dos partidos políticos na oposição estão a mergulhar no desespero por estarem a ser vítimas das mesmas atrocidades provocadas pela governação. Porque as demolições de casas, os maus pagamentos nas empresas e toda a sorte de problemas e dificuldades sociais e conómicas não escolhem o tipo de militante ou simpatizante. Só falta unirem-se em torno de uma liderânça visionária que queira estancar este estado de coisas. Insisto neste ponto!
AS: Acha que o MPLA pode voltar a vencer as eleições?
AP: A resposta afirmativa não levanta qualquer dúvida. O MPLA está a fazer tudo nesse sentido nem que importe fraudes evidentes. E também não há força política de oposição suficiente para contrapor essa caminhada impetuosa do partido no poder. O que se está a questionar em círculos mais sérios é o tipo de vitória e as respectivas consequências políticas para todos nós e para o próprio MPLA!
AS: Diz-se que a falta de maturidade política do povo angolano contribui para essa situação. Concorda?
AP: De maneira nenhuma! O povo angolano é muito mais maduro do que os operadores políticos julgam. Há vários sinais dessa maturidade. O problema é que os políticos é que são imaturos porque não percebem que o povo quer preservar a estabilidade social ao mesmo tempo que pretende alternância na governação (atenção: o povo não argumenta a alternância política pela via partidária). O povo esta a gerir um dilema: Quer mudança na governação mas não pensa muito seriamente na mudança de partidos políticos por falta de liderânças credíveis. É o que se percebe nos comentários e na fraca participação nas iniciativas dos partidos políticos da oposição!
AS: Lendo os seus artigos na imprensa vê-se que não tem qualquer afinidade político-partidária porque não favorece claramente nenhum partido político. Num país em que quase todos os intelectuais têm um partido político em que depositam esperança essa atitude parece estranha. Porquê desta postura?
AP: Criticar partidos não significa não gostar ou não estar ligado a qualquer deles. Aliás, decorre da obrigação de militantes sérios analizar com imparcialidade e verdade o desempenho de um partido político para que este tenha um melhor desempenho e se promova no seu seio a cultura pela democracia e transparência. Tenho para mim que esses são os verdadeiros militantes. Tudo o resto oportunistas que procuram agradar os chefes a troco de oportunidades individuais em prejuízo do partido em que militam. A actividade política é um sacerdócio. É para cidadãos sérios e comprometidos com causas públicas. Quem quer ganhar a vida que aprenda um ofício ou faça um negócio qualquer que não seja política!
AS: Está ligado a um partido político ou não?
AP: Interessa-me muito ver os problemas da nação numa perspectiva mais uniformizante e imparcial do que defender posições partidárias. A nossa geração (a que nasceu nos anos 70 e 80) está condenada a promover um ambiente em que os problemas da nação ganham cada vez mais espaço no debate político sob pena de não conquistar a confiança do povo. Porque o povo já percebeu que tem sido vítima de manipulação pelos interesses partidários que nunca são claros. A minha base crítica do exercício político em Angola vem do facto de ter assumido sempre uma postura de oposição em todos os ambientes sociais em que divisei injustiça e má repartição de oportunidades. Desde pequeno que não admito que os meus protegidos sejam alvos de maltratos, mesmo nos momentos em que não tive forças ou meios suficientes para me impor contra...!
AS: Mas pode dizer pelo menos em que partido se revê?
AP: A fase do voto vai definir isso. Mas gostaria muito que a extinta FpD ressurgida como BD (Bloco Democrático) ganhasse uma desenvoltura táctica que viesse a dar êxitos eleitorais porque tem a tradição de promover o discurso aberto e democratico para além de não ter alergias às boas intenções dos seus simpatizantes. É bom ter em conta que em termos de simpatia político-partidária o futuro se prevê negro para a maioria dos angolanos sérios!
AS: Acha que os partidos politicos são factores de desunião do povo?
AP: De certa forma sim. Quando os políticos manipulam a vontade do povo contra os interesses destes é obvio que constituem um factor de desunião. É o que se passa com as igrejas quando incitam os seus fiéis a protegerem-se contra fieis de outras denominações religisas. Assim não se está perante defesa dos interesses das massas militantes mas das lideranças partidárias. Por isso é que vemos promessas veementes em comícios para depois tudo ser contrário quando os lideres da oposição partem em busca de parceirias pouco claras com o regime que se pretende mudado na governação. O povo já percebeu que é daqui que nasce a falta de coerência dos lideres da oposição e da fraca capacidade política destes em relação ao partido no poder.
AS: Quando fala em Angolanos sérios o que leva em conta?
AP: Levo em conta todos aqueles que perdram ilusões sobre a seriedade do exercício político em prol dos interesses nacionais e que por isso não aderem ao fanatismo ou a militância cega contra os angolanos ligados a outros partidos políticos. Enfim...falo dos angolanos que já não defendem partidos políticos, mas a nação. Em Angola já temos muitas figuras públicas ou não que nos orgulham nesse sentido!
AS: Acredita que o actual Presidente da República reune condições para mais um mandato?
AP: Está a fazer campanha ou quê (risos).Bem, penso que JES é um factor de estabilidade e instabilidade politica simultaneamente. A sua governação exagerada no tempo condiciounou os angolanos a este ponto. Hoje estamos todos reféns de uma realidade muito débil em que por uma lado estamos sobre a necessidade de mudança subjectiva da governação e por outro lado estamos perante a necessidade de preservar o quadro de estabilidade política, ainda que aparente. Estamos presos pela incerteza de uma governação futura que não favoreça o clima de estabilidade política actual. E tudo porque a oposição não dá quaisquer sinais de credibilidade nesse sentido para que todos tenhamos esperanças por uma mudança segura na governação do Estado. O povo está simultaneamente cansado e aliviado com o actual presidente da República, infelizmente!
AS: Pode explicar-se melhor?
AP: Se JES sai do poder que líder alternativo é capaz de garantir a segurânça dos milhares de estrangeiros e interesses que actuam nos vários segmentos de mercado em Angola? Quem garante que os milhares de membros do seu elenco governativo não serão julgados incluindo ele mesmo? Quem garante que os acordos com os chineses e com os americanos serão mantidos e cumpridos? Quem garante que os militantes do MPLA não serão perseguidos a semelhança do que aconteceu com os militantes da UNITA logo após as eleições de 1992? Quem garante que os generais, os comissários de polícia e muitos dos dirigentes políticos ligados ao partido no poder não serão expulsos e muitos deles julgados por práticas desonestas acontecidas no passado? Esse é o dilema em que se encontra mergulhado o povo e até a própria comunidade internacional. O certo é que devemos deslindar soluções seguras sobre essa situação. Mas o povo está sem dúvidas receoso com uma mudança forçada embora comece a apostar desesperadamente para a alternância política!
AS: Está a vaticinar momentos de disturbios políticoss com a saída do actual Presidente da República?
AP: Mas isso é por demais evidente. A menos que não queiramos olhar para realidade que se impõe. A governação de JES alimentou muitas diferenças sociais e económicas entre os angolanos de uma maneira geral. Criou a corrupção e muitas práticas ilicitas e desonestas que ajudam muita gente a sobreviver incluindo muitos daqueles que se dizem ligados a partidos da oposição. Há também muitos criminosos escondidos nas asas protectoras do regime. A mudança pode ser mesmo um desastre!
AS: Como pensa ser a melhor saída de JES do poder?
AP: Defendo que a transição política em Angola deve ser negociada com a coragem de todos os bons cidadãos afim de serem preservados os interesses mais nobres da Nação. O que passa por um acordo consensual, entre todas as forças vivas da nação, que proteja a integridade física e patrimonial de JES e de muitos dos seus actuais colaboradores. É a plataforma mais sensata para os angolanos se não quizermos entrar numa alternância forçada e sangrenta, se possível. Penso que JES tem medo do futuro para si e para os seus descendentes e a manutenação do poder é a via mais segura para evitar a concretização desse medo. É preciso que os partidos políticos e a sociedade civil promovam um debate sério a volta de um plano de estabilidade política pós-eleitoral que garanta segurânça ao actual presidente da República. É um dos caminhos para uma altrnância política estável e até para a transparência no processo eleitoral. Aliás essa é a solução para a maioria dos governantes de Africa que se arrastam no poder durante o tempo mais do que necessário. É claro que os políticos não estão interessados em interesses nacionais e muito menos em promover um debate do género. Por isso estou céptico quanto as soluções viáveis com base na actual realidade em que vivemos!
AS: Vê alguma figura política com capacidade e imagem pública capaz de substituir o presidente da republica sem que tais disturbios possam acontecer?
AP: De um modo geral qualquer angolano está abstractamente capaz de substituir JES. O problema a ponderar é a capacidade de garantir a estabilidade política mantendo o clima de boa convivencia entre as várias sensibilidades políticas e sociais. E como já referi, há também muitos interesses para preservar que se tocados ou alterados sem as devidas compensações poderão levar o país num verdadeiro caos. E nisto não estão apenas interesses de angolanos ou nacionais..!
AS: Qual é o papel da comunidade interrnacional para a estabilidade política em Angola?
AP: Podemos dividir a comunidade internacional e determinar os actores que encenam no mercado político. Nesta senda os EUA me parecem os que mais influenciam a política angolana. Veja que quando os americanos decidiram não mais apoiar a UNITA e o seu líder, a morte deste aconteceu quase que repentinamente quando vinha resistindo durante anos numa guerra que ja não se esperava fim. Tudo aconteceu porque o MPLA deixou a cooperação russa para curvar-se as exigencias americanas. Hoje acredito que JES só mantem o poder porque tem feito muito bem o seu trabalho de casa que até procura estender aos países vizinhos e não só. Tudo na perspectiva de manter boas relações com os americanos em prol da manutenção do poder. Quanto a ONU para mim não passa de uma grande capa com a qual os americanos se cobrem para espantar os interesses anti-americanos pelo mundo. A OUA é um pequeno aprendiz de feiticeiro que procura ter alguma autoridade dificil de conquistar junto de uma comunidade internacional da qual depende em tudo. Uma pretensão dificil de concretizar. A UE deseperada com o clima económico desfavorável que vive pendura-se aos interesses americanos para estancar os avanços da China pela África. Acredito que enquanto o regime preservar os interesses desses actores da cena mundial a paz que vivemos terá a sua garantia. São factores exógenos que condicionam o poder político não só em Angola como no resto de África!
AS: Participou das últimas eleições como candidato a deputado. Está frustrado por não estar na Assembleia Nacional?
AP: Nessa AN com a hegemonia do MPLA que diluiu o debate parlamentar eu não faria absolutamente nada para além de desiludir aqueles que me conhecem como “polêmico” (no bom sentido) em matéria argumentativa. Portanto longe da frustração. Penso até que tive sorte em não entrar nela. Para me preservar Deus não escreveu na minha sina que entraria nesse parlamento. Os que lá estão é que se sentem frustrados porque não existe debate que dignifique os deputados!
AS: Quer citar exemplos de deputados frustrados?
AP: Não é necessário apontar nomes. De uma maneira geral os deputados sejam do MPLA ou da oposição se encontram frustrados por não exercerem verdadeiramente o seu papel em prol dos interesses da Nação. Só não está frustrado quem acha que ser deputado é ter acesso as condições materiais e financeiras que essa condição confere, o que não seria seguramente o meu caso!
AS: Supondo que venha a candidatar-se a PR que prioridades traçaria?
AP: Bem ja não existem eleições presidenciais (risos). E também não me vejo vocacionado para administrar o Estado. Nunca fui a criança cujo sonho foi ser presidente da República. Nem o meu pai sonhou este posto para mim (risos). Mas é claro que estou habituado a pensar a gestão do Estado com a resposnabilidade que tenho de contribuir para a melhoria da nossa sociedade. Nessa base ja propus directrizes ao PR que estão publicados na imprensa e na internet...De qualquer modo, como mera hipótese de vir a ser Presidente eu priorizaria a iniciativaa privada e o fomento empresarial. É nesse ponto que o pais esta parado e a miiseria flui a pezar do famoso crescimento económico. E tudo começaria com a facilidade de acesso e registo imobiliario, do lançamento da bolsa de valores e liberalizaçao do mercado financeiro entre outras medidas. Nos últimos tempos não vejo problema maior do que esse. Isso significa libertar a sociedade de uma mamneira geral para o desenvolvimento pel ainiciativa privada. Isso resolveria mais de 70% doss males sociais como a pobreza, desemprego, etc. Mas também a saúde e a educação. O Estado voltaria para a realização de programas sociais e inversamente me esforçaria a fazer o Estado menos presente na economia privada, privatizando empresas públicas e criando condições para que todas as micro, pequenas, médias e grandes empresas cresçam de forma sustentável. É claro que essas linhas executivas não me fazem génio nenhum. É apenas o que o povo mais precisa e que os governantes não querem fazer...!
AS: Porque pensa que os governantes não querem?
AP: A pobreza e as dificuldades sociais e económicas são factores de manutenação do poder político, sabia? Enquanto não haver alternância política e a consequente capacitação institucional da justiça e das forças de ordem pública e de defesa nacional nunca se vai pensar de outra forma. Não importa o partido que assuma o poder. Ninguém vai ao poder com flexibilidade suficiente para o deixar. Os govrenantes tem bem presente essa cartilha...!
AS: E como garante que pode fazer diferente?
AP: Estamos a falar de um Albano Pedro presidentee da Republica apenas em termos hipotéticos não é? (risos). Mas sou de opinião que com o fim do mandato de JES os novos lideres já não vão apanhar o povo distraido. Não terão outra escolha senão executar políticas publicas viáveis...!
AS: Ainda na hipotese de ser Presidente da república que governantes manteria no poder ?
AP: De uma maneira geral todos os governantes acumularam experiências interessantes pelos infinitos anos que têm estado no poder porque JES habituou-nos a não “expulsar” ministros ou vice-ministros, governadores ou vice-governadores para rodá-los numa mera dança das cadeiras...É claro que o povo conhece aqueles que têm mostrado algum desempenho pela boa gestão pública. Logo, não seria díficil escolher os que fossem viaveis para a nova governação porque os melhores devem sempre governar. É a cultura da meritocracia que eu defenderia nesse caso e não de simpatias ou militâncias partidárias!
AS: E se o PR continuar o mesmo? Quais são so governantes que ele deve manter? E porquê?
AP: Se continuar? Não importa quais sejam os governantes...já sabemos que efectivamente JES não dá poderes a ninguém e por isso ninguém consegue ser autêntico na governação!
AS: Diga o que será do futuro político dos angolanos?
AP: Negro porque perigosamente imprevisível. Isto se não tivermos coragem de aproveitar o tempo presente e tomarmos as medidas mais sensatas para evitá-lo, já. Isso significa abandonarmos os nossos interesses e vantagens pessoais, as nossas simpatias partidárias e pensarmos somente a Nação estendendo o nosso altruismo patriótico aos concidadãos que se encontram em zonas inacessíveis e completamente abandonadas a sua sorte pela governação!
ALDA SOUSA: Aproximam-se as eleições de 2012 que colocará fim ao actual mandato legislativo. Que balanço faz?
ALBANO PEDRO: O mandato em curso é uma tentativa falhada dos angolanos de se reencontrarem atravéz de um verdadeiro relançamento da democracia, do diálogo franco e aberto entre as diversas forças políticas e sociais, da tolerância política e da aplicação dos mecanismos de transparência na governação. Fez-se alguma coisa no domínio da implementação de projectos públicos: a continuação das obras e de muitos outros projectos públicos. Mas, é claro que o povo, de uma maneira geral, ainda ressente das falhas de uma governação pouco atenta aos questões sociais com todos os problemas “endémicos” bem patentes como a falta de distribuição sustentada da água e da energia electrica bem como a fraca capacidade de produção existente ante a rápida espanção das cidades em todo o território nacional. Na verdade há ainda muita coisa em falta para que se fale em condições mínimas para um verdadeiro relançamento económico e social dos angolanos. Do ponto de vista político cometeram-se erros craços, um pouco fruto do desespero do actual titular do Executivo no controlo do poder: a alteração da Lei Constitucional favorecendo a reeleição do actual Presidente e a supressão das eleições presidenciais; a manipulação do processo eleitoral bem como a falta de consenso induzido para a aprovação do pacote legislativo eleitoral; a injustificável contenção e matrato dos activistas ligados as manifestações populares; a corrupção generalizada, o elevado índice de desemprego e a subida vertiginosa dos níveis de pobreza...São erros que hão de despoletar mais tarde ou mais cedo um ambiente de descontentamento generalizado de contornos imprevisíveis no seio do povo angolano. Portanto, o mandato de 2008 tem criado as condições para uma desarmonização política e social dos angolanos e para a insustentabilidade do mandato político após as eleições da 2012.
AS: Que mudanças significativas prevê com as próximas eleições?
AP: Mudanças significativas? Nenhumas. Haverão obviamente algumas mudanças induzidas pelo próprio percurso histórico. Mas a maioria deles serão mudanças negativas, para não dizer dramáticas. Prevejo por exemplo, que os partidos políticos com assento no parlamento terão os números de deputados reduzidos se se mantiverem nele, o MPLA poderá vir a ter uma maioria com números de assentos que venham a superar os actuais. Isso quer dizer que o povo vai abster-se de votar em massa por descrédito da política e vai favorecer a mobilização de militantes que o MPLA tem feito para o registo eleitoral. Por falta de motivação, muitos angolanos não terão o registo actualizado e não poderão votar enquanto que os que tiverem o registo actualizado poderão não ter à quem votar. Portanto, prevejo uma grande dificuldade na promoção da alternância política e uma vitória com maioria esmagadora do MPLA que vai atrapalhar a sua própria governação e vai precipitar a sua própria queda daí em diante. Por isso, o partido no poder também tem de estar preocupado com este quadro porque não vai favorecer a nada e nem a ninguém!
AS: É de lei que os partidos políticos que não concorreram em 2008 e não volteram a concorrer nas proximas eleições desaparecerão do cenário político. Como visualiza a participação política dos cidadãos?
AP: Embora estejamos diante de uma previsão normativa inconstitucional, o facto é que o mercado político-partidário vai registar a pior recessão de sempre com a verredura de mais de 80% das forças político-partidárias existentes. O desespero poderá sugerir muitas coligações partidárias mas o desastre é inevitável. De todo o modo, era de esperar um momento em que os partidos políticos fossem postos a prova ante a letargia em que a maioria se encontra. Era de esperar um verdadeiro saneamento político que promova um clima de maior participação de cidadãos honestos e interessados pelo bem comum na política despromovendo aqueles que fazem da política um palco de oportunidades pessoais para o auto-sustento e enriquecimento a custo do erário público.
AS: Angola é o país que mais cresce economicamente. Como explica o alto indice de pobreza que se vive e os grandes problemas com a saúde, educação...?
AP: A corrupção e a distribuição injusta das oportunidades e da riqueza estão na linha da frente para explicar a nossa desgraça. Mas atenção: os economistas dizem que crescimento não é desenvolvimento, o que não devo deixar de admitir não só por ignorar tais matérias como por ver nesta diferenciação uma verdade evidente. Crescer significa aumentar a produção de bens e serviços abrangendo progressivamente áreas sociais e económicas anteriormente não atingidas. Há países que já não crescem tanto, embora continuem a crescer como não podia deixar de ser, por ja terem níveis de vida muito aceitáveis. É o caso da África do Sul entre nós. Não é para fazer festas que se fala em crescimento. O crescimento em Angola é sinónimo de aumento da produção de um único produto: o petróleo. Não é para ficarmos sorridentes que nos passam essas informações por peritos internacionais. Por exemplo em termos de índices de bem-estar social e humano Angola está muito próxima da Guiné Bissau que se encontra entre os 10 países mais pobres do mundo. Do ponto de vista da economia a Etiopia é mais próxima porque não regista actividade económica significativa controlada pelo sector privado. Portanto estamos entre os países de África mais atrasados social e economicamente. Estamos muito longe de alcançar as economias da África do Sul, da Nigéria e do Kénia que estão entre as melhores de África. Mas lá se diz que em 2012 Angola vai bater o record mundial das economias que mais crescem!
AS: Como cidadão como participa das transformações sociais em Angola?
AP: Reflectindo e debatendo as grandes questões do Estado. Tenho o vício de discutir política em quase todos os ambientes sociais de tal maneira que sou capaz de estar numa festa com amigos a discutir questões públicas. Mas o que me garante participação nas grandes questões públicas é a escrita. Escrevo e torno público as minhas reflexões políticas. É dessa forma que me vejo a contribuir para as grandes questões do Estado.
AS: E como Político?
AP: Bem se quer dizer agente de partido político descarto a resposta a essa questão, com o devido respeito!
AS: Recentemente a RDC assistiu a reeleição do seu Presidente. Estabelece algum paralelo com nosso país?
AP: Penso que a experiência da RDC é um aviso a ter em conta porque esse país vizinho na verdade está há anos de distância para o futuro em relação a nossa realidade. Veja que a era de Mobutu desapareceu 32 anos depois e JES está precisamente há 32 anos no poder. A alternância foi violenta porque os congoleses não quiseram negociar a saida do ditador e hoje vivem as consequencias dessa falta com as irregularidades eleitorais que nunca promove uma verdadeira transição política e com uma governação igual ou pior do que a do ditador deposto. Os congolese até avançaram com uma coligação de cariz nacional, uma frente patriótica, que foi e tem sido liderada por Etienne Tshissekedi Wa Mulumba sem grandes êxitos. Nós os angolanos devemos ter essa lição em conta para não repeti-la na nossa realidade. Porque o que está hoje a acontecer na RDC é seguramente o que nos vai acontecer nas próximas décadas se não formos sensatos nas decisões a tomar hoje. Por isso defendo um plano de salvação nacional que nos habilite a todos a promover uma transição política não violenta!
AS: Qual acha ser o nível de satisfação do povo angolano com o actual mandato do partido no poder?
AP: Zero. É o nível de satisfação. O povo saiu da desilusão para o desespero...está a ver como sair das garras opressoras do regime e promover a sua própria libertação pela mudança do poder político. E como as lideranças políticas não ajudam, o povo mantem-se no silêncio de aparente ignorância da sua própria situação social e económica!
AS: Acha que as manifestações reflectem os índices de insatisfação do povo?
AP: Insatifação não. Desespero...As manifestações são alguns dos sintomas. Mas também temos as greves passivas. Os angolanos demonstram pouca vontade e empenho para o trabalho corporativo e institucional porque percebem que os seus esforços e capacidades não são nem valorizados nem recompensados e que os seus dirigentes não salvaguardam os seus interesses sobretudo diante dos estrangeiros que operam em Angola. Há neste momento a falta de aderência em massa para o registo eleitoral apesar dos programas de mobilização nesse sentido. Isso faz pairar no ar uma espécie de plano nacional para o boicote às eleições. Enfim, se ficarmos atentos veremos muitos sinais de completa insatisfação. Por isso podemos dizer que Angola é um autêntico barril de pólvora. Falta apenas um líder que saiba interpretar essa insatisfação e transformá-la em força política para tudo acontecer contra o actual regime no poder!
AS: Acha que essa situação favorece os partidos políticos na oposição?
AP: Claro que não. O cego não percebe nada do que se lhe apresenta pela frente. Os partidos políticos vivem uma espécie de cegueira provocada pela falta de interesse em promover uma alternância pelo povo e para o povo. A maioria dos partidos políticos fez-se cúmplice do regime recebendo envelopes as escondidas e enganando o povo com discursos verborreicos e impraticáveis. Não existe suficiente moral política na oposição para se tirarem proveitos as oportunidades que se manifestam. Há corruptos tanto na situação quanto na oposição que passam a vida a promover o caos e a impotência nas respectivas formações partidárias. O povo pede por uma liderânça iluminada e eloquente!
AS: Não adivinha qualquer possibilidade de surgirem novas forças políticas que apresentem um desempenho mais aceitável?
AP: Como procurei fazer entender até agora, o ambiente que se vive actualmente não favorece o surgimento de novos partidos políticos porque o povo já não acredita em partidos políticos. É claro que este desespero pode produzir surpresas incríveis. E nisto adivinho o surgimento de uma força coligacional de feição nacional. Uma frente patriótica que abranja as melhores inteligências políticas da oposição e os partidos que entenderem sobreviver aos próximos desafios políticos. Há sinais que evidenciam essa possibilidade. O clima político mostra que os militantes e simpatizantes do MPLA e da maioria dos partidos políticos na oposição estão a mergulhar no desespero por estarem a ser vítimas das mesmas atrocidades provocadas pela governação. Porque as demolições de casas, os maus pagamentos nas empresas e toda a sorte de problemas e dificuldades sociais e conómicas não escolhem o tipo de militante ou simpatizante. Só falta unirem-se em torno de uma liderânça visionária que queira estancar este estado de coisas. Insisto neste ponto!
AS: Acha que o MPLA pode voltar a vencer as eleições?
AP: A resposta afirmativa não levanta qualquer dúvida. O MPLA está a fazer tudo nesse sentido nem que importe fraudes evidentes. E também não há força política de oposição suficiente para contrapor essa caminhada impetuosa do partido no poder. O que se está a questionar em círculos mais sérios é o tipo de vitória e as respectivas consequências políticas para todos nós e para o próprio MPLA!
AS: Diz-se que a falta de maturidade política do povo angolano contribui para essa situação. Concorda?
AP: De maneira nenhuma! O povo angolano é muito mais maduro do que os operadores políticos julgam. Há vários sinais dessa maturidade. O problema é que os políticos é que são imaturos porque não percebem que o povo quer preservar a estabilidade social ao mesmo tempo que pretende alternância na governação (atenção: o povo não argumenta a alternância política pela via partidária). O povo esta a gerir um dilema: Quer mudança na governação mas não pensa muito seriamente na mudança de partidos políticos por falta de liderânças credíveis. É o que se percebe nos comentários e na fraca participação nas iniciativas dos partidos políticos da oposição!
AS: Lendo os seus artigos na imprensa vê-se que não tem qualquer afinidade político-partidária porque não favorece claramente nenhum partido político. Num país em que quase todos os intelectuais têm um partido político em que depositam esperança essa atitude parece estranha. Porquê desta postura?
AP: Criticar partidos não significa não gostar ou não estar ligado a qualquer deles. Aliás, decorre da obrigação de militantes sérios analizar com imparcialidade e verdade o desempenho de um partido político para que este tenha um melhor desempenho e se promova no seu seio a cultura pela democracia e transparência. Tenho para mim que esses são os verdadeiros militantes. Tudo o resto oportunistas que procuram agradar os chefes a troco de oportunidades individuais em prejuízo do partido em que militam. A actividade política é um sacerdócio. É para cidadãos sérios e comprometidos com causas públicas. Quem quer ganhar a vida que aprenda um ofício ou faça um negócio qualquer que não seja política!
AS: Está ligado a um partido político ou não?
AP: Interessa-me muito ver os problemas da nação numa perspectiva mais uniformizante e imparcial do que defender posições partidárias. A nossa geração (a que nasceu nos anos 70 e 80) está condenada a promover um ambiente em que os problemas da nação ganham cada vez mais espaço no debate político sob pena de não conquistar a confiança do povo. Porque o povo já percebeu que tem sido vítima de manipulação pelos interesses partidários que nunca são claros. A minha base crítica do exercício político em Angola vem do facto de ter assumido sempre uma postura de oposição em todos os ambientes sociais em que divisei injustiça e má repartição de oportunidades. Desde pequeno que não admito que os meus protegidos sejam alvos de maltratos, mesmo nos momentos em que não tive forças ou meios suficientes para me impor contra...!
AS: Mas pode dizer pelo menos em que partido se revê?
AP: A fase do voto vai definir isso. Mas gostaria muito que a extinta FpD ressurgida como BD (Bloco Democrático) ganhasse uma desenvoltura táctica que viesse a dar êxitos eleitorais porque tem a tradição de promover o discurso aberto e democratico para além de não ter alergias às boas intenções dos seus simpatizantes. É bom ter em conta que em termos de simpatia político-partidária o futuro se prevê negro para a maioria dos angolanos sérios!
AS: Acha que os partidos politicos são factores de desunião do povo?
AP: De certa forma sim. Quando os políticos manipulam a vontade do povo contra os interesses destes é obvio que constituem um factor de desunião. É o que se passa com as igrejas quando incitam os seus fiéis a protegerem-se contra fieis de outras denominações religisas. Assim não se está perante defesa dos interesses das massas militantes mas das lideranças partidárias. Por isso é que vemos promessas veementes em comícios para depois tudo ser contrário quando os lideres da oposição partem em busca de parceirias pouco claras com o regime que se pretende mudado na governação. O povo já percebeu que é daqui que nasce a falta de coerência dos lideres da oposição e da fraca capacidade política destes em relação ao partido no poder.
AS: Quando fala em Angolanos sérios o que leva em conta?
AP: Levo em conta todos aqueles que perdram ilusões sobre a seriedade do exercício político em prol dos interesses nacionais e que por isso não aderem ao fanatismo ou a militância cega contra os angolanos ligados a outros partidos políticos. Enfim...falo dos angolanos que já não defendem partidos políticos, mas a nação. Em Angola já temos muitas figuras públicas ou não que nos orgulham nesse sentido!
AS: Acredita que o actual Presidente da República reune condições para mais um mandato?
AP: Está a fazer campanha ou quê (risos).Bem, penso que JES é um factor de estabilidade e instabilidade politica simultaneamente. A sua governação exagerada no tempo condiciounou os angolanos a este ponto. Hoje estamos todos reféns de uma realidade muito débil em que por uma lado estamos sobre a necessidade de mudança subjectiva da governação e por outro lado estamos perante a necessidade de preservar o quadro de estabilidade política, ainda que aparente. Estamos presos pela incerteza de uma governação futura que não favoreça o clima de estabilidade política actual. E tudo porque a oposição não dá quaisquer sinais de credibilidade nesse sentido para que todos tenhamos esperanças por uma mudança segura na governação do Estado. O povo está simultaneamente cansado e aliviado com o actual presidente da República, infelizmente!
AS: Pode explicar-se melhor?
AP: Se JES sai do poder que líder alternativo é capaz de garantir a segurânça dos milhares de estrangeiros e interesses que actuam nos vários segmentos de mercado em Angola? Quem garante que os milhares de membros do seu elenco governativo não serão julgados incluindo ele mesmo? Quem garante que os acordos com os chineses e com os americanos serão mantidos e cumpridos? Quem garante que os militantes do MPLA não serão perseguidos a semelhança do que aconteceu com os militantes da UNITA logo após as eleições de 1992? Quem garante que os generais, os comissários de polícia e muitos dos dirigentes políticos ligados ao partido no poder não serão expulsos e muitos deles julgados por práticas desonestas acontecidas no passado? Esse é o dilema em que se encontra mergulhado o povo e até a própria comunidade internacional. O certo é que devemos deslindar soluções seguras sobre essa situação. Mas o povo está sem dúvidas receoso com uma mudança forçada embora comece a apostar desesperadamente para a alternância política!
AS: Está a vaticinar momentos de disturbios políticoss com a saída do actual Presidente da República?
AP: Mas isso é por demais evidente. A menos que não queiramos olhar para realidade que se impõe. A governação de JES alimentou muitas diferenças sociais e económicas entre os angolanos de uma maneira geral. Criou a corrupção e muitas práticas ilicitas e desonestas que ajudam muita gente a sobreviver incluindo muitos daqueles que se dizem ligados a partidos da oposição. Há também muitos criminosos escondidos nas asas protectoras do regime. A mudança pode ser mesmo um desastre!
AS: Como pensa ser a melhor saída de JES do poder?
AP: Defendo que a transição política em Angola deve ser negociada com a coragem de todos os bons cidadãos afim de serem preservados os interesses mais nobres da Nação. O que passa por um acordo consensual, entre todas as forças vivas da nação, que proteja a integridade física e patrimonial de JES e de muitos dos seus actuais colaboradores. É a plataforma mais sensata para os angolanos se não quizermos entrar numa alternância forçada e sangrenta, se possível. Penso que JES tem medo do futuro para si e para os seus descendentes e a manutenação do poder é a via mais segura para evitar a concretização desse medo. É preciso que os partidos políticos e a sociedade civil promovam um debate sério a volta de um plano de estabilidade política pós-eleitoral que garanta segurânça ao actual presidente da República. É um dos caminhos para uma altrnância política estável e até para a transparência no processo eleitoral. Aliás essa é a solução para a maioria dos governantes de Africa que se arrastam no poder durante o tempo mais do que necessário. É claro que os políticos não estão interessados em interesses nacionais e muito menos em promover um debate do género. Por isso estou céptico quanto as soluções viáveis com base na actual realidade em que vivemos!
AS: Vê alguma figura política com capacidade e imagem pública capaz de substituir o presidente da republica sem que tais disturbios possam acontecer?
AP: De um modo geral qualquer angolano está abstractamente capaz de substituir JES. O problema a ponderar é a capacidade de garantir a estabilidade política mantendo o clima de boa convivencia entre as várias sensibilidades políticas e sociais. E como já referi, há também muitos interesses para preservar que se tocados ou alterados sem as devidas compensações poderão levar o país num verdadeiro caos. E nisto não estão apenas interesses de angolanos ou nacionais..!
AS: Qual é o papel da comunidade interrnacional para a estabilidade política em Angola?
AP: Podemos dividir a comunidade internacional e determinar os actores que encenam no mercado político. Nesta senda os EUA me parecem os que mais influenciam a política angolana. Veja que quando os americanos decidiram não mais apoiar a UNITA e o seu líder, a morte deste aconteceu quase que repentinamente quando vinha resistindo durante anos numa guerra que ja não se esperava fim. Tudo aconteceu porque o MPLA deixou a cooperação russa para curvar-se as exigencias americanas. Hoje acredito que JES só mantem o poder porque tem feito muito bem o seu trabalho de casa que até procura estender aos países vizinhos e não só. Tudo na perspectiva de manter boas relações com os americanos em prol da manutenção do poder. Quanto a ONU para mim não passa de uma grande capa com a qual os americanos se cobrem para espantar os interesses anti-americanos pelo mundo. A OUA é um pequeno aprendiz de feiticeiro que procura ter alguma autoridade dificil de conquistar junto de uma comunidade internacional da qual depende em tudo. Uma pretensão dificil de concretizar. A UE deseperada com o clima económico desfavorável que vive pendura-se aos interesses americanos para estancar os avanços da China pela África. Acredito que enquanto o regime preservar os interesses desses actores da cena mundial a paz que vivemos terá a sua garantia. São factores exógenos que condicionam o poder político não só em Angola como no resto de África!
AS: Participou das últimas eleições como candidato a deputado. Está frustrado por não estar na Assembleia Nacional?
AP: Nessa AN com a hegemonia do MPLA que diluiu o debate parlamentar eu não faria absolutamente nada para além de desiludir aqueles que me conhecem como “polêmico” (no bom sentido) em matéria argumentativa. Portanto longe da frustração. Penso até que tive sorte em não entrar nela. Para me preservar Deus não escreveu na minha sina que entraria nesse parlamento. Os que lá estão é que se sentem frustrados porque não existe debate que dignifique os deputados!
AS: Quer citar exemplos de deputados frustrados?
AP: Não é necessário apontar nomes. De uma maneira geral os deputados sejam do MPLA ou da oposição se encontram frustrados por não exercerem verdadeiramente o seu papel em prol dos interesses da Nação. Só não está frustrado quem acha que ser deputado é ter acesso as condições materiais e financeiras que essa condição confere, o que não seria seguramente o meu caso!
AS: Supondo que venha a candidatar-se a PR que prioridades traçaria?
AP: Bem ja não existem eleições presidenciais (risos). E também não me vejo vocacionado para administrar o Estado. Nunca fui a criança cujo sonho foi ser presidente da República. Nem o meu pai sonhou este posto para mim (risos). Mas é claro que estou habituado a pensar a gestão do Estado com a resposnabilidade que tenho de contribuir para a melhoria da nossa sociedade. Nessa base ja propus directrizes ao PR que estão publicados na imprensa e na internet...De qualquer modo, como mera hipótese de vir a ser Presidente eu priorizaria a iniciativaa privada e o fomento empresarial. É nesse ponto que o pais esta parado e a miiseria flui a pezar do famoso crescimento económico. E tudo começaria com a facilidade de acesso e registo imobiliario, do lançamento da bolsa de valores e liberalizaçao do mercado financeiro entre outras medidas. Nos últimos tempos não vejo problema maior do que esse. Isso significa libertar a sociedade de uma mamneira geral para o desenvolvimento pel ainiciativa privada. Isso resolveria mais de 70% doss males sociais como a pobreza, desemprego, etc. Mas também a saúde e a educação. O Estado voltaria para a realização de programas sociais e inversamente me esforçaria a fazer o Estado menos presente na economia privada, privatizando empresas públicas e criando condições para que todas as micro, pequenas, médias e grandes empresas cresçam de forma sustentável. É claro que essas linhas executivas não me fazem génio nenhum. É apenas o que o povo mais precisa e que os governantes não querem fazer...!
AS: Porque pensa que os governantes não querem?
AP: A pobreza e as dificuldades sociais e económicas são factores de manutenação do poder político, sabia? Enquanto não haver alternância política e a consequente capacitação institucional da justiça e das forças de ordem pública e de defesa nacional nunca se vai pensar de outra forma. Não importa o partido que assuma o poder. Ninguém vai ao poder com flexibilidade suficiente para o deixar. Os govrenantes tem bem presente essa cartilha...!
AS: E como garante que pode fazer diferente?
AP: Estamos a falar de um Albano Pedro presidentee da Republica apenas em termos hipotéticos não é? (risos). Mas sou de opinião que com o fim do mandato de JES os novos lideres já não vão apanhar o povo distraido. Não terão outra escolha senão executar políticas publicas viáveis...!
AS: Ainda na hipotese de ser Presidente da república que governantes manteria no poder ?
AP: De uma maneira geral todos os governantes acumularam experiências interessantes pelos infinitos anos que têm estado no poder porque JES habituou-nos a não “expulsar” ministros ou vice-ministros, governadores ou vice-governadores para rodá-los numa mera dança das cadeiras...É claro que o povo conhece aqueles que têm mostrado algum desempenho pela boa gestão pública. Logo, não seria díficil escolher os que fossem viaveis para a nova governação porque os melhores devem sempre governar. É a cultura da meritocracia que eu defenderia nesse caso e não de simpatias ou militâncias partidárias!
AS: E se o PR continuar o mesmo? Quais são so governantes que ele deve manter? E porquê?
AP: Se continuar? Não importa quais sejam os governantes...já sabemos que efectivamente JES não dá poderes a ninguém e por isso ninguém consegue ser autêntico na governação!
AS: Diga o que será do futuro político dos angolanos?
AP: Negro porque perigosamente imprevisível. Isto se não tivermos coragem de aproveitar o tempo presente e tomarmos as medidas mais sensatas para evitá-lo, já. Isso significa abandonarmos os nossos interesses e vantagens pessoais, as nossas simpatias partidárias e pensarmos somente a Nação estendendo o nosso altruismo patriótico aos concidadãos que se encontram em zonas inacessíveis e completamente abandonadas a sua sorte pela governação!
sábado, 3 de dezembro de 2011
O DIA NACIONAL DO IDOSO
UM DEBATE NECESSÁRIO SOBRE A DESPROTECÇÃO LEGAL
ALBANO PEDRO
No pretérito dia 30 de Novembro comemorou-se o Dia Nacional do Idoso. A OMS (Organização Mundial da Saúde) classifica como idoso a pessoa que tenha mais de 65 anos de idade. É nesta fase que convencionalmente o homem entra na terceira idade. Nesta altura o homem ja terá prestado contas com a sua existência pelos feitos terrenos realizados com êxito ou sem ele. Apesar de tudo o tempo lhe outorga o galardão da longevidade transparecendo uma vida cuidada e prudente. Ironicamente é nessa fase em que a desprotecção social assalta o homem pela manifesta debilidade psico-física e improdutividade que começa a manifestar-se até aos últimos dias de vida.
A legislação angolana em nada abona a favor do idoso. Aliás não faz qualquer referência directa ao mesmo. Por exemplo o Código Penal protege a criança contra a morte, configurando um sansação muito especial destacada da morte criminosa comum aos homens (Crime de Infanticídio - art.º 356º - Código Penal - CP), não admite sequer abusos fisicos de natureza sexual (Corrupção de Menores – art.º 406º CP) e tão pouco admite que seja vítima de desamparo (Exposição ou Abandono de Infante – art.º 345º CP). Essa protecção começa mesmo desde a fase da gestação do menor (Crime de Aborto – art.º 358º CP). A legislação laboral não permite que os menores sejam explorados estabelecendo regimes muito especiais para a prestação do seu trabalho (281º e SS – Lei Geral do Trabalho). O Código da Família não permite quaisquer formas de desamparo para a criança. Quer quando se trate de criança sem pais (Adopção – art.º 197º e SS) quer quando tenha os pais (Exercício da Autoridade Paternal – art.º 134º e SS). A legislação civil vai ao ponto de estabelecer uma protecção geral ao menor com a consagração do instituto da incapacidade (art.º 123º Código Civil - CC) embora possa ser suprida (art.º 124.º CC).
Com toda a armação jurídico-legal estabelecida para os menores, os idosos passeiam toda a sua desprotecçãoo legal revelando um alarmante desamparo social quando se sabe que a maioria da população activa da sociedade entra nessa faixa etária tarde ou cedo. Só em poucos momentos normativos, a legislação angolana procura passar de forma rasante pela protecção do idoso. Fá-lo tão indirectamente que acaba abrangendo os não-idosos na sua previsão. Por um lado prevê a interdição (art.º 138º CC) enquanto incapacidade absoluta da pessoa que da lugar a que seja controlada por outra pessoa e os seus bens sejam igualmente administrados por outrem. Por outro lado prevê a inabilitação (art.º 152º CC) incapacidade relativa com o mesmo fim com a diferença desta ser dirigida a pessoas de forma provisória e aquela de forma permante. Contudo, ambas as condições legais se verificam em situações bem patentes e apenas acontecem se forem requeridas em tribunal, por pessoas legalmente interessadas, e o juiz pronunciar-se a favor mediante oportuna sentença judicial que estabelece igualmente a pessoa com idoneidade reconhecida para conduzir a administração dos bens da pessoa em causa. Fica claro que estas duas formas de protecção têm mais finalidade patrimonial do que pessoal. Ou seja, procuram acautelar a má gestão dos bens e interesses da pessoa a ela sujeita do que da própria pessoa. Logo nem o idoso aqui se vê amparado como tal.
A Sociologia do Direito pretende dois momentos imprudentes com a omissão de uma legislação sobre idosos. Na primeira perspectiva o idoso é visto como um adulto na plenitude dos seus direitos. Assim é que a Lei Constitucional prevê apenas a minoridade como fundamento da desobrigação dos deveres de cidadania, mesmo quando o estatuto de cidadania não seja claramente negado ao menor. Na segunda perspectiva o idoso é um individuo que apenas é descartado socialmente do ponto de vista laboral (Reforma Laboral) sendo reconhecido legalmente como um indivíduo de pleno direito e como tal no gozo da plenitude das suas faculdades psicológicas. Em resumo o sistema jurídico não prevê a debilidade e a improdutividade do homem quando entra na terceira idade. Pelo que lhe descarta os direitos próprios da sua condição nessa fase etária.
O mérito de muitas outras ciências e sistemas de conhecimento é o reconhecimento de um estatuto especial ao idoso. Onde a Medicina através da Gerontologia se destaca ao ponto de subsidiar a Psicologia com a Psicogerontologia. Os sistemas jurídicos devem render-se a essas conquistas e conferir ao idoso um papel especial destinando-lhe uma pauta de direitos quue caracterizem a sua condição psico-biológica. Devido a sua desprotecção legal valem certos subsídios para uma verdadeira pauta de direitos para os idosos. Desde já, do ponto de vista da saúde (a degradação do estado da saúde é a mais sensivel evidência dessa faixa etária), o Estado deve assegurar a saúde gratuita ao idoso, sobretudo pela criação de condições para a saúde preventiva a semelhança das crianças. A educação (variante da alfabetização) deve ser garantida para todos os idosos em nome do direito a informação eventualmente negado na fase socialmente activa do indivíduo. Tanto para os idosos recolhidos em estabelecimentos vocacionais quanto para aqueles que estejam sob a guarda de parentes ou terceiros de boa-fé. O transporte público gratuito deve estender-se igualmente como direito ao idoso. Em espaços sociais os idosos devem merecer lugares especiais (parques de laser e recreação) pela instalação de meios de suporte a locomoçãoo e segurança individual apropriados. Óculos , calçados e outros meios e instrumentos especiais para idosos podem ser subsidiados pelo Estado e distribuidos através dos serviços de saúde pública. Em fase de ameaças endémica os idosos tais como as crianças devem estar abrangidos pelas campanhas de vacinação quando sejam recomendadas. As condições de sustento devem ser garantidas através de um subsidio de velhice seja para quem tenha trabalhado ou não, independentemeente de outros direitos adquiridos (como pensões de reforma e outros). Se por um lado envelhecer é um prémio da natureza por outro lado o homem entra numa fase de completa dependência e daí nascem toda a sorte de humilhação e maus tratos que apenas pessoas dependentes experimentam. O subsidio de velhice teria a virtude de forçar os descendentes a manterem os idosos no convivio familiar com a imagem dignificada de pessoas geradoras de rendimentos e como tais úteis para as familias em que integram para não serem vistos como encargos, o que dá origem a traumas e consequentes comportamentos deprimentes. Não custaria nada ao Estado porque a população de idosos de tão reeduzida em quantidade não é igual a estrondosa população de desempregados em fase activa. O subsidio de velhice teria ainda o mérito de conferir a liberdade ao próprio idoso de escolher entre estar com os seus parentes ou num estabelecimento vocacional.
A reflexão pode estender-se o sistema criminal onde o idoso deve ter a pena, seja quaal a natureza do crime, reduzida na proporçaõ da sua expectativa de vida tendo em conta a condição psico-biologica. Vindo esta condição a converter-se numa circunstância atenuante para as sanções criminais. Pois que, o tempo curto de vida no horizonte não justifica a natureza reabilitadora ou socialmente reintegradora da pena que se lhe aplica. A agressão física contra o idoso bem como a maioria dos crimes violentos de que esteja sujeito podem ter as penas correspondentes agravadas no Código Penal para desencorajar a criminalidade contra as pessoas dessa faixa etária e garantir maior protecção social e segurânça ao idoso. Enfim, miríade de soluções políticas e sociais podem ser adaptadas normativamente para atender a essa faixa etária completamente abandonda pela sociedade. E todo o esforço deve justificar-se no facto de que a protecção legal e social do idoso deve ser vista como uma questão de estabilidade política. Afinal é a incerteza da fase da velhice que sustenta em parte a maioria dos vícios e desvios sociais atentadores ao património público, tais como o desvio de bens e a corrupção generalizada. A incerteza do futuro dos cidadão é ainda responsável pela falta de sensibilidade pela mudança de cargos e pela sucessão nas funções dos órgãos, serviços e instituições públicas e do Estado. A questão da estabilidade política fica mais evidentes quando se percebe que o idoso é um peso (custo) para a sociedade. Finalmente, as autoridades políticas em especial e o Executivo através do Ministério da Família e Promoção da Mulher em especial devem prestar uma atenção muito especial a condição legal e social do idoso.Dixit
ALBANO PEDRO
No pretérito dia 30 de Novembro comemorou-se o Dia Nacional do Idoso. A OMS (Organização Mundial da Saúde) classifica como idoso a pessoa que tenha mais de 65 anos de idade. É nesta fase que convencionalmente o homem entra na terceira idade. Nesta altura o homem ja terá prestado contas com a sua existência pelos feitos terrenos realizados com êxito ou sem ele. Apesar de tudo o tempo lhe outorga o galardão da longevidade transparecendo uma vida cuidada e prudente. Ironicamente é nessa fase em que a desprotecção social assalta o homem pela manifesta debilidade psico-física e improdutividade que começa a manifestar-se até aos últimos dias de vida.
A legislação angolana em nada abona a favor do idoso. Aliás não faz qualquer referência directa ao mesmo. Por exemplo o Código Penal protege a criança contra a morte, configurando um sansação muito especial destacada da morte criminosa comum aos homens (Crime de Infanticídio - art.º 356º - Código Penal - CP), não admite sequer abusos fisicos de natureza sexual (Corrupção de Menores – art.º 406º CP) e tão pouco admite que seja vítima de desamparo (Exposição ou Abandono de Infante – art.º 345º CP). Essa protecção começa mesmo desde a fase da gestação do menor (Crime de Aborto – art.º 358º CP). A legislação laboral não permite que os menores sejam explorados estabelecendo regimes muito especiais para a prestação do seu trabalho (281º e SS – Lei Geral do Trabalho). O Código da Família não permite quaisquer formas de desamparo para a criança. Quer quando se trate de criança sem pais (Adopção – art.º 197º e SS) quer quando tenha os pais (Exercício da Autoridade Paternal – art.º 134º e SS). A legislação civil vai ao ponto de estabelecer uma protecção geral ao menor com a consagração do instituto da incapacidade (art.º 123º Código Civil - CC) embora possa ser suprida (art.º 124.º CC).
Com toda a armação jurídico-legal estabelecida para os menores, os idosos passeiam toda a sua desprotecçãoo legal revelando um alarmante desamparo social quando se sabe que a maioria da população activa da sociedade entra nessa faixa etária tarde ou cedo. Só em poucos momentos normativos, a legislação angolana procura passar de forma rasante pela protecção do idoso. Fá-lo tão indirectamente que acaba abrangendo os não-idosos na sua previsão. Por um lado prevê a interdição (art.º 138º CC) enquanto incapacidade absoluta da pessoa que da lugar a que seja controlada por outra pessoa e os seus bens sejam igualmente administrados por outrem. Por outro lado prevê a inabilitação (art.º 152º CC) incapacidade relativa com o mesmo fim com a diferença desta ser dirigida a pessoas de forma provisória e aquela de forma permante. Contudo, ambas as condições legais se verificam em situações bem patentes e apenas acontecem se forem requeridas em tribunal, por pessoas legalmente interessadas, e o juiz pronunciar-se a favor mediante oportuna sentença judicial que estabelece igualmente a pessoa com idoneidade reconhecida para conduzir a administração dos bens da pessoa em causa. Fica claro que estas duas formas de protecção têm mais finalidade patrimonial do que pessoal. Ou seja, procuram acautelar a má gestão dos bens e interesses da pessoa a ela sujeita do que da própria pessoa. Logo nem o idoso aqui se vê amparado como tal.
A Sociologia do Direito pretende dois momentos imprudentes com a omissão de uma legislação sobre idosos. Na primeira perspectiva o idoso é visto como um adulto na plenitude dos seus direitos. Assim é que a Lei Constitucional prevê apenas a minoridade como fundamento da desobrigação dos deveres de cidadania, mesmo quando o estatuto de cidadania não seja claramente negado ao menor. Na segunda perspectiva o idoso é um individuo que apenas é descartado socialmente do ponto de vista laboral (Reforma Laboral) sendo reconhecido legalmente como um indivíduo de pleno direito e como tal no gozo da plenitude das suas faculdades psicológicas. Em resumo o sistema jurídico não prevê a debilidade e a improdutividade do homem quando entra na terceira idade. Pelo que lhe descarta os direitos próprios da sua condição nessa fase etária.
O mérito de muitas outras ciências e sistemas de conhecimento é o reconhecimento de um estatuto especial ao idoso. Onde a Medicina através da Gerontologia se destaca ao ponto de subsidiar a Psicologia com a Psicogerontologia. Os sistemas jurídicos devem render-se a essas conquistas e conferir ao idoso um papel especial destinando-lhe uma pauta de direitos quue caracterizem a sua condição psico-biológica. Devido a sua desprotecção legal valem certos subsídios para uma verdadeira pauta de direitos para os idosos. Desde já, do ponto de vista da saúde (a degradação do estado da saúde é a mais sensivel evidência dessa faixa etária), o Estado deve assegurar a saúde gratuita ao idoso, sobretudo pela criação de condições para a saúde preventiva a semelhança das crianças. A educação (variante da alfabetização) deve ser garantida para todos os idosos em nome do direito a informação eventualmente negado na fase socialmente activa do indivíduo. Tanto para os idosos recolhidos em estabelecimentos vocacionais quanto para aqueles que estejam sob a guarda de parentes ou terceiros de boa-fé. O transporte público gratuito deve estender-se igualmente como direito ao idoso. Em espaços sociais os idosos devem merecer lugares especiais (parques de laser e recreação) pela instalação de meios de suporte a locomoçãoo e segurança individual apropriados. Óculos , calçados e outros meios e instrumentos especiais para idosos podem ser subsidiados pelo Estado e distribuidos através dos serviços de saúde pública. Em fase de ameaças endémica os idosos tais como as crianças devem estar abrangidos pelas campanhas de vacinação quando sejam recomendadas. As condições de sustento devem ser garantidas através de um subsidio de velhice seja para quem tenha trabalhado ou não, independentemeente de outros direitos adquiridos (como pensões de reforma e outros). Se por um lado envelhecer é um prémio da natureza por outro lado o homem entra numa fase de completa dependência e daí nascem toda a sorte de humilhação e maus tratos que apenas pessoas dependentes experimentam. O subsidio de velhice teria a virtude de forçar os descendentes a manterem os idosos no convivio familiar com a imagem dignificada de pessoas geradoras de rendimentos e como tais úteis para as familias em que integram para não serem vistos como encargos, o que dá origem a traumas e consequentes comportamentos deprimentes. Não custaria nada ao Estado porque a população de idosos de tão reeduzida em quantidade não é igual a estrondosa população de desempregados em fase activa. O subsidio de velhice teria ainda o mérito de conferir a liberdade ao próprio idoso de escolher entre estar com os seus parentes ou num estabelecimento vocacional.
A reflexão pode estender-se o sistema criminal onde o idoso deve ter a pena, seja quaal a natureza do crime, reduzida na proporçaõ da sua expectativa de vida tendo em conta a condição psico-biologica. Vindo esta condição a converter-se numa circunstância atenuante para as sanções criminais. Pois que, o tempo curto de vida no horizonte não justifica a natureza reabilitadora ou socialmente reintegradora da pena que se lhe aplica. A agressão física contra o idoso bem como a maioria dos crimes violentos de que esteja sujeito podem ter as penas correspondentes agravadas no Código Penal para desencorajar a criminalidade contra as pessoas dessa faixa etária e garantir maior protecção social e segurânça ao idoso. Enfim, miríade de soluções políticas e sociais podem ser adaptadas normativamente para atender a essa faixa etária completamente abandonda pela sociedade. E todo o esforço deve justificar-se no facto de que a protecção legal e social do idoso deve ser vista como uma questão de estabilidade política. Afinal é a incerteza da fase da velhice que sustenta em parte a maioria dos vícios e desvios sociais atentadores ao património público, tais como o desvio de bens e a corrupção generalizada. A incerteza do futuro dos cidadão é ainda responsável pela falta de sensibilidade pela mudança de cargos e pela sucessão nas funções dos órgãos, serviços e instituições públicas e do Estado. A questão da estabilidade política fica mais evidentes quando se percebe que o idoso é um peso (custo) para a sociedade. Finalmente, as autoridades políticas em especial e o Executivo através do Ministério da Família e Promoção da Mulher em especial devem prestar uma atenção muito especial a condição legal e social do idoso.Dixit
sábado, 26 de novembro de 2011
PROTOCOLO DE COOPERAÇÃO ENTRE A OAA E A OAP
ALBANO PEDRO
Entrevista concedida ao Semanário Angolense a propósito do Protocolo de Cooperação assinado entre a Ordem dos Advogados de Angola (OAA) e a Ordem dos Advogados de Portugal (OAP), publicada na edição n.º 443 de 26 de Novembro de 2011.
SEMANÁRIO ANGOLENSE: Que leitura faz ao Protocolo recentemente assinado entre a Ordem dos Advogados Angolanos (OAA) e a Ordem dos Advogados Portugueses (OAP) em Lisboa?
ALBANO PEDRO: Percebe-se que no essencial, o protocolo versa sobre duas variantes de cooperação. A da formação dos advogados e a do exercício da advocacia. É oportuno, no que toca a formação dos advogados e no que toca ao exercício da advocacia nos dois países parece inoportuno para a parte angolana nos termos em que o protocolo foi celebrado.
SA: Acha que os interesses angolanos foram devidamente acomodados, ao abrigo desse entendimento?
AP: Na variante da formação quase nada há a comentar em seu desabono. Temos que reconhecer que a centenária experiência forense dos portugueses, para além da herança jurídica e judicial a que nos candidatamos com a colonização deste país ibérico, são elementos de grande valia para a elevação do nível técnico e profissional dos advogado angolanos. Temos défices consideráveis no dominio dos contratos – porque a preparação dos advogados angolanos é acentuadamente orientada para os conflitos judiciais – que esta cooperação vai, certamente, ajudar a resolver. Da mesma forma que as ligeiras diferenças normativas, fundamentalmente baseadas no atraso historico-positivo de Angola, servem de pretexto para actualização de conhecimentos aos advogados portugueses com pretensões de explorar o mercado jurídico angolano. Contudo, na variante do exercício da advocacia está claro que os interesses dos portugueses ganham destaque em termos de promoção e protecção. Há muito, os advogados portugueses veêm explorando, em matéria de consultoria, o mercado angolano sem quaisquer coberturas legais. O presente protocolo facilita o processo de “invasão” técnica dos portugueses nesse sentido. Até porque os advogados angolanos, merce da fraca qualidade técnica, sobretudo no domínio da interpretação e aplicação de claúsulas contratuais, se apresentam menos capazes de exercerem a advocacia em território português. É claro que o volume da demanda judicial dos cidadãos e a complexidade contratual de países como portugal de relações sociais de grande incidência privada (mercado empresarial e económico essencialmente privado em que abundam actos particulares potenciadores de conflitos judiciais ou extrajudiciais) por si só, afastam, pela livre concorrência, a simplicidade técnica dos advogados angolanos fundamentalemente orientada para o conflito forense num país em que os actos praticados por entidades públicas demonstram a hegemonia do sector público em relação ao sector privado da economia. Há também que ter em conta que a soberania de Angola fica de alguma forma ameaçada com a possibilidade dos advogados portugueses influenciarem a jurisprudencia e até a reforma das leis pela apresentação de soluções mais evoluidas assentes no Direito positivo português. Ou seja, acontecerá que advogados portugueses em foro angolano influenciarão as soluções juridicas ao ponto de o sistema jurídico caminhar mais para o sistema de interesses portugueses. Já que Portugal se apresenta mais evoluido em matéria de soluções juridicas que Angola. Devemos ainda considerar que a territorialidade das leis é um elemento condicionador do exercicio da advocacia. Isso significa que os advogados dos dois paises devem ter excelentes conhecimentos técnico-legais dos dois países para um exercício harmonizado como o sistema juridico do local do foro. Podemos concluir que o perigo da influência directa do sistema juridico-legal português sobre o sistema angolano , pelo exercicio da advocacia, é uma clara ameaça aos interesses dos angolanos. Não existe eventualmente qualquer preocupação no sentido contrário (de portugueses para angolanos) porque ninguém certamente se preocupará com soluções atrasadas no tempo.
SA: Embora seja um documento que carece ainda de aprovação por parte da AG da OAA, acredita que o documento venha a vingar?
AP: Se vingar que seja com alterações consideráveis que venham a acautelar os interesses angolanos a partir das obserrvações que tecemos e de outras que venham a inquietar a classe dos advogados e a sociedade em geral. Em minha opinião, a questão do exercício da advocacia pode ser de aplicação diferida no tempo. Ou seja, a AG da OAA pode decidir que aplicação do protocolo nesse capítulo aconteça apenas observados alguns elementos que preservem os interesses angolanos. Para além de que outras soluções na aplicação dessa parte do protocolo podem ser chamadas ao debate. Por exemplo, pode-se convencionar que apenas os advogados estrangeiros residentes no país durante certo lapso de tempo podem exercer advocacia a semelhança das condições que se colocam para a concessão do estatuto de cidadão estrangeiro residente.
SA: Corresponde à verdade as informações segundo as quais alguns advogados lusos têm estado a exercer «discricionariamente» esta actividade em Angola, sem estarem inscritos na OAA?
AP: Bem, sobre esta questão há que diferenciar o exercicio da consultoria jurídica e o da advocacia. A consultoria é uma actividade essencialmente extra-forense (que se exerce privilegiadamente fora dos tribunais) e compreende uma multiplicidade de actividades circunscritas em três grupos essenciais, quais sejam o aconselhamento, a auditoria e o treinamento (capacitação ou formação). E porque assenta fundamentalmente na competência e experiência técnica, o exercício da consultoria não recomenda limites territoriais como acontece com a advocacia, propriamente dita. Sobretudo em países com marcados atrasos técnicos e tecnológicos como Angola. Temos muitos consultores portugueses em Angola até mesmo a exercerem consultoria forense (assistência de advogados angolanos para questões de litígios em tribunais) e como é óbvio, o nosso sistema jurídico não é impeditivo quanto a isso. Mas, a execução do mandato forense como tal, enquanto acto próprio de advocacia, é ainda um privilégio para quem esteja inscrito na OAA e por isso não se regista claramente essa situação em Angola. Até porque os tribunais estão em condições de averiguar essas situações, nomeadamente quando exigem o número de inscrição na AA ou as respectivas cédulas aos mandatários judiciais para a prova de idónea representação em litigios judiciais.
SA: Em seu entender, os advogados angolanos têm merecido em Portugal o mesmo tratamento que os seus congéneres em Angola…
AP: Pensamos que o quadro é recíproco no que tange ao exercicio da advocacia. Mas no que toca a consultoria jurídica os portiugueses têm mais oportunidades que os angolanos. Isto está mais do que claro. Até porque vivemos o “modismo” das consultorias estrangeiras para tudo em Angola.
SA: Que leitura faz ao pronunciamento do antigo bastonário da OAA, Raul Araújo, segundo o qual uma suposta invasão de advogados portugueses não lhe tirava o sono…
AP: As inqueitações que o Doutor Raul Araújo levantou com estes argumentos correspondem com os receios que apontamos sobre a aplicação desse protocolo e que podem ser vistos na grande capacidade técnica dos portugueses assente no estádio de desenvolvimento do seu sistema jurídico em relação ao nosso sistema jurídico, na formação técnica deficitária e estática dos angolanos e nos níveis crescentes de exigência técnica do mercado angolano. É mais do que evidente a hegemonia dos portugueses sobre os angolanos. É tudo para tirar sono, não é? (risos).
SA: O apelo que ele fez no sentido das empresas angolanas com interesses na economia portuguesa a apostarem mais nos causídicos nacionais colhe?
AP: Pensamos que não. A realidade juridico-legal portiuguesa é mais complexa e multiforme do que a realidade jurídico-legal angolana. O que exige capacidades técnicas muito aprimoradas e consentâneas com o seu grau de desenvolvimento normativo e contratual. Por razões de economia técnica é sempre conveniente que as empresas procedam ao recrutamento de consultores ou advogados locais. Contudo, admito ser viável que os advogados angolanos com experiência técnica portuguesa sejam privilegiados. Uma vez que a territorialidade das leis impõe que apenas aqueles que conheçam as duas realidades jurídicas (angolana e portuguesa) estão em melhores condições de corresponderem as espectatitivas técnicas e a demanda profissional das empresas em particular e do mercado em geral.
SA: Em seu entender, haverá uma tentativa encoberta de proteger os interesses lusos em Angola, por parte de alguns lobbies económicos e políticos?
AP: Pensamos que existe uma grande preocupação em regularizar a actividade dos portugueses que começam a se tornar imprescindiveis no asseguramento de certos interesses económicos em Angola. Só assim, se explica a aplicação de um protocolo que na parte do exercício da advocacia apenas confere oportunidades aos portugueses, a despeito da ameaça a soberania que apontamos como inquietação evidente.
Entrevista concedida ao Semanário Angolense a propósito do Protocolo de Cooperação assinado entre a Ordem dos Advogados de Angola (OAA) e a Ordem dos Advogados de Portugal (OAP), publicada na edição n.º 443 de 26 de Novembro de 2011.
SEMANÁRIO ANGOLENSE: Que leitura faz ao Protocolo recentemente assinado entre a Ordem dos Advogados Angolanos (OAA) e a Ordem dos Advogados Portugueses (OAP) em Lisboa?
ALBANO PEDRO: Percebe-se que no essencial, o protocolo versa sobre duas variantes de cooperação. A da formação dos advogados e a do exercício da advocacia. É oportuno, no que toca a formação dos advogados e no que toca ao exercício da advocacia nos dois países parece inoportuno para a parte angolana nos termos em que o protocolo foi celebrado.
SA: Acha que os interesses angolanos foram devidamente acomodados, ao abrigo desse entendimento?
AP: Na variante da formação quase nada há a comentar em seu desabono. Temos que reconhecer que a centenária experiência forense dos portugueses, para além da herança jurídica e judicial a que nos candidatamos com a colonização deste país ibérico, são elementos de grande valia para a elevação do nível técnico e profissional dos advogado angolanos. Temos défices consideráveis no dominio dos contratos – porque a preparação dos advogados angolanos é acentuadamente orientada para os conflitos judiciais – que esta cooperação vai, certamente, ajudar a resolver. Da mesma forma que as ligeiras diferenças normativas, fundamentalmente baseadas no atraso historico-positivo de Angola, servem de pretexto para actualização de conhecimentos aos advogados portugueses com pretensões de explorar o mercado jurídico angolano. Contudo, na variante do exercício da advocacia está claro que os interesses dos portugueses ganham destaque em termos de promoção e protecção. Há muito, os advogados portugueses veêm explorando, em matéria de consultoria, o mercado angolano sem quaisquer coberturas legais. O presente protocolo facilita o processo de “invasão” técnica dos portugueses nesse sentido. Até porque os advogados angolanos, merce da fraca qualidade técnica, sobretudo no domínio da interpretação e aplicação de claúsulas contratuais, se apresentam menos capazes de exercerem a advocacia em território português. É claro que o volume da demanda judicial dos cidadãos e a complexidade contratual de países como portugal de relações sociais de grande incidência privada (mercado empresarial e económico essencialmente privado em que abundam actos particulares potenciadores de conflitos judiciais ou extrajudiciais) por si só, afastam, pela livre concorrência, a simplicidade técnica dos advogados angolanos fundamentalemente orientada para o conflito forense num país em que os actos praticados por entidades públicas demonstram a hegemonia do sector público em relação ao sector privado da economia. Há também que ter em conta que a soberania de Angola fica de alguma forma ameaçada com a possibilidade dos advogados portugueses influenciarem a jurisprudencia e até a reforma das leis pela apresentação de soluções mais evoluidas assentes no Direito positivo português. Ou seja, acontecerá que advogados portugueses em foro angolano influenciarão as soluções juridicas ao ponto de o sistema jurídico caminhar mais para o sistema de interesses portugueses. Já que Portugal se apresenta mais evoluido em matéria de soluções juridicas que Angola. Devemos ainda considerar que a territorialidade das leis é um elemento condicionador do exercicio da advocacia. Isso significa que os advogados dos dois paises devem ter excelentes conhecimentos técnico-legais dos dois países para um exercício harmonizado como o sistema juridico do local do foro. Podemos concluir que o perigo da influência directa do sistema juridico-legal português sobre o sistema angolano , pelo exercicio da advocacia, é uma clara ameaça aos interesses dos angolanos. Não existe eventualmente qualquer preocupação no sentido contrário (de portugueses para angolanos) porque ninguém certamente se preocupará com soluções atrasadas no tempo.
SA: Embora seja um documento que carece ainda de aprovação por parte da AG da OAA, acredita que o documento venha a vingar?
AP: Se vingar que seja com alterações consideráveis que venham a acautelar os interesses angolanos a partir das obserrvações que tecemos e de outras que venham a inquietar a classe dos advogados e a sociedade em geral. Em minha opinião, a questão do exercício da advocacia pode ser de aplicação diferida no tempo. Ou seja, a AG da OAA pode decidir que aplicação do protocolo nesse capítulo aconteça apenas observados alguns elementos que preservem os interesses angolanos. Para além de que outras soluções na aplicação dessa parte do protocolo podem ser chamadas ao debate. Por exemplo, pode-se convencionar que apenas os advogados estrangeiros residentes no país durante certo lapso de tempo podem exercer advocacia a semelhança das condições que se colocam para a concessão do estatuto de cidadão estrangeiro residente.
SA: Corresponde à verdade as informações segundo as quais alguns advogados lusos têm estado a exercer «discricionariamente» esta actividade em Angola, sem estarem inscritos na OAA?
AP: Bem, sobre esta questão há que diferenciar o exercicio da consultoria jurídica e o da advocacia. A consultoria é uma actividade essencialmente extra-forense (que se exerce privilegiadamente fora dos tribunais) e compreende uma multiplicidade de actividades circunscritas em três grupos essenciais, quais sejam o aconselhamento, a auditoria e o treinamento (capacitação ou formação). E porque assenta fundamentalmente na competência e experiência técnica, o exercício da consultoria não recomenda limites territoriais como acontece com a advocacia, propriamente dita. Sobretudo em países com marcados atrasos técnicos e tecnológicos como Angola. Temos muitos consultores portugueses em Angola até mesmo a exercerem consultoria forense (assistência de advogados angolanos para questões de litígios em tribunais) e como é óbvio, o nosso sistema jurídico não é impeditivo quanto a isso. Mas, a execução do mandato forense como tal, enquanto acto próprio de advocacia, é ainda um privilégio para quem esteja inscrito na OAA e por isso não se regista claramente essa situação em Angola. Até porque os tribunais estão em condições de averiguar essas situações, nomeadamente quando exigem o número de inscrição na AA ou as respectivas cédulas aos mandatários judiciais para a prova de idónea representação em litigios judiciais.
SA: Em seu entender, os advogados angolanos têm merecido em Portugal o mesmo tratamento que os seus congéneres em Angola…
AP: Pensamos que o quadro é recíproco no que tange ao exercicio da advocacia. Mas no que toca a consultoria jurídica os portiugueses têm mais oportunidades que os angolanos. Isto está mais do que claro. Até porque vivemos o “modismo” das consultorias estrangeiras para tudo em Angola.
SA: Que leitura faz ao pronunciamento do antigo bastonário da OAA, Raul Araújo, segundo o qual uma suposta invasão de advogados portugueses não lhe tirava o sono…
AP: As inqueitações que o Doutor Raul Araújo levantou com estes argumentos correspondem com os receios que apontamos sobre a aplicação desse protocolo e que podem ser vistos na grande capacidade técnica dos portugueses assente no estádio de desenvolvimento do seu sistema jurídico em relação ao nosso sistema jurídico, na formação técnica deficitária e estática dos angolanos e nos níveis crescentes de exigência técnica do mercado angolano. É mais do que evidente a hegemonia dos portugueses sobre os angolanos. É tudo para tirar sono, não é? (risos).
SA: O apelo que ele fez no sentido das empresas angolanas com interesses na economia portuguesa a apostarem mais nos causídicos nacionais colhe?
AP: Pensamos que não. A realidade juridico-legal portiuguesa é mais complexa e multiforme do que a realidade jurídico-legal angolana. O que exige capacidades técnicas muito aprimoradas e consentâneas com o seu grau de desenvolvimento normativo e contratual. Por razões de economia técnica é sempre conveniente que as empresas procedam ao recrutamento de consultores ou advogados locais. Contudo, admito ser viável que os advogados angolanos com experiência técnica portuguesa sejam privilegiados. Uma vez que a territorialidade das leis impõe que apenas aqueles que conheçam as duas realidades jurídicas (angolana e portuguesa) estão em melhores condições de corresponderem as espectatitivas técnicas e a demanda profissional das empresas em particular e do mercado em geral.
SA: Em seu entender, haverá uma tentativa encoberta de proteger os interesses lusos em Angola, por parte de alguns lobbies económicos e políticos?
AP: Pensamos que existe uma grande preocupação em regularizar a actividade dos portugueses que começam a se tornar imprescindiveis no asseguramento de certos interesses económicos em Angola. Só assim, se explica a aplicação de um protocolo que na parte do exercício da advocacia apenas confere oportunidades aos portugueses, a despeito da ameaça a soberania que apontamos como inquietação evidente.