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    sábado, 15 de janeiro de 2011

    DA INDEPENDÊNCIA DO PODER JUDICIAL NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE ANGOLA

    UMA ANÁLISE SUMÁRIA SOBRE OS SUBSÍDIOS DE ANTÓNIO JOSÉ VENTURA

    (Texto reservado para o Bissemanário folha 8)
    ´

    Albano Pedro


    António José Ventura, jurista angolano da nova vaga, bem conhecido nas lides do activismo dos direitos humanos, que humildemente se apresenta como estagiário em quase tudo o que diz respeito ao exercício do Direito (docência universitária, advocacia), oferece-nos a sua primeira obra técnico-jurídica numa tentativa “estagiária” de se apresentar entre os fazedores de opinião jurídica. Mas, com esta obra António José Ventura não é o estagiário que pretende ser por duas interessantes razões: a primeira, por abordar matérias com as quais lida no campo profissional e ocupacional há anos, tendo contribuído significativamente para a promoção da justiça, e do sistema inerente, em Angola através da AJPD (Associação Justiça, Paz e Democracia) ao lado de colegas com reconhecida experiência no domínio como Fernando Macedo e Pedro Romão; a segunda, porque a idoneidade técnica da obra com que pretende “estagiar” no domínio da literatura jurídica foi testada e aprovada por uma das maiores e melhores editoras de literatura jurídica da lusofonia que é a Almedina, sendo neste particular uma prova de ter passado a fase de simples estagiário.

    Na verdade, a competência técnica que procura impor com o seu humilde “estágio” técnico-jurídico há muito foi provada pelos cidadãos, sobretudo angolanos, que fartas vezes o escutaram e continuam a escutar, com destaque na Rádio Ecclésia, a advogar o respeito pelos direitos humanos na vertente da realização da justiça e desenvolvimento do seu sistema, oferecendo todo o sentido utilitário dos instrumentos jurídicos positivados em Angola. Aliás, a nota prefácica de Fernando Macedo é neste sentido propositadamente eloquente: «(…) Formado em Angola, mas honesto e intelectual cidadão do mundo, o Dr. António Ventura convoca a universalidade da teoria e doutrina do Constitucionalismo Liberal Democrático Moderno, convoca o pensamento de angolanos em sintonia com o pensamento universal, sem complexos de inferioridade ou superioridade, e inscreve o debate sobre o tópico sobre o qual se debruça, radicado factualmente no contexto particular da cultura e política angolanas, numa esfera pública mais ampla, nomeadamente a da comunidade científica e da opinião pública mundiais (…)». O tema: independência do poder judicial, é politicamente pesado e exige fôlego intelectual na sua abordagem. Pior. Invoca “demónios” de um sistema político confuso que impera como regime-sombra sobre um Estado que se pretende Democrático e de Direito provocando convulsões repulsivas aos cultores da democracia representativa quando colocados em face do problema da separação e interdependência de poderes. São demónios cujas feições medonhas se identificam com a nomeação dos juízes pelo Presidente da República expondo o horror do desvio de poderes entre os órgãos de soberania do Estado. António José Ventura, na sua coragem característica, enfrenta tais demónios e avança passo a passo nos meandros dos seus domínios assombrosos com uma narrativa técnica acessível até para leigos, onde o discurso académico e a exposição mobilizante se cruzam num esforço de tornar público e abrangente a sua compreensão. Ao longo das 141 páginas que recheiam o livro com acabamentos gráficos invejáveis, o tema é distendido em nuances diversas mantendo a linha da descoberta do enigma final sobre tais demónios. O autor desdobra-se na exposição das características do poder judicial e modelos propostos; ataca a questão da independência do poder judicial nos ante-projectos de constituição propostas pelos partidos políticos até quase perder-se em questões de importância administrativo-financeira como a remuneração dos juízes e depois recupera do «pormenorismo» e sobe arfando para os montes da problemática da independência do poder judicial onde panoramiza várias questões como os estatutos dos juízes e as incompatibilidades que lhes são legalmente impostas, volta a descer do monte e quase esbarra com uma questão de nuances absurdas como a da iniciativa legislativa do poder judicial, na verdade inexistente pela natureza do órgão de soberania em questão. Adianta entender a questão como “capacidade” de propor diplomas legais. É discutível. Mas o problema convida a reflexões. Entremeia-se nos modelos de escolha de juízes, enfim, António José Ventura se assume como um “catador” de lixo político que quer descobrir preciosidades jurídicas revirando os detritos num emaranhado em forma de um poder judicial de soberania duvidosa. Nessa caminhada técnico-jurídica recheada de suspence intelectual, percebem-se as inúmeras contribuições decantadas de trabalhos e projectos desenvolvidos em sede da AJPD, embora não escape o cunho expositivo pessoal. Aliás, o autor reconhece justamente.

    Embora não se proponha a polemizar directamente as questões que procura esquadrinhar, propondo, ao invés, uma análise comparada, assente em comentários a favor ou contra (os termos do autor são méritos e deméritos), de várias propostas constitucionais de projecção partidária que se ofereceram inglórias para a concretização formal da nova Lei Constitucional, António José Ventura constrói, esquematiza e propõe um contencioso técnico-jurídico, que se desenvolve racionalmente no leitor, envolvendo as várias opiniões propostas pelos partidos políticos e pela Lei Constitucional que arrola como partes interessadas. Procura descobrir “avanços” e “recuos” nas propostas, para depois demolir, com o martelo da crítica com a característica severa habitual nos seus discursos, aquelas que menos se apresentam capazes de assumir a linguagem moderna da Democracia Constitucional de Direito, nos termos em que assume Karl Loewenstein. O que, por si só, revela uma atitude para além das capacidades de um simples estagiário. Claro está que sobre o tema em questão muito há para expor, discutir ou problematizar. Mas, António José Ventura tem o mérito de iniciar a caminhada que levará muitos dos futuros tecnocratas e até ensaístas a seguir. E nesse sentido, o valor histórico da obra é incalculável. É verdade que se queria da obra algo mais do que uma análise comparada de propostas. Esgrimir certos aspectos inerentes ao tema numa perspectiva histórico-constitucional é igualmente necessário para além da necessidade de chamar a colação o debate analítico sobre o polemizável, porque fragilizado, Sistema Unificado de Justiça angolana positivado com Lei 18/88 no olvidável período pré-democrático da Angola pós-independente. Com tais subsídios, António José Ventura proporcionaria igualmente um roteiro analítico sobre a evolução da independência do poder judicial em Angola, embora seja óbvia a sua fraca presença no passado histórico pós-colonial. Contudo, não queiramos tanto para uma obra “iniciática” como sustenta Fernando Macedo. Seria ganancioso demais desejar que António José Ventura nos proporcionasse uma BÍBLIA DO PODER JUDICIAL em Angola. Por isso, basta-nos admitir que o pioneirismo ensaiado com a temática abordada é de reconhecimento e respeito obrigatório. Está o seu autor de parabéns!

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