Recentemente a comunidade de estilistas e de fazedores de moda em especial, para além do público em geral, foi surpreendida com o julgamento de um caso crime opondo Tekassala e Yana Van-Dúnem, para além de outros arguidos por sinal filiados na Associação de Estilistas Angolanos. Em causa está a queixa-crime movida por Tekassala contra os outros com argumentos de difamação contra si, ventilada pelos acusados na comunicação social nacional fazendo crer que Tekassala não é estilista e que faz criações não originais. Ou seja, faz uso de criações industriais etiquetada por marcas de renome internacional aos quais aplica a sua própria marca. Facto que, a ser mentira, justifica a indignação e a propositura do processo judicial em causa por parte de Tekassala, uma vez que se põe em causa a sua credibilidade como criador de moda e como consequência a comercialidade dos seus produtos estilísticos.
É bem verdade que Tekassala é um nome obrigatório entre os fazedores de moda angolanos com intervenção no mercado internacional. Tive a oportunidade de tomar conhecimento sobre as boas referências conseguidas por Tekassala num evento de moda em Portugal em que apresentou uma colecção bastante inovadora que combina padrões estilísticos africanos e ocidentais. Mas o que vem a baila neste texto é uma questão que foi levantada na sessão de julgamento pelos acusados alegando que Tekassala não ostenta o título de estilista segundo as exigências da Associação de Estilistas Angolanos. Um argumento tão abalável nos termos do sistema jurídico angolano que me proponho a deslindar a guisa de contribuição para a sua compreensão, apesar da defesa de Tekassala ter sido brilhante neste particular.
A pretensão de se “cunhar” os estilistas mediante filiação associativa é uma imitação torpe, porque errónea, dos estatutos das ordens profissionais (médicos, advogados, engenheiros, enfermeiros, psicólogos, etc.) porque entende reconhecer o profissional mediante critério único de filiação. O modelo de filiação como elemento de reconhecimento profissional responde as exigências públicas de um exercício profissional uniforme aos padrões técnicos e tecnológicos necessários a prestação de um serviço de qualidade para as comunidades tuteladas pelo Estado. Corresponde ao interesse público manifestado através do Estado que reconhece assim a associação de tais profissionais mediante atribuição de estatuto de utilidade pública aos associados. Afinal, estes se propõem a cooperar com o Estado na realização do interesse das colectividades que se resume no aumento dos níveis de bem-estar social e económico das populações e fundamentalmente na sua segurança. Ou seja, as ordens profissionais devem ter interesse público imediato e servir as populações em serviços fundamentais e que para todos os seus beneficiários se preste observados critérios de serviços uniformizados. Daí que as ordens exijam uma formação técnica básica (geralmente de nível superior) comum a todos os seus membros e a todos aqueles que nele se pretendam filiar.
Não é o caso de uma Associação de Estilistas Angolanos que agrupa criadores de arte, e como tal naturalmente desconforme com regras de uniformização técnica, para além de desenvolverem serviços que o Estado nunca reputa importância básica por não constarem do catálogo de prioridades para a existência social e económica das colectividades. Não é possível uniformizar a técnica operacional de profissionais cujo labor depende de factores subjectivos como são a inspiração espontânea e a criatividade aplicada. No domínio das artes é disparatada a pretensão da utilização de uma técnica uniforme a todos os operadores, porque a Arte existe através da originalidade dos produtos da criação humana e que por isso são etiquetados como únicos. Portanto, constitui esforço inglório pretender-se que os escritores, músicos, dramaturgos e actores de teatro, artistas plásticos, cineastas e outros artistas se agrupem em associações com natureza de ordens profissionais. Em geral os artistas se agrupam em academias e por isso são considerados académicos (V.g.: Academia de Artes e Letras, etc.). Dito de modo resumido: A arte não se submete a regras. Uma associação de artistas, ou de criadores de arte se quisermos, visa tão só a promoção de interesses comuns e nunca a disciplina técnica de cada membro filiado, sob pena de se deturpar a natureza da própria Arte. É uma situação diferente da dos artesãos que para além de produzirem os modelos criativos em série, reproduzindo-os com fins manifestamente comerciais, não são artistas e por isso esta pretensão já é mais aceitável, embora discutível a sua utilidade pública.
Ademais, por não ser uma ordem profissional não faz qualquer sentido que a Associação de Estilistas Angolanos rejeite o título de estilista ao Tekassala. Não importa os argumentos dos seus membros que venham arregimentar em sua defesa. Ainda que a Associação de Estilistas Angolanos pretenda reunir todos os estilistas de Angola bate-se com o problema da liberdade associativa daqueles que não reconhecem a importância de nela se filiarem. Os operadores de moda e de outras artes são livres, nos termos da lei, de organizarem-se em associações em quantidades que se lhes aprouver (art.º 48.º – LC – Constituição, segundo o legislador). Insistir em reconhecer os estilistas nessas condições pode importar a Associação de Estilistas Angolanos responsabilidade civil pela ilicitude do acto quando o impedimento leve ao descrédito do estilista em questão ou acarrete outros prejuízos, para além de responsabilidade criminal dos dirigentes da mesma quando dela façam uso para atingir negativamente os fazedores de moda que nela não estejam filiados. Afinal, a Associação de Estilistas Angolanos tem no leque dos seus objectivos, um que é ilícito (o de reconhecer estilistas angolanos mediante filiação), se consta dos seus estatutos, e como tal contrário a lei. Dixit.
segunda-feira, 18 de junho de 2012
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SER OU NÃO SER ESTILISTA, EIS A QUESTÃO! - TEKASSALA VERSUS YANA VAN-DÚNEM - Albano Pedro
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