Há poucos dias vazou pela imprensa a notícia sobre a suspensão da direcção da FAB (Federação angolana de Basquetebol) liderada por Paulo Madeira que com sua lista B terá vencido as eleições de Dezembro de 2013 numa base de suspeições sobre a regularidade eleitoral que deu azo a um processo judicial interposto no interesse dos candidatos derrotados. A notícia merece alguma atenção por se tratar de uma suspensão e não de anulação das eleições (recomendando novas). Ou seja, se o tribunal tivesse decidido na base do processo principal (do processo em cuja causa de pedir se referisse a fraude eleitoral e o pedido se referisse a nulidade do processo eleitoral havido) pouco restaria para discutir em se tratando de uma decisão assente em factos probatórios materialmente verificáveis e de idoneidade imperturbável. A questão parece assustar em se tratando de uma mera suspensão (volvido mais perto de 5 meses do acto eleitoral) que como se pode depreender decorre de um providência cautelar. E assusta porque a ser consequência de uma providência cautelar, o tribunal da decisão põe em causa o efeito útil do direito invocado judicialmente na base dessa espécie processual apropriada para situações de extrema urgência no acautelamento dos direitos e interesses legalmente protegidos de quem se sente lesado ou na eminência de contrair lesão juridicamente relevante. O que nos obriga a algumas considerações sobre a importância e a razão de ser das providencias cautelares.
Se imaginarmos a hipótese de um individuo proprietário de uma moradia surpreendido com um aviso (notificação) para abandonar o conforto da residência pelo facto de ter sido vendida a um terceiro não ter tempo suficiente para recorrer judicialmente do facto alegando ser legitimo proprietário com vista a obter sentença favorável a integração da propriedade – uma vez que o processo judicial regular conhece um ritual de actos que comporta muito tempo -, percebe-se a partida que, nalguns casos, seria inútil recorrer aos tribunais já que, na hipótese, o individuo nem sequer conseguiria pleitear em tribunal mantendo-se na moradia. Uma outra hipótese, hermeneuticamente menos densa, é da uma mãe divorciada de quem o ex-cônjuge recusa alimentos. Se tiver que aguardar por um processo enfeitado de diligências probatórias e de argumentação contraditória exaustiva até ao julgamento, sabe-se que a senhora e o filho terão passado de cidadãos confortados a mendigos, padecendo de fome e outras necessidades. É para acautelar essas situações que o direito assumiu uma espécie de processo denominado Providencia Cautelar, cuja finalidade é acudir a situações judiciais em que se afiguram direitos e interesses legalmente protegidos com natureza perecível ou fugidia no tempo. Dito de outro modo, as providências cautelares visam proteger o efeito útil do direito reclamado pela parte lesada antes mesmo da decisão sobre o mérito da causa em julgamento da relação material controvertida, independentemente de a decisão favorecer ou não a pessoa que dele lance mão. A providência cautelar radica a sua razão na necessidade de proteger um interesse achado como razoável a luz da lei ainda que não se prove, no momento, a existência do respectivo direito na esfera jurídica do interessado, i.é, sustenta-se na fama de um bom direito como dizia os jurisconsultos latinos “ fumus boni iuris” e na cautela do exercício útil do direito “periculum in mora” que de outro modo desapareceria da esfera jurídica do interessado mesmo antes do julgamento das partes em litígio, colocando em causa o fim ultimo do direito que é a certeza e segurança jurídicas ao serviço da paz e felicidade dos cidadãos. É por isso uma espécie de processo de urgência e que como tal não se compadece com atrasos na decisão como parece ser o caso da suspensão proclamada judicialmente. Então a providência cautelar antecipa o processo judicial que deve por fim o conflito entre as partes com a jurisdição competente e final realizada com o julgamento e respectiva condenação ou absolvição da parte recorrida conforme o caso.
No caso em que se proclama a suspensão, ainda que válida, não faz muito sentido que o seja pela via da providência cautelar depois de decorrido tanto tempo. O próprio efeito útil do exercício do direito ou interesses legalmente protegido lesado entra em crise e com ele a importância, pertinência e oportunidade da providência cautelar. Aqui a extemporaneidade do efeito útil da providência cautelar pode pôr em causa outras situações jurídicas, eventualmente já constituídas, como as contratações com terceiros (funcionários, atletas, treinadores, patrocinadores, etc.) feitas pela direcção suspensa da FAB, bem como a estabilidade funcional do mandato em curso se considerarmos o facto de cada mandato ter um prazo estanque em que realiza um conjunto de actos programáticos previstos num calendário de prazo preciso que atende ao programa executivo aprovado para o ciclo olímpico em que correm os mandatos das associações desportivas nacionais gestoras de fundos públicos, também conhecidas por federações desportivas. É por duvidar do efeito útil da suspensão que nos parece razoável admitir a possibilidade de recurso judicial sobre a decisão do tribunal da causa. Ademais, os interesses que se avolumaram desde as eleições colocando em vinculação a actual direcção e terceiros de boa-fé merecem que uma decisão judicial mais oportuna decida a questão alegada na providência cautelar em definitivo. Dixit.
sábado, 14 de junho de 2014
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A SUSPENSÃO DA DIRECÇÃO DA FAB E AS CONSIDERAÇÕES JURÍDICAS QUE SE IMPÕEM - Albano Pedro
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