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    terça-feira, 19 de outubro de 2010

    CARTA AOS PARTIDOS POLÍTICOS IX

    Albano Pedro


    O problema de Cabinda, várias vezes ventilado como sendo de natureza eminentemente política causado por um ideal separatista e independentista e encarado pelo poder como solucionável pela via da extinção das forças sociais de oposição que incitam o povo a subversão armada, está mais próximo de ser relacionado com a falta de comunicação efectiva entre os cabindas e o resto do povo angolano.

    O que não ocorre entre os políticos da praça angolana é a ideia de que a maioria do povo, geralmente pobre, não tem recursos que cheguem para usarem transportes marítimos e aéreos, normalmente mais caros que quaisquer outros. E que por via disso essa mesma maioria, no caso, nascida e residente em Cabinda não conhece o resto de Angola, seu território nacional o qual seria alcançado e identificado com maior facilidade e frequência se ao povo deste enclave se colocassem outras vias de comunicação. Por isso, não deve estranhar a ninguém que os cabindas sejam dos povos que menos circulam pelo território nacional e que, se identificado o facto com precisão, as pessoas que defendem a ideia da separação política e administrativa do enclave através da independência, fora os inspiradores, nunca viajaram pelas restantes provinciais compreendidas pelo território nacional em busca da semelhança cultural que une os angolanos e por isso sejam vítimas de interesses políticos insuflados a partir de países aos quais sentem maior aproximação. É pois essa visão redutora de território que leva a maioria dos cabindas a defender um ideal pouco esclarecido e contraproducente para a sua própria emancipação social e económica.

    Na verdade, os cabindas estão muito mais ligados as culturas dos povos vizinhos (os dois Congos) com os quais trocam interesses e estabelecem tráfegos de influências sociais e culturais que se reflectem marcadamente na forma de ser e estar. Serve de comparação o facto dos Reinos Unidos, hoje estarem mais ligados a Europa do que houve memória no passado e como consequência estarem mais sensíveis ao projecto da União Europeia ao qual resistiram no princípio, graças ao canal que liga a Inglaterra e a França. E ao contrário, Portugal tem nas Ilhas da Madeira e Açores estatutos especiais devido a pouca fluidez na transferência de valores culturais e políticos causados pelos transtornos da falta de ligação rodoviária e ferroviária.

    O papel das vias rodoviárias e ferroviárias na ligação dos povos é actualmente inquestionável. Devido a malha rodoviária e ferroviária funcional, países como Namíbia, Botswana, Lesotho, Suazilândia e Africa do Sul se encontram tão ligados que são quase dispensáveis as independências política de cada um. Ao mesmo tempo que a privação tecnológica e o lento desenvolvimento económico e social é uma realidade que os países insulares como São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Cuba, para citar alguns, encaram com permanência ao longo dos tempos devido ao facto de faltarem, no conjunto dos meios de comunicação com outros povos, as vias rodoviárias e ferroviárias. Entre nós, o exemplo da fase do conflito armado em que os comboios ferroviários e os camiões não podiam circular, apesar dos aviões em trânsito frequente, levou províncias como Kuando Kubango e Moxico a ruína de que hoje têm dificuldades de se verem livres. Para mais, Angola ficou literalmente distante dos países vizinhos a partir do momento em que as vias rodoviárias e ferroviárias deixaram de ser acessíveis. O conceito de país desenvolvido e país em via de desenvolvimento está relacionado fundamentalmente com a fluidez na comunicação que é determinada, no âmbito da circulação de pessoas e bens, pela complexidade da malha rodoviária e ferroviária que os países assim rotulados comportam. São casos disso a Índia, Brasil, China, Países membros da União Europeia, Rússia, EUA, etc. A funcionalidade e o sucesso de plataformas económicas de âmbito regional como SADEC, MERCOSUL, etc. é determinada pela teia de estradas e linhas férreas que ligam os Estados membros.

    A solução técnica da ligação entre Cabinda e o resto de Angola (se feita com base em via subterrânea ou aérea) é da competência de especialistas nestas matérias aos quais caberá viabilizar a zona exacta do curso do Rio Zaire em que as estruturas físicas encontrarão maior segurança. Entretanto, no que toca a necessidade material desta via, ela pode compreender vias férreas e rodoviárias e a sua construção pode resultar do concurso do investimento privado nacional, internacional ou multinacional suportado por um acordo multilateral que envolva Angola e os dois Congos, certo de que o projecto sobretudo na sua componente ferroviária pode, para maior rentabilidade, alcançar as capitais dos três países, cujos ramais podem ser determinados pelas políticas internas das partes signatárias.

    Visto, os transportes aéreos e marítimos serem os mais caros se comparados com os transportes rodoviários e ferroviários, muito dificilmente a maioria do povo de Cabinda se sentirá enquadrado no contexto sócio-cultural nacional e por arrasto, o sentimento independentista de cada um será alimentado pela distância instalada entre Luanda, enquanto capital e a província de Cabinda.

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