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    sábado, 24 de dezembro de 2011

    GOVERNAÇÃO VERSUS DIREITOS HUMANOS

    A EXPERIÊNCIA E A VIVÊNCIA DAS POPULAÇÕES NA PROVÍNCIA DO KUANDO KUBANGO


    ALBANO PEDRO

    Entre nós está mais do que evidente que a governação do Estado nem sempre atende as mais elementares necessidades dos governados. Isso é até mais do que óbvio. Questões como a distribuição de água (ainda que não seja potável), energia eléctrica, problemas com a saúde pública e o saneamento básico tornaram-se canções tão recorrentes que o hábito de os ter presente no dia-a-dia tornaram-nos capazes de sentir saudades em caso dos problemas virem a desaparecer completamente. Abordar esses temas tornaram-se lugar-comuns tanto nos discursos partidários quanto nas reclamações diárias dos cidadão e por essa vulgaridade não merecerem aqui a nossa reflexão. Na verdade o que se pretende é abordar uma perspectiva de interação entre a governação e a realização dos direitos humanos completamente estranha ao discurso habitual. E daqui vem a experiencia e a vivencia das populações da provincia do Kuando Kubango.
    Convém adiantar que as populações mais autoctones desta provincia comportam características semi-nomadas e são em geral identificadas como pertencendo ao grupo étnico-linguistico Nganguela veiculando a lingua com o mesmo nome. Tendo uma vivencia assente fundamentalmente na busca de recursos providos pela própria natureza através da caça, da recolecção e da produção de carvão, os membros desse grupo etnico, não sedentarizados, fazem da mudança de espaços territóriais uma ocupação permanente ao longo do seu ciclo vital. É claro que muitos elementos e familias inteiras pertecentes a este grupo etnolinguistico se encontram sedentarizados nos pequenos e grandes espaços urbanos dessa Angola imensa. Mas no caso das populações ligadas ao estilo de vida tradicional localizadas na provincia do Kuando Kubango, o semi-nomadismo é o elemento chamado para análise nesta abordagem ja que levanta situações muito particulares no contexto da governação do Estado. Com efeito, enquanto as populações da maioria das provincias de Angola procuram imputar ao Governo todas as falhas possíveis no processo de obtenção de bens e de satisfação das mais básicas necessidades para a sua sobrevivência, na provincia do Kuando Kubango esse quadro é visto numa perspectiva diferente. É bem verdade que certos hábitos dos Nganguela por si só inviabilizam o sentido de cooperação entre as autoridades públicas e as populações. Por exemplo, é frequente vermos o abandono em massa das aldeias por destruição das casas devidas a chuvas. O conceito de reconstrução e manutenção de imóveis simplesmente não existe. As paredes da casa cairam então abandona-se pura e simplesmente. Aqui até fica bem patente a ausencia da ideia de limite do território para tais populações. Contudo, estes habitos colocados na confrontação analitica da governação local provocam situações alarmentes para além de resultados estrondosamente dramáticos. por exemplo, os esforços do Governo em construir escolas e postos médicos em localidades de fraca densidade populacional (aldeias e certas sedes comunais) são completammente anulados simplesmente porque as populações abandonam as aldeias com as suas infraestruturas e equipamentos sociais por qualquer razão que lhes seja pertinente. Por morte de um membro residente ou até pelas mais bizarras das razões, tais como a chegada de um forrasteiro (mukwakwiza) que venha instalar um negócio no local.
    Os equipamentos sociais servem as populações por escassos periodos acontecendo mesmo que os alunos recém matriculados atendam apenas um trimestre antes de se mudarem para zonas sem quaisquer contactos com poderes públicos. O analfabetismo nessas paragens tornou-se num problema crónico e de difícil solução enquanto que as soluções para certos problemas de saúde pública se perdem nas gavetas das puras intenções das autoridades públicas. Neste ambiente, assiste-se então um tipo de desemprego que a minha incapacidade de analise dos fenomenos economicos não consegue tipificar. O Professor (escola) ou enfermeito (posto de saúde) que como funcionário público se ve sem trabalho para prestar porque as populações pura e simplesmente desapareceram do local. A vinculatividade e até a efectividade de tais funcionários embora inquestionável perdem razão de ser por falta de trabalho para prestar.
    Aqui parece que os órgãos e serviços do Estado se veêm impossibilitados de realizarem as exigências cosntitucionais em matérias de direitos humanos diante de uma população que foge dessas mesmas condições, nascendo aqui um verdadeiro paradoxo. É bom ressalvar que nas sedes municipais esse problema não tem contornos alarmantes porque o abandono de casas não é sensivel quanto é nas pequenas comunidades sobretudo distantes da cidade de Menongue. Mas vale concluir que numa provincia com largos kilometros de espaços territoriais desabitados e com uma população quase rara, a sedentarização torna-se num grande desafio do Governo na relação com essas populações. No passado a igreja teve sucessos nesse processo. Durante os últimos séculos da colonização a igreja “obrigou” as populações a fixarem-se nos espaços territoriais ocupados. Ao longo das grandes vias rodoviárias podem ser vistas algumas aldeias com comunidades apresentado caracteristicas sedentárias lá aonde há uma capela ou paróquia. Tudo indica que a igreja viabilizaou a sedentarização dessas populações com elementos adicionais tais como a craição de condições alternativas para a sobrevivencia das populações pela adopção de hábitos de cultivo e criação de gado e pequenos animais domésticos. O que não parece ser a visão estratégica da governação do Estado no pós-independência.
    De todo modo, a experiência da igreja nessas paragens é sem dúvidas a mais certa para estancar esse estado de coisas de formas a permitir que os órgãos e serviços dos Estado prestem os serviços devidos as populações. Dixit.

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