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    domingo, 23 de março de 2014

    O PODER JUDICIAL: A SOBERANIA E O MANDATO DOS SEUS ÓRGÃOS - ALBANO PEDRO

    Quando analisamos os órgãos de soberania do Estado, resultantes da repartição do poder do monarca desencadeada pela revolução burguesa estimulada pelo pensamento iluminista europeu, facilmente percebemos que o poder judicial (os tribunais), ao contrário do poder legislativo e executivo, é o único que não assume verdadeira feição de um poder verdadeiramente soberano. Já porque os juízes não são directamente eleitos pelo povo (fonte da soberania do Estado), já porque não se fala em renovações de mandatos ao nível do Tribunal Supremo enquanto órgão máximo deste órgão soberano. Algumas opiniões técnica defendem a falta de soberania deste órgão (entre nós, o jurista Cremildo Paca desencadeou este debate na sua obra Direito do Contencioso Administrativo Angolano) e a nossa posição não seria completamente alheia a esta perspectiva. Se é possível falarmos em soberania dos juízes, uma advocacia doutrinal arrojada levar-nos-ia a assumir não uma soberania orgânica (legitimação do tribunais pelo voto popular) mas uma soberania funcional (admitindo que os juízes ao proferirem sentenças em nome do povo assumem a soberania deste). Entretanto, não passaria de mero debate teórico e sem fundamentação legal. O que é facto é que os juízes não são eleitos pelo povo e a Lei Constitucional – LC (Constituição, para o legislador) estabelece claramente que « A soberania, una e indivisível, pertence ao povo, que exerce através do sufrágio universal, livre, igual, directo, secreto e periódico, do referendo e das demais formas estabelecidas pela Constituição, nomeadamente para a escolha dos seus representantes.» (art.º 3.º, n.º1). Portanto, os juízes não são soberanos. Aliás a questão da soberania orgânica em Angola hoje é discutível se arrolarmos ao debate o Poder Executivo já que o seu máximo representante (Presidente da República) enquanto órgão independente dos demais órgãos soberanos deixou de ser eleito interrompendo o processo de transmissão da soberania que merecia pelo voto popular. Em rigor, apenas a Assembleia Nacional é um verdadeiro órgão de soberania do Estado. Todavia, (e regressando ao debate sobre os tribunais) é possível examinar a legitimidade deste órgão a luz da LC já que este complexo normativo fundamental estabelece um procedimento para a indicação do Presidente do Tribunal Supremo e do seu Vice-Presidente, assim como os mandatos correspondentes (art.º 181.º - LC). Sendo certo que ao Presidente da República cabe a nomeação do Presidente e do Vice-Presidente escolhidos entre os candidatos seleccionados pelos restantes juízes conselheiros em efectividade de funções (2/3 de juízes) poderíamos admitir uma espécie de soberania derivada por via da soberania do Presidente da República. Mas infelizmente este não é eleito directamente pelo povo a quem pertence a soberania e a tese da soberania indirecta não colhe na nossa LC. Entretanto, o mandato deste órgão “atípico” (já que não é propriamente soberano) vem claramente estabelecido «O Juiz Presidente do Tribunal Supremo e o Vice Presidente cumprem a função por um mandato de sete anos, não renovável» (art.º 181.º, n.º4 – LC). E com base neste enunciado normativo de cariz fundamental não restam dúvidas que o actual mandato do Tribunal Supremo e, por conseguinte do Poder Judicial angolano, é inconstitucional, carecendo (o poder judicial) de ser regularizado a semelhança do que aconteceu com a regularização dos mandatos do Poder Executivo e do Poder Legislativo (Assembleia Nacional). Aqui podemos assumir que a regularização institucional ocorrida com o relançamento das eleições gerais interrompidas desde 1992 é apenas parcial e por isso estamos diante de uma República de Angola igualmente parcial que apenas é justificável no quadro do atipismo que caracteriza o sistema constitucional angolano vigente. Dixit.

    3 comentários:

    1. A questão sobre a legitimidade do poder judicial (e a consequente análise sobre a sua soberania) é um tema que sempre me apaixonou e apaixona.

      A chamada "legitimidade funcional" que se aponta ao poder judicial é, para mim, uma legitimidade que subalterniza os Tribunais. De facto, comparando com os dois outros órgãos de soberania, fica difícil pugnar pela soberania dos Tribunais (pelos menos uma soberania plena, se olharmos para a soberania com níveis).

      Aprecio a abordagem que faz o articulista sobre o tema que se propôs, contudo, concessa venia, não perfilho do seu ponto de vista relativamente às conclusões que chega quanto à inconstitucionalidade dos mandato. Da fixação (constitucional) de um período de mandato, não renovável, não me parece poder-se concluir pela sua inconstitucionalidade.

      Parece-me razoável que se reconheça ao legislador constituinte poder bastante para definir a duração do mandato de um e outro órgão de soberania, que, em rigor, não têm que coincidir!

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    2. Caro Adelino Domingos, agradeço o seu comentário e pela abordagem que faz percebo-lhe familiarizado com a matéria em questão. Respeito o seu ponto de vista. Porém, receio que eu não tenha sido claro nesse ponto, porque o que está em causa não é o mandato em si consagrado na LC (CRA), mas o mandato efectivo dos juízes que já ultrapassa os prazos da própria LC (CRA). Como deve perceber o mandato do actual Presidente e V-Presidente do Tribunal Constitucional está fora dos prazos constitucionais. Dai ser inconstitucional. Se depois desse esclarecimento manter a sua percepção apenas me vai restar respeitar a sua posição. Um Abraço e peço que esteja a vontade a comentar outras e novas matérias.

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    3. Corrigir: Mandato do actual Presidente e V-Presidente do Tribunal SUPREMO ( e não Tribunal Constitucional)

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