O GRANDE DESAFIO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Albano Pedro*
A unidade de um povo só se justifica se o mesmo estiver arregimentado para uma tarefa comum. Sabe-se da psicologia social que perante o medo comum os indivíduos se unem, e ocupados na tarefa de afastarem o perigo, convergem as identidades particulares em torno de um sentimento comum. É bem sucedido e feliz o líder que consegue ocupar um povo nas tarefas mais nobres de um Estado, mesmo quando se traduz em guerra contra povos vizinhos. O que mais promoveu a imagem dos melhores líderes da História senão o facto de terem estado a frente dos destinos do povo no momento em que este teve preocupado com problemas que a todos diziam respeito? Fale-se de Mahatma Ghandi ou de Nelson Mandela cuja liderança carismática não seria possível se os povos não esperassem deles a solução de um problema a que a todos preocupava no momento: liberdade! Mesmo líderes historicamente detestados como Benedito Mussolini, Adolf Hitler ou Augusto Pinochet foram no seu tempo obedecidos e seguidos pelo povo devido as tarefas de envergadura nacional que promoveram. O que mais se espera de um líder senão a capacidade de mando sobre um povo em prontidão? Não é a espera da solução comum sobre a crise económica mundial que neste momento torna Barack Obama o presidente querido e tolerado pelo povo americano, independentemente de serem pró-republicanos ou pró-democratas? O dito bíblico que diz “ a mente vazia é oficina do diabo” aplicado a realidade social significa tão só que um povo desocupado e com vocação ao ócio desenvolve conflitos e divisões entre si, de modo que as melhores intenções do Governo são, pelas especulações geradas pelo ócio, mal interpretadas e aplicadas com deficiência promovendo uma incapacidade generalizada no processo de construção e desenvolvimento da sociedade. O que torna as crianças iniciadas na delinquência senão a liberdade, pela falta de ocupação útil, proporcionada pelos pais? Mais ocupados estamos em tarefas úteis menos prejuízos causamos a terceiros. Queremos evitar a criminalidade? Ocupemos os mais jovens! Porque a criatividade própria desta idade, por si só incompatível com o ócio, precisa de ser aplicada com utilidade para que a alma folgue com a sensação de realização proporcionada pelo sucesso. Queremos evitar o desemprego? Ocupemos os cidadãos preparados para o trabalho, se não há capacidade de emprego, deixemos o povo desenvolver as suas actividades de modo informal, estimulados pela necessidade de sobreviver, para que com a organização e eficiência paulatina dos serviços comerciais e tributários emancipe-mo-los ao nível da economia formal, porque nada mais aflige a alma humana do que uma capacidade não aplicada: a mente humana é autoritária em relação ao corpo apto e capaz. Aquele é um chefe este é um escravo. Para quê haver hierarquia sem trabalho? Não sabemos que a rebelião de presos, escravos, trabalhadores ou cidadãos desencadeia-se a partir do momento em que todos, abandonando as suas ocupações, têm tempo para ouvir o mais ousado dos inconformados? O próprio sofrimento surge quando a ocupação dá lugar ao ócio vindo disto a consciência dos factos. E donde nascem os sonhos e ideias torpes senão do ócio? Por isso a falta de ocupação útil, traduzida pelo trabalho, é o primeiro problema de um verdadeiro infeliz.
A sequência de raciocínios filosóficos surge da reflexão sobre a agenda dos grandes problemas sociais, como o problema de habitação e tantos outros que interessam a nação. Um debate lançado pelo Presidente da República que desencadeia o problema de saber quais serão os cidadãos mais aptos no momento para dar corpo as resposta que solicita da nação. É preliminar dizer que um encontro nacional para debater os preocupantes e prementes assuntos da nação envolvendo quadros sonhadores encontrados entre técnicos ociosos e académicos teóricos é absoluta perda de tempo. Há muito a história humana aponta o facto de que a prática aliada a teoria é o critério único do conhecimento, ou seja, ninguém conhece nada que tenha aprendido sem ter experimentado. Quem ousa formar uma empresa ou uma associação sem ter experiência na área ou ramo de actuação, senão por mera aventura? É por acaso que os melhores empregos são reservados a candidatos experientes? Por isso, a realidade experimentada por aqueles que ganharam “calos” pelo desempenho diário é mais útil do que a dos ociosos, intrigantes e caçadores de oportunidades. O que torna injusta as relações sociais em Angola senão o facto de os mais aptos serem afastados em benefícios dos menos capazes?
Tudo para dizer que é chegado o momento dos governantes ouvirem, não só os estudiosos e teóricos, como também os zungueiros, sapateiros, peixeiras, kíngilas, pescadores, pintores, caçadores, lenhadores, agricultores, curandeiros, taxistas, mercadores, cozinheiros, mecânicos, bate-chapas, electricistas, jardineiros, guardas, ardinas, engraxadores, pedreiros, ladrilhadores, empregados domésticos, motoristas, cobradores, polícias e militares, repórteres, barmen, disk jockeys, carpinteiros, marceneiros, artesãos, ceramistas, escultores, dançarinos, actores, domadores de animais, treinadores de cães, ilusionistas ou mágicos, palhaços, cabeleireiros ou barbeiros, vendedores ambulantes, acrobatas, oculistas, parteiras, mães, alunos, tradutores, camionistas, maquinistas, doentes, crianças, desportistas e todos aqueles que experimentam o dia-a-dia dos múltiplos problemas humanos e sociais para melhor percepção dos fenómenos políticos. Se ouvimos os académicos e os especialistas por formação, ouviremos apenas aqueles que pensam o que “deve ser”. Mas, ao ouvir aqueles que tem a sensibilidade das agruras sociais ouviremos aqueles que sabem o “que é”. Este segmento social é o que permite um diagnóstico da realidade pensada pelos governantes.
Não estamos a defender uma auscultação tipo “helénica” em que é necessário arregimentar todos os cidadãos e esperar deles que apresentem as principais preocupações que os aflijam. Este modelo de democracia directa da Grécia antiga é a todos os títulos descartável, não só pelo seu primitivismo, por si capaz de engendrar confusão e custos em meios e tempo desnecessários como porque nos dias de hoje a legitimidade dos deputados, representantes do povo, dispensa tais mecanismos. Contudo, pense-se em gabinetes especiais composto por consultores e auditores profissionais, quer ao nível do Governo quer ao nível da Assembleia Nacional para auscultação regular de cidadãos integrados nas múltiplas organizações especializadas da sociedade civil (comportando as organizações de todos os domínios sociais e que operam em quaisquer espaços do território nacional). Gabinetes com funções de “encomendar” as opiniões dos cidadãos sobre matérias de interesse governamental ou parlamentar ou receber sugestões múltiplas. A importância está no facto destes gabinetes permitirem a percepção sobre o impacto social ou económico de uma medida tomada pelos dirigentes sobre determinadas populações ou sectores sociais. Entre os consultores e auditores constarão sobas e outras autoridades tradicionais para a promoção de contactos localizados quando se tratem de populações em zonas rurais. Estes gabinetes ganharão representações e seus membros, captados dos vários segmentos da sociedade independentemente dos vínculos partidários, terão acesso as reuniões dos governos e administrações locais em matéria de questões de concepção e execução de projectos sociais de interesse colectivo. A partir destes gabinetes de auscultação social, heterogéneos e multiformes, o Governo terá os dados mais fiéis sobre a realidade social de modo permanente para além de verdadeiramente começar a ver materializados os princípios da colaboração da administração com os particulares (art.º 7º - Decreto-Lei n.º 16-A/ 95 – daqui para frente NPPA) e da participação (art.º 8º - NPPA). Acreditamos não existirem visivelmente outros mecanismos para dar aplicabilidade a estes princípios que são responsáveis pela criação do espírito de cumplicidade entre os governantes e os cidadãos. Senão como se pensa combater a corrupção, a falta de emprego e habitação, o fornecimento inexistente ou deficiente da água e energia eléctrica entre tantos outros males sociais sem ouvir, e pôr a participar no processo, as vítimas destes mesmos problemas com todos os seus desaires e anseios?
No plano estrutural e organizacional tais gabinetes, ao nível do Governo, seriam coordenados pelo Ministério da Administração do Território se outro departamento governamental não for o mais conveniente. Ao nível da Assembleia Nacional, seriam órgãos coordenados pelas distintas comissões de deputados. Experimente-se um modelo semelhante se não teremos o povo a ganhar confiança nos seus líderes? Como pode um zungueiro, roboteiro ou kíngila sentir orgulho de ser angolano se os governantes através dos polícias ou fiscais caiem sobre eles a porretadas e a cacetetes no momento em que procuram apenas o pão para sobreviver, sem que estes lhe dêem um minuto se quer para que explique as razões pelas quais anda na rua? Como resgatar o espírito de unidade nacional se o povo não tem oportunidade de ser individualmente ouvido para tornar útil a sua existência como cidadão? Quantas estradas não estragaram e quantas pontes (vias aéreas) não tiveram de ser retiradas após a sua construção pelo simples factos de não se ter levado em conta a opinião dos cidadãos utentes de tais meios? E sobre o plano de habitação? Vamos construir casas aptas para os utentes, segundo as percepções teóricas dos dirigentes ou segundo as percepções práticas dos cidadãos beneficiários?
Que os angolanos estejam ocupados em dar soluções aos problemas da nação através de oportunidades conferidas pelos dirigentes da nação, seus representantes. Com esta atitude os governantes terão melhores percepções sobre a realidade e melhores soluções a dar. Permitindo que uma verdadeira AGENDA NACIONAL DE CONSENSO seja estruturada naturalmente, sem quaisquer hegemonias partidárias ou exclusões de ideias construtivas de cidadãos interessados. E o programa de desenvolvimento habitacional, do combate a pobreza e todos os outros terão sucesso garantido. Conclui-se que, o combate a corrupção, ao clientelismo e a toda a sorte de males sociais passa necessariamente pelo resgate do espírito de unidade nacional que significa tão só o reconhecimento e utilização de todos filhos da pátria pela entrega e espírito de sacrifício no interesse colectivo.
* www.jukulomesso.blogspot.com
sexta-feira, 24 de abril de 2009
Política
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