De uma maneira geral, o discurso a Nação proferido na Assembleia Nacional (dia 17 de Outubro de 2016) pelo Presidente José Eduardo dos Santos na sua qualidade de Chefe de Estado não foi ao encontro das expectativas da generalidade dos angolanos. A razão é simples: Todos (ou quase todos) esperaram por uma solução efectiva e urgente que retire as populações do actual ambiente de desconforto financeiro gerado pela crise anunciada no final de 2014. Daí que eu tenha defendido numa opinião vazada numa das últimas edições do Novo Jornal que o PR devia focar-se nas soluções concretas para sairmos da crise económica em que nos encontramos. Pois, tal como anunciou a crise numa altura em que os sintomas não eram tão agonizantes também esperava-se que viesse iluminar o caminho para a saída dele. Era a grande expectativa. Nesse sentido a boa intenção do discurso foi traída pela falta de sensibilidade sobre as necessidades prioritárias dos angolanos. E disto duas conclusões podem ser tiradas: Ou o discurso foi feito no puro interesse de cumprir-se uma mera obrigação constitucional ou não há efectivamente vontade de se avançar para soluções concretas que ponham fim o estado de agonia social e económica a que os angolanos estão remetidos desde que a baixa do petróleo e a falta de circulação de divisas estrangulou a economia nacional.
Em todo o discurso faltou apenas o ponto de remate: A solução concreta de como havemos de sair da crise. Nem que para isso fosse escrita apenas uma meia dúzia de linhas e o discurso terminasse no minuto seguinte do seu inicio. Teria colhido palmas efusivas e conseguido toda a solidariedade do povo que se impõe num momento de crise como o que vivemos. Tudo porque estamos com fome e sem soluções para resolvermos o problema pelos nossos próprios esforços. E porque acima de tudo, fomos mal ensinados desde a independência da República a esperar pelas soluções apresentadas pelo Chefe para nos alimentarmos.
Por falta de foco sobre as soluções efectivas para a saída da crise, todo o mérito do discurso, e mesmo as boas intenções nele carregadas, perdeu-se no vácuo, levando a que quase ninguém assimilasse as bases estratégicas que enriqueceram o discurso com algumas novidades notáveis, como foi a incursão sobre as relações internacionais onde, pela primeira vez, depois do tempo do mono (anos 80), o PR acusou claramente a hegemonia americana como estando por trás das principais catástrofes sociais que mundo enfrenta em consequência das guerras que acontecem pelo mundo. Não faltaram os nomes de Barack Obama como um dos principais culpados. Para mim, essa acusação não deixou de revelar um problema de carácter estratégico que está escondido no pacote das relações internacionais estabelecidas entre o Estado angolano e os EUA. Afinal, o que levou o PR a tratar “mal” um velho amigo que até ajudou a eliminar o arqui-inimigo Jonas Savimbi e a colocar Angola no centro do comando de muitas operações de contenção de conflitos políticos e militares em África? Mais esclarecimentos impõe-se. Parece que se pretende preparar os angolanos para momentos piores que advirão do azedar de eventuais relações diplomáticas ou, melhor ainda, parece justificar as crescentes queixas do executivo angolano sobre as conspirações do ocidente contra a nossa “democracia”. É verdade que precisamos perceber as relações internacionais para melhor protegermos os nossos interesses. Mas que interesses? Nesse momento o interesse maior é resolvermos os problemas da economia para debelarmos a fome e a miséria que ganha espaços alarmantes. Na busca dessas soluções onde se encaixam as acusações sobre os principais “Senhores da Guerra” do momento que vão trucidando as nações do médio oriente?
Já não foram elogiosas as justificações sobre o mau desempenho da economia devido as dificuldades causadas pela guerra que nos envolveu no passado recente. A intenção de fazer recordar que passamos por situações difíceis não é má. Mas, definitivamente, já não se espera que o Chefe de Estado volte a tocar em assuntos que se pretendem enterrados em nome da tolerância política e em nome da Paz social. É uma falha grave que afectou a boa intenção do discurso. Que fique claro que mais ninguém quer ouvir falar da pouca-vergonha que foi a guerra civil que nos afectou a todos. A cultura da tolerância política passa por não justificar erros económicos com erros sociais. O momento é de erguermos a sociedade de todos nós e são bem-vindas todas as soluções urgentes e necessárias. E apenas as soluções que nos levem a sair da crise económica são as que interessam nesse momento.
Porém, partamos do princípio de que há efectivamente uma solução para a saída da crise e que não foi devidamente escalpelizada no discurso. O problema que se põe é o mesmo de sempre: Será o Executivo a implementar as medidas para sairmos da crise ou será o próprio povo a ser impulsionado a sair da crise? Dito doutro modo, continuaremos a seguir um modelo dirigista em que todas as soluções são decididas pelo Chefe, alinhando a máquina que o suporta para a busca de soluções estudadas em laboratórios, ou haverá a coragem de devolver o poder de decisão aos angolanos através da liberalização efectiva da economia?
Este problema é o mais sério de todos. Pois, que a apesar de avançar ideias optimistas, como são a necessidade de todos juntos sairmos da crise, o PR não parece ter dado tarefas concretas ao próprio povo, animando a ideia da governação participativa (governar para o povo, com o povo e pelo povo) que avançou no Congresso do seu partido. O PR não “empossou” cada angolano na tarefa de lançar mãos a sua própria liberdade económica consagrada na ordem constitucional e resolver, por esforço próprio, o problema da crise por meio de garantias e incentivos concretos proporcionados pelas políticas públicas orientadas para o relançamento e desenvolvimento de uma economia privada. O que significa que o PR devia dar sinais concretos sobre a implementação de um Estado que definitivamente deve abandonar a ideia hegemónica sobre a economia nacional; de abandono de um Estado que teima em abrir os caminhos para uma diversificação económica laboratorial e sem a participação criativa dos próprios cidadãos; do fim de um Estado que controla desnecessariamente as liberdades económicas dos cidadãos no suposto interesse pela segurança nacional que apenas faz sentido em ambientes políticos do tipo comunista que já não existem muitos pelo mundo.
O PR precisa devolver a cidadania aos angolanos para sairmos todos da crise. Isso passa por uma clara ideia de privatização da economia e da garantia efectiva do exercício das liberdades económicas. Mais do que isso. O PR precisa garantir que as políticas públicas gizadas pelo seu “Staff” vão de encontro com os anseios dos angolanos e não de encontro com as posições do seu partido. Aqui urge ser chefe do Estado, mais do que dirigente do partido que governa os angolanos. Nesse particular, o PR precisa fazer-se perceber como o dirigente de todos os angolanos, mais do que o representante da força política governante. Ironicamente, isso aconteceu no âmbito do Congresso do MPLA em que elevou-se ao ponto de falar para todos os angolanos, o que não aconteceu claramente ao dirigir-se a todos nós, na casa das leis. Por isso, não será de todo estranho que se pense que a moção de estratégia que anunciou no partido foi uma verdadeira antecipação ao discurso a Nação.
Falou-se de melhorias no desempenho económico e na estabilidade de alguns dos grandes agregados económicos. A taxa de inflação, a estabilidade cambial, a contenção dos níveis de desemprego, etc. Mais ainda, falou-se dos índices de desenvolvimento humano. Entretanto, continuamos com um Estado que não implementa a sua vocação social. Não se sabe como se justifica a falta de subsídio de desemprego ou a falta de um plano de saúde que proteja os mais necessitados. Quando teremos em Angola subsídios para apoiar as famílias numerosas, visando a possibilidade de erradicar a miséria no seio de muitas delas? São questões sobre a implementação do Estado Social previsto na ordem constitucional. Não parece curial defender-se melhorias sociais numa sociedade em que a solidariedade social não é efectiva. Pior ainda, é a falta patente de financiamento ao micro-negócio, o grande factor de impulsionamento do desenvolvimento económico das sociedade contemporâneas. A experiência mundial aponta que o sucesso das microempresas é directamente proporcional a melhoria das condições sociais e económicas das famílias. Em Angola a prioridade está para grandes investimentos e em sectores que constituem prioridades para o executivo e não para o cidadão empreendedor ou para as famílias em concreto. Até quando este dirigismo sobre a economia?
O discurso manteve o tom da unidade nacional. Mas como fica a materialização dessa mesma unidade nacional? Qual é a função efectiva da sociedade civil como parceira do Estado? Acusa-se a sociedade civil de não colaborar com os esforços do Estado e nada é feito para a reorientação vocacional desta mesma sociedade civil levando-a a colaborar mais activamente com os programas do Executivo promovendo o aumento dos níveis de satisfação dos cidadãos. Que apoios efectivos (financeiros e institucionais) existem para estimular a sociedade civil a fim de torná-la participativa colaborando para a implementação da agenda social do Estado? Nenhum! Querer-se a participação de todos os agentes económicos para a diversificação da economia. Tudo quanto se sabe é que a diversificação de uma economia é natural e não assenta em vontades políticas ou decretos, pelo simples facto de que não fazemos todos a mesma coisa. Entretanto, este discurso esconde a verdadeira solução que é a devolução do controlo da economia pelo sector privado. A linguagem não é DIVERSIFICAÇAO DA ECONOMIA, mas PRIVATIZAÇÃO DA ECONOMIA. Falta a possibilidade dos angolanos desenvolverem-se pelo livre exercício das liberdades económicas gerando riqueza individual que venha a ter reflexos concretos na riqueza social. É preciso que a zungueira não seja espancada na rua. Mas apoiada, protegida e taxada na sua actividade. Ganha a zungueira e ganha o Estado. É preciso que haja linhas de microcrédito para financiar a actividade informal trazendo-a para o sector formal da economia. Ganham as famílias carenciadas e ganha o processo de restruturação da economia. É preciso permitir o acesso legal a terra e a propriedade imobiliária para garantir a capacidade de crédito dos operadores económicos. É preciso, enfim pensar-se claramente numa política que liberte a economia e estimule a actividade económica participada por nacionais e estrangeiros. É isso que falta. Falar de diversificação económica é o mesmo que apoiar a ideia dirigista da economia pelo Estado que depois de se sentir traído pela volatilidade do preço do petróleo pretende criar novas fontes de receitas a custa da actividade pública. É um argumento que esconde a incapacidade do Executivo de assimilar efectivamente a ideia de uma economia de mercado e de livre iniciativa dos seus agentes.
O PR deve dar sinais claros de que a economia nacional vai avançar corajosa e vigorosamente para um processo de privatização em que os agentes económicos privados são chamados a desempenhar a função-mestre de arquitectos do desenvolvimento económico dos angolanos. Aqui está a solução para a saída da crise. Uma solução que envolve toda a sociedade, por ser parte activa do processo de desenvolvimento. O discurso não foi claro em tornar os angolanos em verdadeiros cúmplices do seu próprio desenvolvimento ganhando consciência clara sobre o seu papel efectivo nesse processo. É isso que a maioria dos angolanos queria ouvir e é isto que todos esperamos que aconteça nos próximos momentos. Se não houver sinais vigorosos nesse sentido continuaremos com fome e sem esperança de melhorias!
terça-feira, 18 de outubro de 2016
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NÓS VAMOS SAIR DA CRISE OU O MPLA VAI SAIR DA CRISE? Um ponto que pede esclarecimentos na Mensagem a Nação do Presidente da República – Albano Pedro.
Quém esperava um pronunciamento de propostas concretas pelo o que falou o preside da República no seu último pronunciamento, é porque anda mesmo distra ido. Tudo que o nosso presidente fala ou promete para o interesse do Povo angolano, acaba só em teoria, em prática, eu nunca vi, o MPLA e o seu presidente, respeitar o cumprimento das suas promessas. Havemos de voltar....
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